São Paulo, terça-feira, 30 de junho de 2009

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Após golpe, Honduras forma novo gabinete

Eleito presidente pelo Congresso, Roberto Micheletti dá posse a sete novos ministros e insiste em que houve "sucessão constitucional"

Enfrentamento entre manifestantes contra deposição de presidente e militares deixa 25 feridos e dezenas de presos na capital

Esteban Felix/Associated Press
Militantes se reúnem em praça de Tegucigalpa

FABIANO MAISONNAVE
ENVIADO ESPECIAL A TEGUCIGALPA (HONDURAS)

No seu segundo dia à frente de Honduras, o presidente interino Roberto Micheletti entrou ontem pelos fundos da Casa Presidencial para dar posse aos primeiros sete membros de seu gabinete. Ao mesmo tempo, diante do portão principal, os primeiros confrontos violentos entre militares e algumas centenas de manifestantes em favor de Manuel Zelaya, deposto anteontem, deixaram ao menos 25 feridos e algumas dezenas de presos.
A cerimônia de posse durou cerca de 20 minutos e contou apenas com a presença de jornalistas e de um pequeno grupo de deputados. O acesso só foi possível pelo portão traseiro, guardado por um grupo de militares e por um tanque.
No amplo jardim do lado de dentro, dezenas de policiais e militares faziam a guarda da Casa Presidencial. O estacionamento, sem automóveis, se transformou em pista de pouso para helicópteros militares carregados de material bélico.
Na abertura, Micheletti, até ontem presidente do Congresso, disse que governará apesar do "repúdio internacional" e insistiu em que houve "uma sucessão constitucional, e não um golpe de Estado". Até ontem à tarde, nenhum país do mundo havia reconhecido o novo governo hondurenho.
Ex-aliado de Zelaya, Micheletti nomeou um gabinete predominantemente do tradicional Partido Liberal (centro-direita), ao qual os dois pertencem. Dois dos escolhidos sobreviveram ao regime deposto, entre os quais o novo ministro da Defesa, Adolfo Lionel Sevilla, que vinha exercendo o vice-ministério da mesma pasta.
Num breve discurso, Lionel assegurou que haverá eleições presidenciais em 29 de novembro, conforme previsto.
"É um governo liberal, obviamente, porque os liberais foram eleitos à Presidência", disse a deputada Marta Lorena Alvarado, presente à posse.
Como a maior parte da bancada do Partido Liberal, Alvarado apoiou a deposição de Zelaya, sob a alegação de que ele queria se perpetuar no poder ao estilo do aliado venezuelano, Hugo Chávez.
"Aqui paramos Chávez e sua agenda. Isso é mais importante do que qualquer coisa, inclusive do que o reconhecimento internacional", afirmou Alvarado, que, diz, será nomeada em breve vice-chanceler.
Ao mesmo tempo em que Micheletti se instalava no palácio, militares e policiais começaram a dispersar as centenas de manifestantes que bloqueavam a entrada principal desde a manhã de anteontem, quando Zelaya foi expulso do país rumo à Costa Rica. No final do dia, as forças de segurança controlavam todos os acessos à sede do Executivo.

Sob censura
Como ocorreu durante o golpe, anteontem, as TVs e rádios do país que estão no ar -todos favoráveis ao novo governo- não transmitiram os confrontos diante do palácio. Já os meios de comunicação pró-Zelaya continuavam fechados e militarizados.
Segundo a TV Telesur, controlada pela Venezuela, a sua equipe de reportagem em Tegucigalpa foi detida por militares e liberada em seguida.
O recém-empossado ministro da Comunicação, René Cepeda, disse que o fechamento de meios de comunicação é responsabilidade dos militares.
"Não sou responsável por quem está ou não no ar, sou responsável pela informação que sai da Casa do Governo e do Executivo. Esse assunto é da Comissão Nacional de Telecomunicações", disse Cepeda a jornalistas.
Honduras está sob toque de recolher por 48 horas desde anteontem, por determinação de Micheletti. No final da tarde de ontem, a proibição para circular pelas ruas do país foi antecipada das 21h para as 18h, em reação aos confrontos.
Ontem, a maior parte do comércio voltou a funcionar em Tegucigalpa. Com a exceção dos distúrbios na frente do palácio, não há registros de protestos em outras partes da capital e do país.
A crise política em Honduras se acentuou diante da insistência de Zelaya em realizar uma votação sobre a convocação de uma Assembleia Constituinte.
Apesar da consulta, que seria realizada anteontem, ter sido declarada ilegal pelo Congresso, pela Justiça e pela Promotoria, Zelaya tentou levá-la adiante. Horas antes da abertura das urnas, porém, ele foi capturado por militares e obrigado a deixar o país.
Críticos de Zelaya afirmam que sua intenção era mudar a Constituição para introduzir a reeleição presidencial. O mandato do aliado de Chávez terminaria em janeiro.


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