São Paulo, terça-feira, 30 de junho de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

entrevista

"Golpe expõe limites de poder dos EUA"

CLAUDIA ANTUNES
DA SUCURSAL DO RIO

O golpe em Honduras revela os limites da ação de atores externos, incluindo os EUA, num "mundo que não é mais o do século 20", diz Julia Sweig, diretora de estudos latino-americanos do Council on Foreign Relations, de Washington.
Sweig assessorou Hillary Clinton, atual secretária de Estado, durante a disputa interna do Partido Democrata, em 2008. Ela falou da posição da diplomacia americana em relação a Honduras e ao bloco bolivariano em conversa com a Folha na sede da Fundação Getúlio Vargas, no Rio -onde tem vindo, segundo disse, para conhecer melhor o Brasil.

 

FOLHA - Diz-se que é a primeira vez que há golpe na América Central sem envolvimento americano. Como a sra. interpreta essa situação?
JULIA SWEIG
- Todos os atores externos -os países da Alba, os EUA, a OEA- fracassaram em impedir que os militares hondurenhos dessem o golpe. Os EUA vinham tentando controlá-los, mas falharam.
Isso mostra os limites do poder americano, mesmo num pequeno país cuja economia e instituições dependem muito dos EUA. É um mundo diferente do do século 20, quando golpes e conspirações podiam ser manufaturados pela CIA.
Além disso, o golpe na Venezuela em 2002 foi uma advertência. O novo governo entende que o endosso ao golpe foi um revés para a posição americana na região. Agora é uma chance de demonstrar suas credenciais democráticas, independentemente de ideologia.

FOLHA - Os EUA estariam preocupados, como no caso do Irã, em não parecer estar interferindo demais?
SWEIG
- Pode ser. Uma das primeiras reações, de Dan Restrepo [encarregado da América Latina no Conselho de Segurança Nacional], foi a de que os EUA não iriam interferir nem para o bem nem para o mal. Isso é ambíguo demais. Pode ser que essa hesitação tenha vindo da consciência de nossa história na América Central, onde qualquer tipo de envolvimento poderia ser visto como negativo.

FOLHA - Hillary Clinton disse não cogitar no momento cortar a ajuda a Honduras. É a decisão correta?
SWEIG
- Acho que os EUA não deveriam cortar ajuda, e sim dizer que há essa opção. O melhor é concentrar esforços em tentar reinstalar o presidente. Os EUA têm alguns instrumentos de pressão, assim como o Brasil, a União Europeia têm os seus. Mas seria melhor coordenar isso multilateralmente.

FOLHA - A distensão entre os países da Alba e o governo Obama vai continuar, mesmo quando os bolivarianos mantêm retórica antiamericana?
SWEIG
- Acho que os EUA e os bolivarianos terão de aprender a conviver com a retórica uns dos outros. Em Washington há hoje a capacidade de não confundir retórica e substância.
Teremos que esperar para ver se as relações com Bolívia, Venezuela e Equador podem ser reconstruídas. Mas acredito que Washington está se acostumando com o fato de que, nessas democracias participativas populistas, o governo responde primeiro a seu eleitorado e depois a Washington, que no século 20 esperava deferência a seus interesses.


Texto Anterior: Entenda a crise
Próximo Texto: Obama afirma que golpe abre "terrível precedente" na região
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.