São Paulo, segunda-feira, 30 de julho de 2007

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Canadá mira vácuo dos EUA na AL

Em viagem pela região, premiê canadense busca tratados com países desdenhados por americanos

Harper ressalta diferenças com seu vizinho e critica condições impostas pelos EUA a acordos comerciais com a Colômbia e o Peru

Ryan Remiorz - 16.jul.2007/Associated Press
Harper (à esq.) cumprimenta Uribe na Colômbia; para premiê, é "ridículo" condicionar acordo


CAROLINA VILA-NOVA
DA REDAÇÃO

Liderado por um governo conservador, o Canadá lançou uma ofensiva para aumentar o comércio e o fluxo de investimentos com a América Latina. A estratégia toma partido do vácuo deixado pelos EUA depois que o Congresso americano, de maioria democrata, adiou ou simplesmente vetou os principais tratados de livre comércio que vinham sendo negociados no continente.
Na semana passada, o premiê Stephen Harper fez um tour pela região que culminou com o início formal de negociações comerciais com a Colômbia e o Peru -dois dos maiores aliados de Washington na região que acabaram prejudicados pela oposição democrata -, além da República Dominicana. Ele anunciou ainda novos acordos comerciais com o Chile, com o qual tem um TLC há dez anos.
Já no caso do Peru, a discussão com os EUA foi adiada por vários meses para a inclusão de cláusulas ambientais e trabalhistas no tratado.
O caso colombiano foi mais grave e representou um duro golpe contra o presidente conservador Álvaro Uribe. O Congresso americano rejeitou qualquer discussão comercial até que o país apresente "evidências concretas de resultados" no combate à guerrilha, na proteção dos direitos humanos e nas investigações do escândalo de envolvimento de políticos da base governista com grupos paramilitares de direita.
Assim, devem ter soado como música as declarações de Harper em Bogotá: "Não vamos dizer "conserte todos os seus problemas sociais, políticos e de direitos humanos" e só então entraremos em relações comerciais com você. Isso é ridículo", disse o premiê. "Quando vemos um país como a Colômbia, que decidiu resolver seus problemas econômicos, sociais e políticos de forma integrada, que quer abraçar a democracia e os direitos humanos, então dizemos: "Estamos nessa"."
Grosso modo, o mote de Harper é: o Canadá pode "fazer a diferença". Faz parte de sua estratégia ressaltar dissonâncias dos EUA, como frisou em sua escala no Chile: "As estruturas políticas do Canadá diferem substancialmente daquelas dos EUA. Nossos valores culturais e modelos sociais foram moldados por forças únicas, e fazemos nossas próprias escolhas políticas para alcançar nossos interesses. Queremos que nosso papel no hemisfério reflita essas diferenças", afirmou. "Não está em nosso passado, nem no nosso poder, conquistar ou dominar."

Reforço conservador
A presença canadense na América Latina não é nova, mas ganhou impulso com a ascensão de Harper ao governo, há um ano e meio. Pela primeira vez, o país tem um vice-ministro-assistente para política latino-americana -não há um para África, Ásia ou mesmo para a Europa, parceiros tradicionais.
"Já na década de 90, os governos liberais buscaram elevar o perfil do Canadá no hemisfério", diz Victor Armony, professor de Sociologia da Universidade de Québec em Montréal. "Em um primeiro momento, o governo conservador não havia demonstrado interesse na região, mas Harper decidiu envolver o Canadá na visível tensão entre governos de direita e de esquerda na América Latina, assumindo um papel de equilíbrio em nome da governabilidade", afirmou.
"Esses objetivos se mesclam, claro, com motivações estratégicas: o Canadá pode competir com os EUA, como sócio do Norte, mas também pode ser um aliado de Washington na unificação da América sob o signo da democracia e do liberalismo econômico."
Portanto o "novo modelo de parceira" canadense com a América Latina não ameaça as relações com seu parceiro preferencial nem interfere em sua esfera de poder. "A maior parte de nosso comércio é e continuará sendo com os EUA; o comércio com a América Latina seguirá marginal, ainda que importante. O fortalecimento de nosso compromisso com a região não afetará nossa relação com os EUA, e essa é a consideração mais importante a fazer", diz Carlo Dade, diretor-executivo do think-tank Canadian Foundation for the Americas.


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