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ANÁLISE
Vídeo ajuda tese de Kerry sobre fracasso de Bush
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL À FILADÉLFIA
Osama bin Laden, o homem
mais odiado e mais procurado pelos Estados Unidos, entrou ontem
na campanha eleitoral norte-americana por meio de um vídeo
no qual claramente reforça a propaganda do candidato democrata
John Kerry.
Afinal, Kerry vem usando, como principal mote de sua campanha rumo à Casa Branca, na questão da luta contra o terrorismo, a
crítica ao fato de que, supostamente, o presidente George Walker Bush abandonou a caçada a
Bin Laden para atacar o Iraque,
apesar de saber que não havia ligação entre o anterior regime iraquiano e a rede Al Qaeda.
A aparição do terrorista em todas as emissoras norte-americanas de TV, em pleno horário nobre, acaba sendo uma poderosa
lembrança de que a caçada de fato
fracassou. Pior: Bin Laden posa
até de estadista, diante de uma espécie de pódio, como o que é usado pelo próprio Bush, ainda que
bem mais rústico.
Kerry não perdeu tempo em repetir o seu mote: disse que Bush
tinha a chance de prender Bin Laden em Tora Bora (Afeganistão),
mas "delegou a tarefa aos senhores da guerra afegãos". O candidato democrata foi até cruel: não
usou literalmente "delegou", mas
"outsourced", o novo jargão para
a transferência de tarefas para
países estrangeiros -outra das
inquietações dos norte-americanos, pela perda de postos de trabalho que representa.
Como todas as pesquisas mostram que o ponto forte de Bush é
justamente a guerra ao terrorismo, seu adversário tenta miná-lo
com a ajuda, involuntária ou não,
do líder terrorista.
A reação de George Bush, ao
contrário, foi a previsível. Limitou-se a platitudes, como afirmar
que "a América não será intimidada ou influenciada por um inimigo". É óbvio.
Disse, ainda, que vai ganhar o
confronto contra o terrorismo,
outra coisa obrigatória para se dizer em qualquer circunstância,
mais ainda quando se é desafiado
pelo inimigo.
John Kerry aproveitou para tocar em um ponto da propaganda
adversária, a de que ele, supostamente, seria brando com o terrorismo. Negou qualquer hipótese
de negociação, o que também é
óbvio. Nenhum governante admite que possa negociar com grupos clandestinos e, ainda por cima, violentos.
O candidato do Partido Democrata usou também o episódio para dizer que será "mais efetivo" no
combate ao terrorismo do que
Bush, uma afirmação obviamente
gratuita (não há uma só indicação
objetiva de parte de Kerry sobre
como vai mudar o combate ao
terrorismo). Mas o fato de que a
gravação de Osama bin Laden demonstra que os Estados Unidos
não estão sendo eficientes no
combate ao terrorista número 1
ajuda, como é óbvio, a tese do
candidato democrata.
Em mais de uma emissora de
TV dos EUA, a interferência de
Bin Laden foi comparada ao ataque terrorista aos trens de Madri,
no dia 11 de março deste ano. Motivo: quatro dias depois, haveria
eleições na Espanha. Nos Estados
Unidos, a eleição também será
quatro dias após a difusão do vídeo do terrorista.
Na Espanha, os atentados e,
mais que eles, a maneira como o
governo do conservador José María Aznar tentou manipular a informação a respeito levaram à
derrota do governo, e a vitória da
oposição socialista, parente ideológica de Kerry.
Mas a comparação é, no mínimo, prematura: desta vez, não
houve explosão alguma, e é quase
impossível saber a reação do eleitorado norte-americano. Tanto
pode achar que a propaganda indireta de Bin Laden em favor de
Kerry deve ser frontalmente rechaçada, na medida em que se
trata de um inimigo do país como
pode convencer-se definitivamente de que Kerry tem, sim, razão, ao dizer que Bush fracassou
na guerra ao terror, ao ver que seu
principal comandante continua
vivo, ativo e desafiador.
De todo modo, uma coisa é certa: se havia alguma, desapareceu
qualquer hipótese de que a eleição
de terça-feira seja decidida por algum outro fator que não seja o
terrorismo.
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