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Diálogo entre EUA e Irã desagrada Israel
Presidente Shimon Peres diz em Davos não crer em negociação com "fanáticos religiosos", que acusa de estimular terror
Israelense também não aceita negociar com Hamas e diz que dá por encerrado incidente da véspera com
o primeiro-ministro turco
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A DAVOS
O presidente de Israel, Shimon Peres, não escondeu seu
desconforto com a perspectiva
de que os EUA iniciem um diálogo direto com o Irã. "Não temos nada contra o povo iraniano, e sim contra fanáticos religiosos que querem controlar
toda a região", disse Peres ontem em entrevista a um pequeno grupo de jornalistas. Como o
diálogo não será com "o povo
iraniano", mas com o governo
que Israel considera dominado
por "fanáticos religiosos", o
desconforto fica explícito.
Explícito e explicável: para
Peres -e para a maioria dos
analistas independentes- o Irã
é o padrinho de dois grupos
fundamentalistas cuja principal pauta é a destruição do Estado judeu. São o Hizbollah
(Partido de Deus), que opera no
Líbano, e o Hamas (Movimento de Resistência Islâmico), que
controla Gaza.
Se essa análise é correta, um
diálogo direto entre os EUA e o
Irã se refletiria no Líbano e em
Gaza, os dois pontos negros, no
momento, para a segurança de
Israel. "O Irã financia, arma e
estimula esses dois grupos a
utilizarem o terrorismo", diz
Peres, para apontar para o que
considera inimigo principal.
Peres deu por encerrado o incidente da véspera com o primeiro-ministro turco, Recep
Tayyip Erdogan, que abandonou Davos depois de um bate-boca com ele. O presidente israelense telefonou depois para
Erdogan e, segundo contou,
disse-lhe esperar que um incidente pessoal não interfira nas
(boas) relações entre Israel e
Turquia, que Peres aponta como "uma escolha melhor para o
mundo árabe do que o Irã
-"mais avançada, menos fanática e que não quer a bomba
[atômica]".
O presidente israelense reclamou também do secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon,
que, no debate da véspera, criticara o ataque de Israel ao escritório da ONU em Gaza. "Poderia ter sido mais polido", diz.
O presidente de Israel discorda da visão que predomina
na mídia ocidental, segundo a
qual Israel perdeu a batalha de
imagem com a invasão de Gaza
e, portanto, teria ficado isolado
-de que o incidente com Erdogan seria um reflexo.
Peres, ao contrário, prefere
contar que Israel recebeu, privadamente, pedidos de líderes
árabes para que resolvesse o
problema do Hamas. A Folha
perguntou quais países, mas
Peres escapou: "Mesmo que eu
lhe dissesse reservadamente,
você publicaria".
O presidente israelense faz
todo o esforço para demonstrar
que nem Israel nem ele têm
restrições aos palestinos. Lembrou, por exemplo, que, em
certa ocasião, foi ao Parlamento sueco com o então líder Iasser Arafat (1929-2004) pedir
recursos para os palestinos.
Hamas e OLP
Peres insiste também na tremenda complexidade da questão israelo-palestina, "pelos
2.000 anos de história, pelas religiões [que têm locais sagrados
na região] e pelas emoções" que
o tema desperta. Tanto é assim
que todas as sessões sobre
Oriente Médio realizadas em
Davos tiveram lotação completa, mesmo em meio a uma crise
econômica, que é o tema preferido para os empresários, a
clientela de Davos.
A Folha lembrou a Peres, 85
anos, que ele era do tempo em
que Israel considerava a OLP
(Organização para a Libertação
da Palestina) e Arafat, seu líder
máximo, como "terroristas", o
que não impediu a negociação
que desaguou nos Acordos de
Oslo, o ponto mais próximo da
paz a que se chegou.
"Seria possível imaginar ainda no seu tempo de vida idêntica negociação com o Hamas?"
Peres preferiu contar a história de uma reunião da Internacional Socialista, da qual era vice-presidente como representante do Partido Trabalhista israelense, em que foi apresentada moção para que a OLP fosse
aceita na Internacional. Peres
foi o único a se opor, e disse
que, em vez de pressioná-lo a
aceitar a OLP, deveriam pressionar Arafat para que mudasse a carta de fundação da OLP
que, como hoje a do Hamas,
pregava a destruição de Israel.
Foi o que fez a Internacional
Socialista com êxito. Por isso,
Peres sugere que a comunidade
internacional pressione o Hamas a mudar: "Eles têm que
mudar, para o benefício de suas
próprias crianças".
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