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HISTÓRIA
Duas décadas após a guerra, habitantes das ilhas britânicas prosperam, enquanto argentinos enfrentam crise
Malvinas vivem contraste com a Argentina
GUSTAVO CHACRA
DA REDAÇÃO
Vinte anos após a invasão argentina às Ilhas Malvinas, os kelpers, como são denominados os
ilhéus, vivem em um cenário totalmente distinto do da crise pela
qual passa a Argentina.
Os 2.913 habitantes das Falklands, nome britânico das ilhas
-são uma Dependência do Reino Unido-, têm pleno emprego,
inflação de 1% ao ano, educação
gratuita até a universidade, criminalidade zero, uma renda per capita de US$ 21 mil por ano e um
superávit de US$ 8,55 milhões,
equivalente a 11,5% da receita. A
ilha tem reservas suficientes para
cobrir dois anos de despesas sem
precisar arrecadar um centavo.
Um grande contraste com a Argentina, onde o desemprego se
aproxima de um quinto da força
de trabalho, a cotação da moeda
está fora de controle, teme-se o retorno da hiperinflação e dois presidentes renunciaram ao cargo.
De acordo com Michael Heart,
assessor econômico -espécie de
ministro da Economia- das
Malvinas, as ilhas vivem um
"boom" econômico com o desenvolvimento do setor pesqueiro
nos últimos anos e hoje a economia é auto-suficiente.
Mas não só na economia a situação das Malvinas se difere da situação argentina. As ilhas não
têm hoje praticamente nenhuma
ligação com os argentinos.
A quase totalidade dos kelpers
são de origem britânica. E nenhum deles é argentino ou descendente. Os últimos habitantes
argentinos deixaram as ilhas
quando foram expulsos pelos britânico em 1833, em um dos vários
episódios de confrontação entre
os dois países por um território
praticamente isolado no Atlântico sul, distante 480 km do ponto
mais próximo da América do Sul,
não por acaso, a costa argentina.
Para chegar às ilhas, é preciso
pegar um avião em Santiago, no
Chile, fazer escala em Punta Arenas, no sul do país, antes de chegar a Port Stanley (Puerto Argentino, para os argentinos), capital
das ilhas. O valor da passagem do
vôo semanal é de US$ 675 a partir
de Santiago. Desde 1999, os argentinos podem visitar as Malvinas,
após acordo entre Londres e Buenos Aires. Uma vez por mês, o
vôo faz escala no sul argentino.
Porém pouco mais de cem turistas argentinos vão anualmente
para as ilhas reclamadas pela Argentina há quase 182 anos.
Em 1820, os argentinos, independentes anos antes da Espanha,
reivindicaram pela primeira vez a
soberania sobre as Malvinas, considerada parte de seu território.
Nos séculos anteriores, porém, as
ilhas haviam sido disputadas pelo
Reino Unido e pela Espanha. Em
1774, os britânicos foram expulsos pelos espanhóis das ilhas.
Em 1828, a Argentina povoou
pela primeira vez o local, permanecendo no território até 1833.
Não foi preciso disparar um tiro
para que os argentinos deixassem
as Malvinas.
No século passado, os argentinos tentaram retomar as ilhas por
uma via negociada com os britânicos. Porém as negociações sempre foram infrutíferas.
Em 2 de abril de 1982, a Junta
Militar da Argentina decidiu invadir as Malvinas, mas acabaram
derrotados em batalha pouco
mais de dois meses depois. Cerca
de 650 argentinos e 258 britânicos
morreram no conflito.
Hoje, os ilhéus evitam falar sobre os argentinos. Com uma relativa autonomia em relação ao Reino Unido, uma incorporação das
ilhas ao território argentino é uma
opção totalmente descartada, segundo Lisa Redel, editora do
"Penguin News", principal jornal
das Malvinas, com circulação de
1.600 exemplares semanais.
Para a editora, a principal importância dos argentinos para o
território se daria no setor turístico, devido à proximidade entre os
dois países. Nada além disso.
"Os kelpers tem vida própria.
Temos nosso próprio governo,
nossa moeda", afirmou Redel,
por telefone, à Folha.
A moeda do país é a libra das
Falklands, com paridade de um a
um com a libra britânica. Não se
sabe o que aconteceria se o Reino
Unido adotasse o euro como
moeda. Talvez as Malvinas se tornassem o primeiro lugar do hemisfério Sul a ter a moeda comum
européia em circulação.
A ilha, apesar de ter um governador-geral nomeado pela coroa
britânica, é efetivamente governada por três conselheiros executivos, escolhidos entre oitos conselheiros legislativos das ilhas, que
são eleitos pela população.
Não há partidos nas Malvinas.
Trabalhistas e conservadores não
existem em Port Stanley.
A candidatura dos conselheiros
é individual. E todos podem se
candidatar.
A maior parte dos habitantes
trabalha para o governo ou no setor pesqueiro. Cerca de 10% da
população possui um segundo
emprego; 20% dos aposentados
continuam trabalhando apesar de
receber pensões. No interior das
ilhas, a principal atividade é a
criação de ovelhas.
Em um local onde nasceram
apenas 27 pessoas no ano passado, sendo 15 homens e 12 mulheres, os jovens têm poucas opções
de lazer. Segundo a editora do
"Penguin News", três pubs são as
únicas áreas de lazer públicas à
noite. Durante o dia, especialmente no verão, as práticas esportivas são vela, futebol e golfe. No
inverno, o squash é popular. Apesar da escassez de lazer, a quase
totalidade dos jovens volta às
ilhas após estudar na Inglaterra, à
custa do governo das Malvinas.
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