São Paulo, quarta-feira, 31 de março de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Prisões podem inflamar relações inter-raciais

KIM SENGUPTA
DO "INDEPENDENT"

A revelação de que os oito homens presos ontem em operação antiterrorismo em Londres e arredores eram todos cidadãos britânicos, alguns nascidos no Reino Unido e outros residentes no país há muitos anos, é uma notícia que preocupa profundamente os órgãos de segurança.
Ela ilustra o fato de que os potenciais terroristas podem não estar vindo de fora, mas ser pessoas nascidas e criadas no país.
Os serviços de segurança temem que jovens britânicos de origem asiática estejam sendo a tal ponto radicalizados pela forma mais virulentamente intransigente de islamismo que estariam sendo preparados para mutilar e matar seus concidadãos.
Existem paralelos entre essa nova variedade de suspeitos terroristas criados nacionalmente e os chamados "lilywhites" (o nome significa branco como um lírio, no sentido de puro ou inocente) utilizados pelo grupo terrorista norte-irlandês IRA Provisório. Este empregava pessoas de ascendência irlandesa, residentes na Inglaterra e sem laços conhecidos com grupos republicanos, para realizar atentados.
Tudo indica que os grupos extremistas islâmicos estejam utilizando a mesma tática com britânicos de origem asiática que fazem parte da comunidade asiática do Reino Unido e não são conhecidos por ter vínculos com os suspeitos de sempre.
Para fontes antiterroristas, é um engano acreditar que o que sobrou da hierarquia da Al Qaeda -Osama bin Laden, Abu Masab Al Zarqawi e um punhado de outros- mantém um centro de comando e controle, dirigindo operações a partir de seu esconderijo nas montanhas do oeste do Paquistão.
Os ataques desferidos em Istambul (novembro de 2003, 61 mortos), na Arábia Saudita (maio de 2003, 35 mortos) e em Bali (outubro de 2002, 202 mortos) mostram que a Al Qaeda lança um pedido de ataque e que este, então, é realizado pelas células de simpatizantes locais.

Efeitos incendiários
A etnia das pessoas que realizam os ataques depende, até certo ponto, da composição étnica da população muçulmana residente no país.
A Espanha, alvo de atentado no último dia 11, possui grande número de habitantes de origem norte-africana. O Reino Unido tem uma grande população de origem paquistanesa.
De acordo com fontes do setor de segurança, cerca de 4.000 britânicos passaram por treinamentos nos campos da Al Qaeda no Afeganistão e no Paquistão antes da Guerra do Afeganistão, no final de 2001.
A grande maioria dessas pessoas voltou à sua vida normal, sem nenhum envolvimento adicional em atividades relacionadas ao terrorismo. Mas alguns poucos dos que fizeram o treinamento continuaram comprometidos com idéias extremistas e vêm atuando como recrutadores para a causa, além de elos de ligação com grupos de orientação semelhante no exterior.
Fazer frente a esse fenômeno é uma tarefa de efeitos potencialmente incendiários para as relações inter-raciais no Reino Unido.

Conversações
O comissário-assistente da Scotland Yard Peter Clarke, responsável pelas ações contra o terrorismo, disse que altos funcionários da polícia estão mantendo conversações em nível local e nacional para tratar de questões surgidas na esteira das prisões.
Clarke afirmou que a maioria dos muçulmanos no Reino Unido respeita a lei e "rejeita completamente todas as formas de violência", mas disse que é preciso investigar as suspeitas. Mas dirigentes islâmicos do país, que acusam a mídia e a polícia de "demonizar" os muçulmanos, manifestaram preocupação.


Texto Anterior: Saiba mais: Explosivo achado é o preferido da rede Al Qaeda
Próximo Texto: Choques deixam 23 mortos no Uzbequistão
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.