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Empresa dos EUA financiou "paras" em programa oficial
Chiquita dava dinheiro a grupos armados colombianos por meio de patrulha que tinha apoio do então governador Uribe
Revelação se encontra em documentos da inteligência norte-americana que vieram a público por meio de ONG de Washington
FABIANO MAISONNAVE
DE CARACAS
Documentos de inteligência
dos EUA revelam que o governo colombiano tem há dez anos
conhecimento da infiltração
paramilitar na Convivir, uma
rede de cooperativas rurais de
segurança criada pelos militares para fazer patrulhas e obter
informações sobre a guerrilha,
cuja atuação tinha o apoio do
então governador do departamento (Estado) de Antioquia,
Alvaro Uribe.
Foi por meio dessa rede que a
empresa americana Chiquita
realizou parte dos pagamentos
ilegais às Autodefesas Unidas
de Colômbia (AUC), coalizão
de grupos paramilitares.
O escândalo dos pagamentos
da Chiquita começou há duas
semanas, quando a empresa,
que trabalha com exportação
de bananas, admitiu a um tribunal nos EUA ter pago US$ 1,7
milhão aos "paras" entre 1997 e
2004, em troca de "proteção".
Até 2001, quando as AUC foram classificadas como "organização terrorista" pelos EUA,
os pagamentos eram feitos por
meio de cheques a várias unidades da Convivir, que repassava
o dinheiro aos paramilitares.
Multa de US$ 25 milhões
A Chiquita terá de pagar uma
multa de US$ 25 milhões ao
Departamento da Justiça dos
EUA, que havia indiciado a empresa pelos pagamentos, feitos
na área de Urabá, departamento de Antioquia, berço político
do presidente Alvaro Uribe.
Os documentos, publicados
anteontem pela ONG Arquivo
Nacional de Segurança (NSA,
na sigla em inglês), com sede
em Washington, mostram que,
já em 1997, o governo colombiano tinha indícios de relações
entre paramilitares e a Convivir. Naquela época, Uribe era o
governador de Antioquia
(1995-1997) e apoiava as cooperativas de segurança.
De acordo com um relatório
da Embaixada dos EUA em Bogotá enviado em outubro de
1996, Uribe disse que a Convivir "havia levado à captura de líderes guerrilheiros na região" e
exortou o governo a armar alguns dos grupos, organizados
em patrulhas rurais.
Em 15 de julho de 1997, um
documento da inteligência
americana traz o depoimento
de um coronel do Exército colombiano, segundo o qual o governo federal sabia do risco de o
programa Convivir "se desenvolver completamente em paramilitares".
Outros documentos do mesmo período revelam que as
Forças Armadas colombianas
tinham um comportamento de
"inação" contra os paramilitares, aliados tácitos contra as
Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia).
"A novidade é que temos essa
quantidade de documentos
que, juntos, mostram essa relação", disse à Folha Michael
Evans, pesquisador da NSA.
"O indiciamento pelo Departamento da Justiça no caso
Chiquita é realmente a chave
disso tudo, porque deixa bem
claro como a Convivir, essa rede de segurança mantida pelo
governo e pelos militares, era
de fato a ligação entre a Chiquita e os paramilitares da AUC.
Mostra um nível de infiltração
paramilitar nesse programa sobre o qual ainda não se sabia."
O pesquisador afirma que
não está claro qual era o papel
do governo de Antioquia na
atuação da Convivir, apenas
que Uribe era um "grande defensor" do projeto.
"Um dos argumentos que esses documentos produzem é
que, naquela parte da Colômbia, naquela época [1997],
quando começou o relacionamento entre a Chiquita e as
AUC, os paramilitares eram a
lei. A intenção não é dizer que a
Chiquita não é a culpada, mas
mostrar que o governo colombiano havia cedido aquela parte do país aos paramilitares."
Governo não comenta
A Folha entrou em contato
por telefone ontem com a assessoria de imprensa da Presidência da Colômbia e foi orientada a submeter as questões
por escrito. Até o final desta
edição, as perguntas não haviam sido respondidas.
Uribe enfrenta um escândalo
político sobre o envolvimento
de membros de sua base parlamentar com o paramilitarismo.
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