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São Paulo, sábado, 31 de maio de 2003

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UNIÃO EUROPÉIA

Chanceler do Vaticano critica esboço de Constituição do bloco, que não põe cristandade como valor europeu

Igreja e direita querem Deus na Carta da UE

MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO

O chanceler do Vaticano, o arcebispo Jean-Louis Tauran, acusou ontem a União Européia de desrespeitar a história do continente ao não colocar a cristandade no esboço de Constituição do bloco, que foi divulgado nesta semana e está sendo debatido em Bruxelas.
O texto, cuja versão final deverá ser apresentada numa cúpula da UE em três semanas, não contém nenhuma referência a Deus ou a Jesus Cristo apesar do forte lobby realizado pelo papa João Paulo 2º, por líderes de outras igrejas cristãs e por partidos de direita, sobretudo democrata-cristãos.
"Trata-se de uma manobra ideológica, que revela uma tentação inaceitável de reescrever a história por parte daqueles que redigiram esse texto", declarou Tauran em entrevista ao diário italiano "Corriere della Sera".
O Vaticano se disse "surpreso" com a omissão da referência à cristandade e pediu que a palavra fosse inserida na versão final "por respeito à verdade histórica e para equilibrar mais o texto".
No preâmbulo do esboço, que foi redigido pela Convenção sobre o Futuro da Europa (CFE), há uma menção à "herança humanista, religiosa e cultural" da Europa, uma à civilização greco-romana e outra ao Iluminismo, mas nenhuma a Deus ou a Cristo.
De acordo com Françoise de la Serre, do Centro de Estudos e de Pesquisas Internacionais (Paris), a "preocupação da CFE é não impossibilitar a eventual adesão da Turquia ao bloco", pois o país é "majoritariamente muçulmano".
"A situação da Turquia será revista em 2004, e as negociações poderão começar em 2005. Os países da UE fizeram promessas aos turcos e não podem agora simplesmente estabelecer que pretendem ser um clube judaico-cristão. Isso seria uma afronta aos muçulmanos que já vivem no bloco, além de inviabilizar as negociações com a Turquia", explicou De la Serre à Folha.
Ademais, vale ressaltar que a Europa atual tem uma forte tradição secular. Assim, não são poucos os cientistas políticos que não querem ver a religião e a política combinadas. "Não teria sentido fazer a UE voltar aos tempos em que a igreja tinha muita força política. A Europa já virou essa página de sua história", apontou Michael Kreile, professor na Universidade Humboldt, de Berlim.
De la Serre lembrou que pode haver razões políticas específicas para a defesa da inclusão da cristandade na Constituição por parte de alguns partidos políticos de direita ou de centro-direita.
"Não se deve esquecer que, se for aceita, a Turquia se tornará o maior país da UE num futuro não muito distante, transformando o modelo de integração do bloco existente até agora. O país terá perto de 100 milhões de habitantes em 30 anos se as atuais tendências demográficas se mantiverem", analisou De la Serre.
A Turquia tem hoje cerca de 67 milhões de habitantes, enquanto a Alemanha tem 81 milhões. Porém a população turca cresce quase cinco vezes mais rápido que a alemã, segundo a ONU.


Com agências internacionais


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