São Paulo, segunda-feira, 31 de julho de 2006

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GUERRA NO ORIENTE MÉDIO

Israel pára ataques aéreos por 48 horas após bombardeio matar 56 libaneses

Dos mortos, 37 eram crianças; massacre provoca repúdio internacional e aumenta pressão por cessar-fogo imediato

Explosivos destruíram edifício na cidade de Qana onde duas famílias, sem dinheiro para deixar a área, se escondiam no porão

DA REDAÇÃO

Um ataque aéreo de Israel matou ontem pelo menos 54 libaneses, incluindo 37 crianças, na cidade de Qana -a mesma onde um bombardeio israelense matou mais de cem civis, em 1996. Foi o maior ataque em número de mortos desde o início do conflito, iniciado depois que o grupo terrorista Hizbollah seqüestrou dois soldados israelenses, em 12 de julho.
O governo israelense lamentou o episódio e decidiu suspender os bombardeios no sul do Líbano por 48 horas, até que o Exército conclua um inquérito sobre o ocorrido em Qana. As autoridades, falando em condição de anonimato por não terem sido autorizadas a dar declarações à imprensa, disseram que a pausa deveria começar "imediatamente".
O bombardeio provocou protestos na Europa e em países muçulmanos, fez crescer os apelos internacionais por um cessar-fogo e provocou a suspensão das negociações iniciadas no sábado na região pela secretária de Estado americana, Condoleezza Rice. O governo libanês, que acusou Israel de "terrorismo", deixou claro que ela não seria bem-vinda a Beirute ontem, onde tinha uma visita planejada.
Durante todo o dia, equipes de socorro às vítimas em Qana, que fica a 85 km de Beirute e a 11 km da fronteira israelense, removiam com as próprias mãos os escombros do edifício de três andares, em cujo porão estavam mais de 60 refugiados. Eram membros de duas famílias que se escondiam ali em busca de proteção, por não poderem pagar um táxi para deixar Qana.
No resgate, corpos de crianças cobertos por poeira eram retirados de baixo dos escombros de concreto. Os últimos corpos a ser retirados dos escombros eram justamente os menores -às vezes intactos, mas com os pulmões destruídos pela forte corrente de ar do bombardeio.
Muitos morreram enquanto dormiam. "Por que atacaram crianças de um, dois anos, e mulheres indefesas?", perguntava Mohamed Samai, que estava no local.
Os corpos foram enrolados em plástico e levados para uma tenda. Flores eram colocadas ao lado dos cadáveres. Duas escavadeiras, uma delas fornecida pela ONU, também eram usadas no resgate, mas os membros das equipes de ajuda diziam precisar de mais equipamentos para a remoção dos escombros.
Segundo testemunhas, no início da madrugada de ontem houve duas explosões no prédio. Os sobreviventes da primeira, desesperados, corriam de um lado para o outro, até que houve a segunda explosão. Foram encontrados oito sobreviventes, com ferimentos.
"Deus é grande", murmurava um policial que levava nos braços um menino de no máximo dez anos, coberto por poeira e com nariz e ouvidos ensangüentados.
O resgate seguia, enquanto jatos israelenses continuavam sobrevoando a cidade.

Desacordo
A suspensão dos sobrevôos israelenses no sul do Líbano foi anunciada pelo porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, Adam Ereli. Segundo ele, Israel manteve o direito de atacar se souber de ataques preparados contra o Estado.
Em Jerusalém, o porta-voz do Exército israelense disse não saber nada sobre um acordo para suspender temporariamente os ataques aéreos ao Líbano.
Um membro do Departamento de Estado disse, sob condição de anonimato, que Condoleezza Rice já estava negociando um acordo como esse antes do ataque a Qana.
Uma sessão extraordinária do Conselho de Segurança das Nações Unidas foi convocada na manhã de ontem, e o secretário-geral da ONU, Kofi Annan, instou o conselho a condenar o ataque e a pedir o fim imediato das hostilidades.
O premiê israelense, Ehud Olmert, "lamentou profundamente" o bombardeio, mas garantiu que a guerra contra o Hizbollah continuaria. Ontem, o premiê israelense disse a Rice que o Exército de seu país precisaria de entre dez e 14 dias para apertar a ofensiva contra o Hizbollah, segundo um porta-voz do governo.
A raiva tomou conta do Líbano e do mundo árabe. Manifestantes chegaram a promover quebra-quebra diante do prédio da ONU no centro de Beirute. O premiê libanês, Fouad Siniora, disse que não negociaria antes de um cessar-fogo.
O Hizbollah prometeu retaliação. "Esse massacre terrível não vai ficar sem resposta", declarou. O grupo extremista palestino Hamas também prometeu ataques a Israel.
Pelo menos 561 pessoas foram mortas no Líbano desde o início do conflito, a maioria civis. Em Israel, os mortos são 51.


Com agências internacionais


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