São Paulo, domingo, 31 de julho de 2011 |
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Guru da moratória da Argentina pede limite ao sistema financeiro Lavagna, ex-ministro que conduziu saída do país da crise de 2001, afirma que a Grécia é bode expiatório
Para ele, transformados em fortes atores políticos, os mercados impedem o uso de medidas corretivas para a solução das crises
Folha - A Europa não olhou para o exemplo argentino ou as crises são incomparáveis? Roberto Lavagna - Algumas coisas, especificamente na Grécia, são muito parecidas com a Argentina. Os deficits fiscal e em conta corrente, a moeda que não contempla a produtividade média, a recessão, além de uma dívida alta em relação ao PIB. Distinto é o plano institucional. A Argentina era um país isolado, dentro de um Mercosul sem capacidade de atuar em situações desse tipo. A Grécia integra um dos conjuntos econômicos e políticos mais estruturados no mundo. Essa é uma grande diferença. A outra é que a divida grega, que chega a 90% do PIB, está emitida em moeda nacional, em euro. E qual é a vantagem disso? Aplica-se a legislação nacional. A Argentina tinha uma dívida emitida em oito legislações e em oito moedas diferentes. O processo foi infinitamente mais complexo. A situação social da Grécia também é muito melhor. O calote grego é inevitável? O [segundo] pacote tem reestruturado a dívida. Ainda há dúvidas, mas o enfoque agora é distinto, não simplesmente de que a Grécia é a culpada e tem que se ajustar. Agora o enfoque é sistêmico. A Grécia foi o bode expiatório? Sim. A Argentina sabe disso muito bem -o país era culpado enquanto as responsabilidades também eram do sistema financeiro, do FMI e de outros. É muito similar. E em relação à dívida dos EUA, há algum ponto em comum? Nesse caso o problema é basicamente de ordem política, mas há coisas para corrigir. Os EUA precisam controlar sua dívida. Um ponto comum entre Europa e EUA é que nenhum deles foi capaz de impor limites ao funcionamento do sistema financeiro. Impor limites ao setor financeiro resolveria a crise? Não, mas ajuda para que ela não se repita. Sem resolver isso veremos novos problemas em outros países. Nos últimos 15 anos tivemos crise no México (1995), Rússia (1998), Brasil e sudeste asiático (1999), Argentina (2001). A causa é um sistema financeiro que se converteu em um ator político tão forte que, em vez de corrigir os problemas, impede a aplicação de medidas corretivas. A América Latina vê na Europa um cenário conhecido. Como a região pode tirar proveito disso? As mudanças estruturais começam com a presença de China e Índia comprando produtos de países como Brasil, Argentina e Uruguai. Há uma oportunidade excepcional se isso for aproveitado, mas também pode servir para financiar políticas equivocadas, como acontece na Argentina. Os países latino-americanos ainda não resolveram algumas coisas, como a valorização da moeda nacional. Isso existe no Brasil por causa da política monetária e na Argentina pelo descontrole do programa econômico. Os países precisam perder a vergonha e tomar medidas efetivas nessa área. A Argentina pode ser apresentada como exemplo de país que deu o calote e se recuperou com êxito? Não gosto de países- exemplos, passam uma falsa ideia. O FMI durante muito tempo cometeu besteiras ao dizer que a Nova Zelândia era um exemplo para o mundo, mas o Brasil, por exemplo, não tem como copiar uma ilha. O programa que o FMI apresentou à Grécia é similar ao apresentado à Argentina em 1999 e em 2001. O Fundo não mudou, mas perdeu relevância. Antes, os países mais endividados eram Brasil, Turquia e Argentina, nessa ordem. Agora são Grécia, Irlanda e Portugal. Texto Anterior: Clóvis Rossi: EUA perdem o AAA na política Próximo Texto: Frases Índice | Comunicar Erros |
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