São Paulo, segunda-feira, 31 de agosto de 2009

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Vice de Bush admite depor sobre atos da CIA

Cheney critica iniciativa do governo Obama de investigar supostos abusos, mas diz que falaria "dependendo das circunstâncias"

Republicano afirma que defendia o ataque militar contra o programa nuclear iraniano, mas que decisão sobre tema não cabia a ele

SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON

Pela primeira vez, o ex-vice-presidente americano Dick Cheney admitiu que, se convocado e dependendo das circunstâncias, pode dar seu testemunho na investigação sobre as denúncias de abusos cometidos pela CIA, a agência de inteligência americana, durante a chamada "guerra ao terror" levada a cabo no governo de George W. Bush (2001-2009).
Há uma semana, o presidente Barack Obama deu sinal verde para que seu secretário da Justiça, Eric Holder, nomeasse um promotor especial para investigar o assunto. Indagado ontem pela Fox News sobre o assunto, Cheney criticou duramente a decisão de Obama, chamando-a de "terrível", movida por interesses políticos e "devastadora" para a comunidade de inteligência.
Ainda assim, deixou a porta aberta para falar com o promotor John Durham, responsável pelas investigações. "Dependerá das circunstâncias e do que eu achar que são as atividades em que eles [os investigadores] estão envolvidos", respondeu Cheney ao ser indagado se falaria. "Tenho sido muito franco sobre minha visão nesse assunto e muito direto publicamente ao falar de meu envolvimento nessas políticas."
Cheney é tido como o autor intelectual do conjunto de medidas de exceção adotadas em missões contraterrorismo pós-11 de Setembro, que, segundo relatórios tornados públicos desde então, levaram à tortura de suspeitos sob custódia dos EUA durante interrogatórios. A agência que comandou grande parte das sessões foi a CIA.
Cheney disse ter "muito orgulho do que nós fizemos em termos de defender a nação pelos últimos oito anos de maneira bem-sucedida". Disse ainda que não será preciso um promotor para descobrir o que ele pensa. Na entrevista, ele voltou a falar que sabia do uso da prática de "waterboarding", que provoca no interrogado a sensação de afogamento.
Segundo os documentos, um dos detidos, Khalid Sheik Mohammed, foi submetido à prática 183 vezes apenas em março de 2003. Cheney e os que defendem as chamadas "técnicas melhoradas de interrogatório", eufemismo empregado pela gestão Bush, dizem que o resultado foram informações valiosas contra a organização terrorista Al Qaeda.
Críticos discordam. É o caso, por exemplo, de Jane Mayer, autora de um dos melhores livros sobre o assunto e o período, "The Dark Side - The Inside Story of How the War on Terror Turned into a War on American Ideals" (O Lado Escuro -Os Bastidores de Como a Guerra ao Terror Virou Uma Guerra contra os Ideais Americanos, Doubleday, 2008).
Segundo a jornalista, KSM, como o detido ficou conhecido depois, já havia dado as mesmas informações que os agentes conseguiram por força antes mesmo de ser preso, em entrevistas para TVs árabes. "Ele tinha orgulho de seu papel como autor intelectual do 11 de Setembro", disse Mayer. "Ele adora falar sobre o assunto."

Ataque ao Irã
Na mesma entrevista à Fox News, Cheney diz que era a favor da opção militar como forma de deter o programa nuclear iraniano. "Quem tinha de tomar a decisão não era eu", disse ele -desde o fim do governo, vazaram relatos que dão conta de uma tensão entre o vice e Bush no fim da gestão.
"Eu era provavelmente um defensor maior da ação militar do que qualquer um de meus colegas", disse ele. "Achava que as negociações não seriam bem-sucedidas a menos que os iranianos realmente acreditassem que nós estávamos preparados para o uso de força militar." Desde a posse, Obama optou pela tática de abertura ao diálogo com Teerã, que, no entanto, ainda não respondeu afirmativamente à iniciativa.


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