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ANÁLISE
Brasil fez tudo o que podia; era pouco
CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA
A curta e asséptica nota com
que o Itamaraty anuncia a sua
"satisfação" com o acordo alcançado em Honduras diz bem
do pouco que o país fez ou podia fazer na crise.
A rigor, a única atividade brasileira no imbróglio foi passiva:
deixar que sua embaixada em
Tegucigalpa servisse de residência para o presidente deposto Manuel Zelaya.
Tudo o mais foi, digamos,
apertar o "enter" de um programa que todo o mundo, literalmente, utilizou: condenar o
golpe, primeiro; exigir a volta
de Zelaya; apoiar as gestões negociadoras, impor sanções ao
governo golpista. Pode ser muito ou pouco, conforme o ponto
de vista de cada qual, mas foi
claramente insuficiente para
resolver a situação, o que só
acabou acontecendo quando os
Estados Unidos chamaram golpista e golpeado às falas.
É justo, no entanto, reconhecer que, desde os primeiros
dias, o chanceler Celso Amorim
e o próprio presidente Lula haviam dito que só os Estados
Unidos tinham bala suficiente
na agulha para desatar o nó.
O que equivale a reconhecer
indiretamente que ao menos
àquela parte das Américas não
chega a liderança brasileira.
Tampouco chega a venezuelana. Hugo Chávez chegou a
ameaçar "quebrar" os golpistas,
na sua retórica sempre colorida
e incendiária. Não quebrou
nem tinha cacife para fazê-lo.
Aliás, o "bolivarianismo" é o
principal perdedor da crise toda. O objetivo dos golpistas
sempre foi o de impedir a permanência no poder de um presidente nascido das costelas do
conservadorismo hondurenho
e, de repente, "bolivarianizado". Impediram por quatro meses, bloquearam qualquer hipótese de reeleição e parece altamente improvável que surja
um herdeiro de Zelaya para
vestir, com alguma força, a camisa vermelha dessa corrente.
Pelo menos nas eleições de
novembro, que, em tese, zerarão a crise de uma vez, não há
um candidato que possa representar o incipiente "zelaysmo".
O presidente, de resto, já havia
perdido as eleições internas em
seu partido.
Diante da resistência de uma
fatia importante dos fatores de
poder em Honduras ao "bolivarianismo", o razoável é supor
que o presidente que venha a se
eleger em novembro será no
mínimo cauteloso. Até porque
todo o mundo viu que o sétimo
de cavalaria que desfez o cerco
aos supostos mocinhos não
vestia vermelho, mas a velha
bandeira das listas e estrelas,
sempre presente nessa parte do
mundo.
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