São Paulo, quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

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A REVOLUÇÃO AOS 50 / FUTURO INCERTO

Congresso do PC ditará alterações

Raúl Castro transfere para o partido expectativa de mudanças por ele definidas como "estruturais"

Congresso, que só deve ocorrer no fim de 2009, também definirá se Fidel continuará como figura mais importante do partido

FLÁVIA MARREIRO
ENVIADA ESPECIAL A HAVANA

O 50º Ano do Triunfo da Revolução -o nome oficial de 2009 em Cuba- nem começou, mas já se projeta que o 6º Congresso do Partido Comunista Cubano será seu programado evento transcendente.
É lá, segundo Raúl Castro afirmou no sábado, que se discutirão e aprovarão as "transformações estruturais e de conceito" ansiados pela ilha.
Assim, Raúl transfere para o encontro as expectativas em torno de seu governo -que começou com mudanças pontuais na liberação de consumo e no arrendamento de terras.
O congresso, o primeiro a ser realizado pela legenda e a máxima autoridade legal em Cuba em 12 anos, não tem data marcada. O presidente afirmou que ocorreria "no fim de 2009".
"Quando se anuncia um, tudo vira congresso. Pelos debates de 2007 e pelo que sei, há efervescência na base por mudança", diz o economista e jornalista Oscar Chepe, 70, que militou no PCC até os anos 80, quando virou dissidente.
Preso em 2003, na última grande onda de prisão de dissidentes, ele está em liberdade condicional desde o começo do ano por motivos de saúde.
"O Congresso é o temor dos "talebans". E nós sabemos quem é o líder do grupo. Ele acha que reformas econômicas é tirar a população da tutela do Estado, é ante-sala de reformas políticas", continua Chepe, citando a ala ortodoxa do partido e referindo-se a Fidel Castro.

Status de Fidel
O congresso será o momento-chave para decidir o status de Fidel no futuro do regime -uma definição importante quando vários analistas se inclinam ao consenso de que o Castro mais velho é o freio anti-reformas. Afastado formalmente da Presidência do Conselho de Estado, ele mantém o cargo mais alto da hierarquia, o de primeiro secretário-geral do partido. Raúl é o segundo.
Para Julia Sweig, especialista em Cuba do americano Council on Foreign Relations, pode ser esse o momento de Fidel deixar o posto no partido.
"Se é verdade que o "revival" do Partido Comunista é essencial para a expansão do poder político internamente -e Raúl disse que o único substituto para Fidel Castro é o PC- não faria nenhum sentido, em termos dos atores geracionais que precisam conquistar, manter Fidel como secretário-geral." Nas ruas, não se identifica uma nova liderança clara.
"Quem pode substituir Raúl? Eu também me faço essa pergunta", devolve Maria, 59, professora de química aposentada.

Jovens
Para o historiador brasileiro Luiz Alberto Moniz Bandeira, estudioso de Cuba desde os primórdios da revolução, "é difícil saber o que se passa no PC cubano", mas a influência de Fidel deve ser relativizada. Ele diz que Cuba já estava, mesmo antes da doença de Fidel, em 2006, num governo pós-Castro e havia armado uma equipe de confiança. Nela estão os mais novos Felipe Pérez Roque, chanceler e ex-secretário pessoal de Fidel, identificado por vezes como "taleban", e Carlos Lage, que faz as vezes de premiê e comanda o programa energético.
Se não há os tão novos na cúpula, o mesmo não ocorre na Assembléia Nacional -embora até estudantes pró-revolução tenham se queixado de que deputados não têm vínculo com a população. A média etária entre os 614 deputados é de 49 anos. A mais jovem é Liaena Hernández Martínez, 18.
Independentemente do que aconteça no congresso, Chepe acredita que possa ser tarde para uma mudança. "Não prevejo mudanças bruscas nem defendo choques de nenhum tipo, nem econômico nem social. O que quero é uma aterrissagem gradual até a democracia. Mas, com a situação econômica como está, é reforma ou caos." Segundo ele, que atuou como diplomata no Leste Europeu, uma possível decisão do presidente eleito Barack Obama de liberar viagens de cubano-americanos e envio de remessas pode ter um efeito acelerador dos anseios por mudança.
"Quando os alemães foram à Polônia desculpar-se pela atrocidade da guerra, isso gerou um clima até [o presidente americano Ronald] Reagan [1981-1989] acabar com o embargo à URSS. Tudo isso criou um clima favorável, pois o oxigênio desses regimes era a noção de que, ao menor suspiro, viriam os tanques."

Colaborou ANDREA MURTA, de Nova York

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