São Paulo, domingo, 27 de junho de 2004


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DIZER "NÃO"

Tentação de aceitar trabalhos é grande, mas negativas mantêm empresas na direção certa

Recusar cliente exige maturidade

FREE-LANCE PARA A FOLHA

Não se trata de luxo: toda empresa, independentemente de seu porte, precisa ter foco, segundo ensinam os consultores. A idéia é a de que o negócio de uma companhia deve ser aquilo que ela faz de melhor entre as necessidades do mercado. Quando o pedido envolve outras "especialidades", o "não" pode ser a melhor saída.
Ter critério na hora de aceitar um cliente, sobretudo no mundo dos serviços, é fundamental para manter a empresa na linha.
"No passado, aceitamos fazer alguns trabalhos sem nem saber como começar. Tivemos de nos virar, procurar soluções fora", conta o empresário César Cini, 39, diretor da Cinex, pequena empresa de Bento Gonçalves (RS) que, há cerca de seis anos, fabrica portas de alumínio e de vidro.
Uma sobrecarga de trabalho fez a empresa perceber a urgência de modificar sua atitude, mas, segundo Cini, a mudança só veio mesmo com o tempo, quando a firma se tornou mais estável.
"É difícil não se render ao cliente. A maturidade de não fazer isso é uma conquista. Não dá para brincar de trabalhar. Agora estamos preocupados com a rentabilidade."

Especificidade
Fonte inesgotável de dor de cabeça eram os pedidos específicos, que monopolizavam pessoal e exigiam gastos com desenvolvimento de produtos. O que ocorreu?
A fábrica decidiu apostar suas fichas em modelos com boa aceitação no mercado -e só neles. Além disso, passou a recusar pedidos que descaracterizam o design e a qualidade dos produtos e deixou de assumir compromissos cujos prazos não pode cumprir.
A estabilidade de que fala Cini é, ao mesmo tempo, causa e conseqüência da capacidade de dizer "não". De acordo com os consultores, empresários que já possuem essa maturidade selecionam melhor a clientela; nos outros casos, decidir fazer essa seleção é algo importante, que pode ajudá-los a alcançar o ponto de equilíbrio que a empresa precisa.

Quem me interessa?
A recomendação não é viver procurando motivos para não trabalhar, mas há casos em que o comprador se torna de fato desinteressante.
"Quando vejo que o cliente pode ser mais bem atendido por outra empresa, não aceito o serviço. Se foge da nossa especialidade, acabamos declinando", afirma Mauricio Luís Berndt, 40, gerente comercial da Eclipse, que lida com teleinformática.
Marcel Antunes, 27, sócio da agência de publicidade ABC&Z, diz que selecionar clientes e serviços foi um longo aprendizado. "Falar "sim" e desenvolver algo que não dá resultado é sempre pior, sempre gera reclamações", explica Antunes.
Para as grandes, dizer "não" é mais fácil. O Banco Real, por exemplo, já deixou de conceder crédito a empresas que desrespeitavam exigências socioambientais.
Já Pedro Melo, sócio da consultoria e auditoria KPMG, afirma que toda oportunidade de trabalho recebida pela empresa passa por dois "filtros": não pode haver conflito de interesses -nem com a equipe (os sócios não podem ser correntistas de um banco que auditam, por exemplo) nem com outros serviços já prestados- e é preciso que o atendimento não ameace a imagem da consultoria. "Nossos clientes são submetidos a uma revisão anual."
Se o ramo da empresa é considerado estratégico, atender o concorrente pode ser uma boa razão para a recusa. É o que ocorre com grandes agências de publicidade e assessorias de comunicação.


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