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New York Times

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Agressões sexuais maculam o Egito

Por MAYY EL SHEIKH e DAVID D. KIRKPATRICK

CAIRO - O número de mulheres vítimas de agressões sexuais e estupros em uma única praça pública do Cairo tornou-se grande demais para ser ignorado. Por isso, islamitas conservadores da nova elite política do Egito se enfureceram -com as mulheres.

O general da polícia, parlamentar e islâmico conservador Adel Abdel Maqsoud Afifi comentou: "Às vezes, uma moça contribui 100% para seu próprio estupro".

O aumento das agressões sexuais nos últimos dois anos e a disputa decorrente sobre a quem deve ser atribuída a culpa estão entre os problemas que acometem o Egito no momento em que o país procura se reinventar, depois de jogar uma ditadura por terra.

Num primeiro momento, a revolução egípcia prometeu reabrir o espaço público às mulheres. Homens e mulheres protestaram lado a lado e pacificamente na praça Tahrir durante os emocionantes 18 dias e noites que resultaram na deposição do ditador Hosni Mubarak.

Minutos após a saída de Mubarak, contudo, um grupo agrediu sexualmente a jornalista Lara Logan, correspondente de uma rede de televisão americana.

Enquanto os protestos continuam, os ataques vêm se tornando mais violentos e ousados. Hoje o lugar que é o centro simbólico da revolução, a praça Tahrir, virou uma zona proibida para mulheres, especialmente de noite.

No dia 25 de janeiro, quando o Egito celebrou o segundo aniversário da revolução e manifestantes protestaram contra o novo governo liderado por islâmicos, uma onda extraordinária de ataques sexuais -pelo menos 18 foram confirmados por grupos de defesa dos direitos humanos- chocou o país, chamando a atenção do presidente Mohamed Mursi e de diplomatas ocidentais.

A jornalista Hania Moheeb, 42, foi uma das primeiras vítimas a vir a público para denunciar o que sofreu naquele dia. Numa entrevista à televisão, contou que vários homens a cercaram, arrancaram suas roupas e a violentaram durante 45 minutos. Todos os homens gritavam que estavam tentando salvá-la.

Seis mulheres foram hospitalizadas naquele dia devido aos ataques sexuais. Uma delas foi esfaqueada na área genital. Outra teve que ser submetida a uma histerectomia. Depois disso, vítimas de outros ataques sexuais na praça Tahrir e em seus arredores nos últimos dois anos também fizeram denúncias.

Yasmine Al Baramawy contou que, durante uma manifestação pública em novembro passado, ela e uma amiga foram cercadas por dois grupos diferentes de agressores. Alguns diziam que as estavam protegendo dos outros, mas ao mesmo tempo participavam do ataque. Eles usaram facas para cortar a maior parte das roupas de Baramawy e então a prenderam, seminua, sobre o capô de um carro. Eles continuaram a torturá-la durante todo o trajeto até um bairro vizinho, onde moradores intercederam para salvá-la. "Disseram às pessoas que eu estava com uma bomba sobre o abdome, para impedir as pessoas de virem me resgatar", contou Baramawy.

Os ataques chamam a atenção para o fracasso do governo do presidente Mursi, da ala política da Irmandade Muçulmana, em restaurar a ordem social. As declarações de seus aliados islamitas culpando as mulheres pelos ataques intensificaram o constrangimento.

Pakynam al-Al Sharkawy, assessora política do presidente e a mulher de mais alto escalão no governo de Mursi, qualificou as declarações como "totalmente inaceitáveis".Ela atribui os ataques à deterioração generalizada da segurança, ao clima de violência crescente nas ruas e também à recusa dos manifestantes em deixar a polícia entrar na praça, desde a revolta contra Mubarak. "Os manifestantes insistem em impedir a entrada de seguranças na praça, mesmo para dirigir o tráfego", disse a assessora.

Até agora, a única medida tomada pelo governo Mursi para fazer frente ao problema foi redigir uma lei que criminaliza o assédio sexual.

Algumas mulheres estão encarando sua segurança como tarefa a seu próprio cargo. Numa passeata para chamar a atenção aos ataques sexuais, várias mulheres ergueram as mãos segurando facas. "Não se preocupem comigo", disse a advogada Abeer Haridi, 40. "Estou armada."

Alguns islâmicos ultraconservadores condenaram as mulheres por falarem publicamente.

"Vemos essas mulheres falando como ogros: sem vergonha, sem educação, sem medo e sem feminilidade", declarou o pregador Ahmed Abdullah.

Hania Moheeb, a jornalista, considerou a declaração "escandalosa" e disse que a resposta vista até agora por parte de parlamentares islâmicos equivale à cumplicidade nos ataques.

"Quando pessoas comuns falam coisas desse tipo, a ignorância pode ser uma desculpa", disse a jornalista. "Mas, quando um parlamentar dá declarações desse teor, está incentivando os agressores."


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