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New York Times

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Ativista antimagia é assassinado na Índia

Por ELLEN BARRY

PUNE, Índia - Durante quase três décadas, um homem simples chamado Narendra Dabholkar viajou de aldeia em aldeia na Índia, travando uma guerra pessoal contra o mundo dos espíritos.

Se um homem santo tivesse eletrizado o público com seus milagres, o doutor Dabholkar, 67, ex-médico, replicaria os milagres e explicaria, passo a passo, como foram realizados. Se um feiticeiro tivesse angariado uma fortuna tratando a infertilidade, ele daria um jeito de desmascarar a fraude.

O objetivo de Dabholkar era incutir o ceticismo científico no coração da Índia, país que ainda é cheio de gurus, "babas", astrólogos, homens divinos e outros empreendedores místicos.

Essa missão terminou em 20 de agosto, quando dois homens o mataram a tiros quando ele cruzava uma ponte. O assassinato do doutor Dabholkar é o último episódio em uma luta milenar entre tradicionalistas e reformadores na Índia. Quando os detetives começaram a montar uma lista dos inimigos de Dabholkar, descobriram que ela era longa. Ele tinha recebido ameaças de grupos de extrema direita hindus, sido espancado por seguidores de gurus irritados e contestado por conselheiros que defendem leis arcaicas sobre castas.

Seu Estado natal, Maharashtra, estava considerando uma legislação que ele defendia há 14 anos, proibindo uma lista de práticas como o sacrifício de animais, o tratamento mágico de picadas de cobra e a venda de pedras mágicas.

Depois da morte do doutor Dabholkar, o governador estadual assinou a chamada lei antimagia negra, que entrou em vigor. Mas Dabholkar nunca apostou em mudanças súbitas, diz seu filho, Hamid Dabholkar, enquanto admiradores velavam na casa da família. "Ele sabia que esse tipo de batalha é travado ao longo de eras", disse. "A viagem que escolhemos começou com Copérnico. Temos uma vida muito curta, de 70 a 80 anos, e o tipo de mudança que veremos durante esse período será pequeno."

Amigos e parentes descreveram as ameaças que o doutor Dabholkar recebeu ao longo dos anos de organizações linha-dura hindus. O fundador de um desses grupos, Sanatan Sanstha, salientando que não aprovava o assassinato, não se incomodou em fingir pena pela morte de Dabholkar.

"Em vez de morrer de velhice ou de cirurgia, que causa muito sofrimento, a morte de Dabholkar hoje foi uma bênção de Deus", escreveu o líder, ex-terapeuta por hipnose hoje conhecido como Sua Santidade o doutor Jayant Athavale.

Ateu, Dabholkar deixou de praticar a medicina aos 40 anos para dedicar sua vida ao ativismo. A sala onde ele trabalhava era nua, a não ser por uma citação de Mahatma Gan dhi emoldurada.

Recentemente, o doutor Dabholkar estava frustrado porque os políticos demoravam para adotar a lei antimagia negra. Shruti Tambe, da Universidade de Puna, disse que a lei encontrara obstáculos, incluindo a ascensão do pensamento conservador entre hindus da classe média. "É uma área escorregadia de que estamos falando -o que é fé e o que é fé cega", disse ela. "Existe uma linha muito fina dividindo isso."

Grupos hindus de extrema direita foram veementemente contrários. Shambhu S. Gaware, porta-voz de Sanatan Sanstha, disse que as primeiras versões da lei proibiam práticas que causam ferimentos corporais -o que, segundo ele, poderia incluir o jejum tradicional. "Isso é apenas um ataque ao darma hindu", disse Gaware, engenheiro mecânico.

"O doutor Dabholkar não era um crente em Deus, e nós somos muito crentes em Deus, por isso sempre há um choque entre nossos pensamentos", disse. "Mas não acreditamos em violência."

Enquanto isso, em Puna, o secular e o espiritual vivem em tensão. Rohit Shindey, 21, disse que quando criança acreditava "em todas as coisas de nossa religião que eram besteira, como babas e previsões". Então, explicou, o doutor Dabholkar fez uma palestra em sua escola.

"Ele nos disse: 'Não estou dizendo que não existe Deus. Acreditem em Deus. Mas não guardem qualquer superstição em seu coração'", disse Shindey.

Ali perto, Kumar Shankar oferecia quiromancia -leitura de mãos- no lugar onde trabalha desde 1987. Tinha ouvido falar na morte do doutor Dabholkar e sobre a legislação, mas descartou a ideia de que isso teria qualquer consequência para ele.

"Isto é quiromancia!", disse. "Numerologia, quiromancia, astrologia são ciências! A lei não pode proibi-las."


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