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Cidade russa ferve com festival de rock

Por MELENA RYZIK

VLADIVOSTOK, Rússia - "Ilia! Ilia!", gritavam milhares de pessoas na praça central da cidade. Vestindo um terno cinza retrô-futurista, Ilia Lagutenko, filho ilustre da cidade e vocalista de uma das mais populares bandas da Rússia, a Mumii Troll, tirou o cabelo da cara e cantou, em inglês e russo, sobre amor, marinheiros e outros temas do orgulho local.

Vladivostok, que já foi um inacessível enclave militar soviético, é um dos últimos lugares do mundo onde alguém poderia esperar encontrar um bando de roqueiros indie multiculturais.

Mas, no final de agosto, a cidade portuária no extremo oriente russo, a 8.000 quilômetros de Moscou, se transformou em uma espécie de South by Southwest, o festival musical de Austin, no Texas. Durante quatro dias, mais de 40 atrações, principalmente da Rússia e da Ásia, tocaram gratuitamente em boates, parques e na praça principal, de frente para o imponente memorial dedicado aos "Combatentes pelo Poder Soviético".

Era o V-Rox, considerado o primeiro festival de rock desse tipo na Rússia. A semelhança com o South by Southwest foi intencional, disse Lagutenko, idealizador do V-Rox. Sua presença aqui revela o alcance de uma cultura musical, surgida na internet, que forja verdadeiros rock stars e conecta fãs do hip-hop do Brooklyn a Xangai. Os fãs chegavam aqui vindos da Ucrânia e da Sibéria, e os participantes dos painéis de discussões eram do mundo todo. Vladivostok, fechada a visitantes até 25 anos atrás, tornou-se durante alguns dias um farol artístico internacional.

O crescente número de festivais desse tipo mostra como fãs que tiveram seus apetites musicais estimulados por audições na internet e pelas redes sociais estão dispostos a viajar para longe atrás de uma experiência memorável off-line. Outros exemplos incluem o Iceland Airwaves, em Reykjavík, os festivais Midi, espalhados pela China, e o Traenafestival, em ilhas nórdicas próximas ao Círculo Polar Ártico.

"Qualquer coisa que estiver acontecendo na indústria musical da Rússia é muito semelhante ao que ocorre na China e na Coreia", disse Lagutenko, 44, no camarim antes do seu show. "Neste momento, as ideias são as mesmas."

Havia objetivos práticos e econômicos na criação do V-Rox. Lagutenko esperava que a realização desse evento em Vladivostok, cidade em contração, com população inferior a 600 mil habitantes, na fronteira com a China e a uma viagem de balsa do Japão, ajudasse o lugar a se tornar um portal para a região da Ásia-Pacífico, um anseio também partilhado pelo governo de Vladimir Putin.

Embora o Kremlin esteja cada vez mais intolerante a dissidências políticas, sejam elas embaladas ou não pela cultura pop -e as ativistas do Pussy Riot são apenas um exemplo disso-, o V-Rox e seus músicos em geral apolíticos parecem ter até agora escapado de qualquer escrutínio.

O prefeito Igor Puchkarev declarou que o V-Rox foi um sucesso, com a presença de 30 mil pessoas nos seus eventos. Os organizadores disseram que 25 mil pessoas assistiram a transmissões ao vivo.

Quando Lagutenko era criança e adolescente, Vladivostok era considerada uma base naval estratégica. Ele estava isolado das influências externas, e a cena roqueira russa era praticamente inexistente. Ganhar a vida tocando em uma banda era "uma fantasia", segundo ele. Agora, Lagutenko tem casas em Los Angeles, Moscou e Vladivostok, e existe um plugado mundo do rock russo. Alex Gagarin, 34, roqueiro indie de Iekaterimburgo, na região central da Rússia, mantém há 15 anos uma banda chamada Sansara e celebrou a chance de deixar sua marca globalmente no V-Rox. "As pessoas acham que as únicas coisas vitais acontecem na Europa e na América, mas isso não é verdade há muito tempo", afirmou.

Em meio à mistura de atrações russas, o V-Rox também levou ao palco artistas que representam uma ampla gama de estilos: a banda punk coreana No Brain, o grupo japonês de música eletrônica Emufucka, e uma dupla cingapuriana de rapper e DJ, Mark Bonafide e Andrew Chow.

Embora os nomes fossem desconhecidos, o público local compareceu. "Sou a favor desse tipo de show", disse a funcionária postal Elena Kuzmina, 49, ao passar andando pela praça.

Para quem é do meio, o V-Rox garantiu a animação do que realmente ainda não foi descoberto. "É uma cidade da qual nunca ouvi falar, e são todas bandas que não conheço -o que é ótimo", disse Alan Miller, cofundador da revista musical "Filter", que veio participar de um painel de discussão no V-Rox.

Iuliia Kriukova, 28, vocalista do grupo moscovita InWhite, disse que esse foi um momento essencial para a Rússia do ponto de vista criativo. "Durante muito tempo, estivemos em um vácuo cultural", afirmou. Após passar dias com músicos do mundo todo, ela teve uma sensação de pertencimento. "Estamos todos no mesmo nível".


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