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Inteligência/Roger Cohen

A divisão corporativa

Tempos bons para empresas, mas não para empregados

Cambridge, Massachusetts

Um problema central para os países ocidentais é que muitas de suas grandes empresas estão florescendo, embora esses bons tempos corporativos não se reflitam nas sociedades, que têm alto desemprego e redução de salários. Os interesses das multinacionais e os dos países que as criaram divergiram.

Com efeito, as corporações têm flexibilidade para navegar em um mundo globalizado, mobilizando recursos através das fronteiras, enquanto os líderes de países individuais são contidos por suas fronteiras. Em um mundo conectado de 7 bilhões de pessoas as políticas nacionais cada vez mais parecem um exercício fracassado de tentar se adequar a e regulamentar as forças desencadeadas por sua criatividade.

Os números são surpreendentes. Corporações multinacionais com sede nos Estados Unidos contrataram 683 mil trabalhadores na China na década de 1999-2009, um aumento de 172%, e 392 mil trabalhadores na Índia, um aumento de 542%. Em todo o mundo, as multinacionais americanas contrataram 2,9 milhões de trabalhadores nessa década, incluindo 477.500 na América Latina, enquanto cortaram 864.600 empregos nos EUA, segundo números do Departamento do Comércio. Somente no Brasil as companhias empregaram 505.300 trabalhadores em 2009, um aumento de 47%.

Muitos fatores entram em ação aí. As empresas americanas procuram cortar seus custos trabalhistas, mas também querem estar mais perto de uma base de clientes em rápida expansão entre a classe média emergente nas economias em desenvolvimento, onde se fala mais em bonança que em esperanças perdidas.

Elas extraíram benefícios fiscais significativos de sua dispersão global. Enquanto cortavam empregos nos EUA na recessão de 2008, descobriram que a tecnologia lhes permitia passar sem muitos desses trabalhadores permanentemente.

Acrescente-se a isso o custo do empréstimo mais barato de todos os tempos e é compreensível que as corporações americanas usem esse dinheiro fácil para investimentos de capital e não para empregos. Os números do Departamento do Comércio indicam que as companhias americanas ainda alocam US$ 2,40 em gastos de capital nos EUA para cada dólar gasto no exterior.

Como relatou meu colega Floyd Norris, os lucros corporativos nos EUA foram estimados em US$ 1,56 trilhão, em um índice anualizado, durante o terceiro trimestre deste ano, ou 10,3% do tamanho da economia, contra 10,1% no segundo trimestre. Nunca antes de 2010 houve um trimestre em que a parcela corporativa fosse tão alta quanto 9%.

Ainda mais surpreendente, os lucros corporativos gerais antes dos impostos subiram 35%, comparados com o trimestre anterior à recessão de 2007-9, enquanto a renda salarial aumentou apenas 1,8%. A imagem é bastante clara: o desempenho empresarial acentuadamente melhor não gera mais qualquer acréscimo correspondente significativo aos empregos ou aos salários americanos.

A renda salarial hoje representa menos de 43% da economia americana; nas seis décadas anteriores à recessão, esse número nunca ficou abaixo de 45%.

A imagem não é muito diferente na França, onde as principais corporações multinacionais - pelo menos aquelas fora do setor financeiro - vêm registrando lucros recordes, enquanto o desemprego aumentou para mais de 9%. No Reino Unido, as notícias de enormes bônus para a diretoria das empresas provocaram uma revolta compreensível, mas muitas vezes refletem um forte desempenho da companhia.

Todos esses números se traduzem como um sério problema em longo prazo para as sociedades ocidentais. Os remédios fora da governança global - e isso levará alguns séculos- não são fáceis de encontrar. Claramente algo mais pode ser feito na área dos códigos fiscais corporativos para garantir que as companhias não obtenham vantagens fiscais maciças, além de tudo o mais, levando suas operações para o exterior.

Além disso, é importante recrutar os líderes corporativos para iniciativas nacionais que abordem questões de emprego e salário. Atacar os ricos e gritar insultos contra eles pode produzir uma satisfação momentânea, mas não vai resolver nada. A Alemanha se saiu melhor que qualquer outro país ocidental ao envolver as corporações e os sindicatos na formulação de políticas industriais que ajudam a manter os empregos no país. Seu exemplo poderia ser seguido mais amplamente.

Afinal, é do interesse das multinacionais ser sensível a essas questões. O movimento Ocupem demonstra como a irritação está crescendo em todo o Ocidente. Vale a pena notar que antes que os lucros corporativos nos EUA chegassem a mais de 10% da economia, recentemente, a porcentagem anual recorde anterior foi 8,98%, em 1929. Todos sabemos o que aconteceu logo depois.

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