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ARTE & ESTILO

Dança israelense no seu próprio ritmo

Trupe de Tel Aviv contesta premissas culturais

POR BRIAN SCHAEFER

TEL AVIV - A "hora" é uma dança em círculo em que os bailarinos se perdem no coletivo. Em "Hora", uma obra de 2009 do coreógrafo israelense Ohad Naharin apresentada pela companhia de dança Batsheva, os bailarinos afirmam sua individualidade em solos cheios de virtuosismo.

Naharin, 59, explora a dinâmica complexa do indivíduo no interior do grupo. O coreógrafo, porém, não reconhece a alusão ao tempo na sua criação "Hora". Além de significar "hora" -60 minutos- em espanhol e em português, o termo é um cumprimento comum em japonês e se assemelha com um insulto norueguês.

A negação travessa da alusão evidente do título reflete o modo como Naharin e a Batsheva -a maior companhia de dança contemporânea de Israel e um de seus maiores produtos de exportação cultural, tendo se apresentado em quase 20 países nos últimos dois anos- vêm fazendo arte a partir da contestação de premissas relativas à cultura israelense.

Embora quase metade de seus bailarinos seja formada por estrangeiros, a companhia se defronta continuamente com o paradoxo de querer abraçar suas raízes nacionais e ao mesmo tempo cultivar uma identidade independente, na qual a arte seja a única coisa que interessa.

A música de "Hora" subverte as expectativas, ao empregar versões incomuns de algumas das obras mais reconhecíveis do mundo: "Prelúdio à Tarde de um Fauno", de Debussy, "Assim Falou Zaratustra", de Strauss, e até mesmo "Cavalgada das Valquírias", de Wagner, compositor cujas posições antissemitas o tornaram um tabu em Israel. Cada obra carrega sua bagagem artística. Mas as interpretações não tradicionais, feitas pelo pioneiro compositor japonês Isao Tomita na década de 1970, ressaltam o interesse de Naharin em reinterpretar as coisas que pensamos já conhecer.

Com "Hora", o coreógrafo superou os clichês. "Eu crio regras. E eu as desobedeço", disse.

"Hora" foi visto em Nova York em março e será apresentado em Tel Aviv em maio. Recentemente, o grupo Alvin Ailey American Dance Theater trouxe outro exemplo do viés provocador de Naharin sobre referências culturais quando apresentou "Minus 16", com os dançarinos usando ternos e chapéus pretos, ao som de um remix ritmado de uma canção tradicional da Páscoa judaica. Naharin diz que os espectadores israelenses supõem que o espetáculo seja um comentário sobre os judeus ultra-ortodoxos; no Japão, as pessoas acharam que o elenco representava corretores de ações.

Naharin desenvolveu uma linguagem de movimentos intitulada Gaga (que antecede a cantora Lady Gaga, não tendo qualquer relação com ela), que se disseminou pelo mundo da dança. A Gaga incentiva os participantes a "se conectar com o prazer", disse ele.

O coreógrafo, que lidera a companhia Batsheva desde 1990, não tem medo de tratar da política israelense, apesar de um terço do orçamento do grupo ser pago por recursos públicos. "Acho o governo atual um bando de fanfarrões agressivos", disse ele.

No Festival Montpellier de Dança, na França, no ano passado, quando ativistas palestinos interromperam uma apresentação do Batsheva, Naharin disse que compreendia a frustração deles. "Senti que as pessoas nos estavam usando como símbolo."

Ele espera que as plateias consigam enxergar além da nacionalidade do Batsheva e da política israelense, focando a arte. Do mesmo modo, em "Hora" ele pede ao espectador que olhe além de sua relação com a música. "De outro modo você apenas se sentirá tranquilizado por algo que já conhece", explicou. "E se sentir tranquilizado é agradável, mas descobrir algo novo é bem melhor."

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