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Controle de preços esvazia despensas na Venezuela

Por WILLIAM NEUMAN

CARACAS, Venezuela - Alguns venezuelanos organizam seus calendários em torno das entregas feitas uma vez por semana nas lojas subsidiadas pelo governo, fazendo fila antes do amanhecer para comprar um único frango congelado

antes que o estoque acabe. Ou farinha ou um litro de óleo de cozinha.

A Venezuela é um dos maiores produtores mundiais de petróleo em um momento de altos preços da energia, mas a falta de produtos básicos como leite, carne e papel higiênico são uma parte crônica da vida aqui, muitas vezes transformando as compras de supermercado em uma missão.

A escassez de produtos afeta pobres e ricos. Há pouco tempo, um supermercado no bairro elegante de La Castellana tinha bastante frango e queijo, mas nem um rolo de papel higiênico. Perguntado sobre onde se poderia conseguir leite em um dia em que este também estava em falta, um gerente disse com ironia: "Na casa de Chávez".

No centro do debate está o governo do presidente Hugo Chávez, que impõe controles de preços destinados a tornar uma série de alimentos mais acessíveis aos pobres. Geralmente são os produtos mais difíceis de encontrar.

"A Venezuela é um país rico demais para ter isto", disse Nery Reyes, 55, um trabalhador em restaurante, diante de uma loja subsidiada pelo governo no bairro operário de Santa Rosalía. "Estou perdendo meu dia aqui, parado na

fila para comprar um frango e um pouco de arroz."

A Venezuela foi durante muito tempo um dos países mais prósperos da região, com indústrias sofisticadas, uma agricultura vibrante e empresas fortes, o que torna difícil para muitos moradores aceitarem uma escassez tão grande. Mas, em meio à prosperidade, a lacuna entre ricos e pobres era extrema, um problema que Chávez e seus ministros dizem querer combater.

Eles afirmam que há necessidade de controles para manter os preços em um país onde a inflação chegou a 27,6% no ano passado, uma das mais altas do mundo.

"Não estamos pedindo que eles percam dinheiro, apenas que o ganhem de maneira racional, que não roubem a população", disse Chávez recentemente.

Mas muitos economistas vêem aí um caso clássico de um governo que causa o problema, em vez de solucioná-lo. Segundo eles, os preços são definidos tão baixo que as empresas e os produtores não podem ter lucro e desistem do produto.

Além disso, alguns artigos em falta são de indústrias como as de laticínios e de café, em que o governo desapropriou empresas privadas e agora as controla.

Mas alguns consumidores dizem que a iniciativa é válida. "É uma ajuda enorme", disse a aposentada Ana Lozano, 62, que caminhava diante da mercearia de Santa Rosalía. "É por isso que há uma fila tão comprida."

O governo parece muito ciente da ameaça dupla de escassez e inflação enquanto se prepara para a eleição em outubro, na qual Chávez tentará um novo mandato de seis anos. Os controles de preços foram defendidos em publicidades

do governo e acompanhados por ameaças repetidas de Chávez de nacionalizar todas as empresas que não consigam manter seus produtos no mercado.

Francisco Rodríguez, um economista do Bank of America Merrill Lynch que estuda a economia venezuelana, disse que o governo poderia marcar alguns pontos políticos com a nova rodada de controle de preços. Mas com o tempo, ele argumentou, causará problemas para a economia. "Em médio a longo prazo isto será um desastre", disse Rodríguez.

Os controles de preços também significam que os produtos que não existem nas prateleiras das lojas geralmente aparecem no mercado negro por preços muito maiores,uma fonte de indignação para muitas pessoas.

Emilio Ortiz, 52, dono de uma loja, disse que só conseguiu comprar açúcar e leite em pó de seus distribuidores uma vez no ano passado. Ele consegue óleo de cozinha uma vez por mês, mas só metade do que pede. E disse que os lucros estão tão baixos nos produtos controlados que ele aumenta os outros preços para compensar.

Se há um produto que a Venezuela deveria produzir em abundância é o café, uma importante colheita aqui há séculos. Até 2009, a Venezuela foi um exportador de café, mas começou a importar grandes quantidades do produto três anos atrás para compensar um declínio na produção. Os agricultores e torradores de café dizem que o problema é simples: os controles de preços no varejo mantêm seus lucros perto de ou abaixo do custo de plantar e colher o café. Em consequência, muitos não investem em novas plantações ou fertilizantes, ou cortam a quantidade de terra usada para plantar café.

Esperando na fila para comprar frango e outros alimentos, Jenny Montero, 30, lembrou como não conseguiu encontrar óleo de cozinha e teve de consumir sopas e cozidos em vez de frituras.

"Foi bom para mim", disse ela secamente, empurrando sua filha de14 meses em um carrinho. "Perdi vários quilos."

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