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Estilo de vida verde

Em crise, ex-cidade futurista tenta sobreviver

POR MICHAEL TORTORELLO

CORDES JUNCTION, Arizona - É um complexo ultramoderno, erguendo-se sobre um cânion no deserto: uma cidade para sempre inacabada no alto de um morro.

Ocupar o meio do nada deveria ser sedutor para os estudantes, arquitetos e espíritos curiosos que na década de 1970 fundaram Arcosanti, um "laboratório urbano" 110 km ao norte de Phoenix, no deserto do Arizona.

Após seguirem uma estrada ondulada até um acampamento desolado, eles encontravam uma espécie de kibutz. Aqui, nas oficinas, eles podiam construir um arco de concreto com nove metros de altura, ou plantar oliveiras, ou forjar sinos de barro para vender e conseguir comprar material de construção. O salário médio era o salário mínimo.

Acima de tudo, eles se juntaram a um colóquio ainda em aberto com o visionário projetista da cidade, Paolo Soleri, que pregava uma sociedade sem carros, em harmonia com a natureza.

Nestes 40 anos, cerca de 7.000 pessoas viveram em Arcosanti. A maioria foi embora. E, no ano passado, o próprio Soleri, 92, se aposentou como presidente da Fundação Cosanti. Agora, Arcosanti está sob o comando de Jeff Stein, 60, ex-reitor da Faculdade de Arquitetura de Boston.

E a questão que ele enfrenta é: se Arcosanti afinal não conseguir se transformar em uma densa ecocidade para 5.000 habitantes -como sempre quis Soleri-, então o que ela deve virar?

As propostas imediatas de Stein são: uma arquibancada coberta para o anfiteatro ao ar livre, uma padaria comercial reformada, um depósito para o fantástico acervo de maquetes de Soleri, ou meia dúzia de novos apartamentos.

Stein diz possuir um orçamento inferior a US$ 1 milhão, cerca de 10% do necessário para transformar esse complexo meio deteriorado, com mais ou menos uma dúzia de estruturas de concreto, em algo mais parecido com uma cidade, de fato.

Sua primeira tarefa, talvez, seja lembrar ao mundo que Arcosanti ainda existe. Os visitantes (cerca de 25 mil por ano) frequentemente observam que essa cidade do futuro parece uma cidade do passado. Mas 56 pessoas continuam vivendo e trabalhando aqui.

Entre elas, está Maureen Connaughton, 37, que até o ano passado era gerente de projeto em uma fábrica especializada de Filadélfia. Numa oficina de construção em 2010 em Arcosanti, ela descobriu como gostava de realizar trabalhos manuais. Logo regressou para produzir sinos de vento de cerâmica.

"Eu realmente ouvi todas as coisas boas e ruins que as pessoas dizem sobre [Arcosanti] estar instalada no passado", disse ela. "E eu quero vê-la instalada no presente. Porque é o meu presente."

Jovens voluntários continuam chegando de lugares como a Austrália, a Coreia do Sul, o México, o Chile, a Itália e a Jordânia, e pagando para se matricularem em oficinas de construção. Alguns decidem ficar.

Os moradores pagam apenas US$ 160 mensais pelo alojamento e pela alimentação.

"Há comunidades intencionais no país inteiro", disse Stein. "Esta não é uma delas. É quase uma comunidade acidental. As pessoas são atraídas para cá por Paolo Soleri e o poder das suas ideias."

O estagiário coreano de arquitetura Youngsoo Kim, 32, disse que a construção "poderia ter sido muito mais bem feita". "Mas também foi significativo que tenha sido construída pelas pessoas que aprenderam o conceito", acrescentou.

A calefação, as janelas e o isolamento do complexo parecem ter sido concebidos "a posteriori". O projeto mal incorpora tecnologias populares como painéis solares, barris para a chuva e banheiros com compostagem.

"Eu deveria tê-los", disse Soleri durante uma recente visita ao projeto. Mas, para a maioria dos americanos, insistiu ele, perseguir essas tecnologias pode se tornar um jogo em si.

Soleri é capaz de discutir sua imperfeita criação com desarmadora franqueza. Arcosanti cumpriu seu potencial? "Não, não seja tolo", disse ele.

Suas teorias sobre poluição, resíduos e esgotamento da energia nunca foram tão convincentes quanto agora no mercado internacional das ideias.

Mas é difícil argumentar que seu esquelético assentamento represente a cidade do amanhã, disse Dennis Frenchman, 63, professor de urbanismo do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, na sigla em inglês).

Frenchman disse admirar a invenção de Soleri como "uma curiosidade histórica". "Não acho que seja levado a sério como modelo urbano."

Há uma torcida praticamente unânime para que Stein consiga revitalizar Arcosanti. Mas, mesmo no seu atual estado, Arcosanti deve ser mais conveniente do que as 460 mil unidades habitacionais ociosas do Arizona.

Aqui tudo está pago, disse Stein. "Não temos hipoteca."

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