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Autor iraniano dribla a censura com teimosia

Por LARRY ROHTER

Após ser preso em 1974 pela Savak, a polícia secreta do xá, o escritor iraniano Mahmoud Dowlatabadi perguntou aos seus interrogadores que crime ele havia cometido. "Nenhum", responderam. "Mas todo mundo que nós prendemos parece ter exemplares dos seus romances, então isso faz de você um provocador para os revolucionários."

Desde então, o Irã passou por uma revolução islâmica e por três décadas de regime teocrático e Dowlatabadi, 71, escreveu vários outros livros, inclusive "O Coronel", lançado há alguns meses nos EUA. Mas uma coisa continua igual: quem está no poder no Irã ainda vê o autor e sua obra como subversivos.

"Como escritor, eu embarquei em um caminho de criação de narrativas épicas do meu país, o que necessariamente envolve muita história que não foi escrita", disse Dowlatabadi. "Mas ao fazer isso fui obrigado a ter muita paciência, perseverança e pouquíssimas expectativas sobre a vida."

"O Coronel", um romance sobre a Revolução Islâmica de 1979 e o violento período imediatamente posterior, ilustra isso. Os cinco filhos do protagonista (um oficial no Exército do xá) seguem caminhos políticos diferentes entre si e todos pagam caro. A trama se desenrola em uma noite chuvosa, na qual o coronel tenta recuperar e sepultar o corpo da sua filha caçula, torturada até a morte por distribuir panfletos que criticavam o novo regime.

"Já é hora de que todos os que se interessam, mesmo que vagamente, pelo Irã leiam esse romance", disse o jornal "The Independent", de Londres, numa resenha publicada durante o lançamento no Reino Unido, em 2011.

O romance foi escrito na década de 1980, mais ou menos a época retratada no enredo, quando intelectuais proeminentes estavam sendo executados, e o próprio Dowlatabadi foi intimado a depor.

"Eu escondi [o livro] numa gaveta quando o terminei", disse o autor, que temia enfrentar dificuldades para realizar outros projetos que ele tinha em mente, como "Os Tempos Idos dos Anciões". "Eu não queria que ele aparecesse no radar [do regime islâmico]. Ou eles me levariam preso ou me impediriam de trabalhar. Eles dariam um jeito. Depois que eu escrevi isso, mas quando eles ainda não sabiam que eu havia escrito, eles me deram um alerta de que eu não deveria mais lecionar na universidade, eu deveria me sentar em casa e ficar quieto."

"O Coronel" está disponível em inglês e em alemão, mas ainda não existe em uma versão na língua persa. Dowlatabadi disse que submeteu o original há três anos aos censores do Ministério da Cultura e Orientação Islâmica, que precisam aprovar todos os livros antes da publicação no Irã, mas que não recebeu nenhuma resposta até que leitores iranianos ouvissem falar do livro e passassem a pedir acesso a ele.

"Finalmente, o vice-diretor de livros do ministério o leu", contou Dowlatabadi, "e sob pressão respondeu: 'Sim, é um bom livro, mas é um relato diferente da revolução -esse não é o nosso entendimento sobre como a revolução ocorreu'. Então eu disse: 'Mas é o meu entendimento do que ocorreu'. Enquanto isso, eles não disseram que sim e não disseram que não. Então, ainda está emperrado".

Para publicar "O Coronel" em persa, Dowlatabadi poderia teoricamente recorrer a uma das editoras de iranianos emigrados, ou mesmo autorizar uma edição limitada e clandestina, para passar de mão em mão no Irã. Mas ele disse que não quis fazer nada disso.

"Minha filosofia, minha forma de trabalho, não é pelo confronto", disse ele. "Quero continuar escrevendo e continuar sendo um romancista iraniano no Irã."

Sim, prosseguiu ele, "tenho escrito coisas que, se você as ler, podem criar perguntas na sua cabeça". Mas, acrescentou, "não fiz isso de forma confrontativa, contra o Estado. Na verdade, é bom para o regime -do passado, presente e futuro- ter a experiência de escritores que trabalham dentro do sistema."

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