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A desilusão que fez de uma casa um óvni

POR JOYCE WADLER

JUANA DIAZ, Porto Rico - Uma estrutura semelhante a um disco voador foi vista nas últimas semanas sobre um morro no lado sul da ilha de Porto Rico. Ao anoitecer, suas luzes coloridas ficam visíveis da rodovia, e o tráfego quase para. Transeuntes que se aventuram a deixar a estrada descobrem que a estrutura, solidamente presa ao chão, produz um som de cinco tons, como a saudação da nave mãe do filme "Contatos Imediatos do Terceiro Grau".

O poema tonal toca em baixo volume, mas as luzes coloridas e piscantes na cúpula garantem que a casa não passe despercebida, exatamente o que o proprietário deseja. A história da construção dessa casa, que já tem mais de 40 anos, tem mais a ver com o filme "O Grande Gatsby" do que com "Star Trek".

A casa foi concebida por Roberto Sánchez Rivera, 58, professor aposentado de artes industriais.

Do que são feitas as luminárias na base da casa? Sánchez não fala inglês, e a repórter não fala a língua dele. A resposta, portanto, é dada por sua namorada, María Martínez, 56. "Saladeiras da loja de um dólar", diz ela. "Não sei se custaram US$ 1,99 ou US$ 2,99."

Quando Sánchez estava trabalhando na iluminação, diz Martínez, ele descia até a curva da estrada para ver como o resultado estava ficando, e como as pessoas estavam reagindo. "Elas não sabiam que ele era o dono da casa", conta ela.

E o apito em cinco tons, que é, de fato, de "Contatos Imediatos"? "Ele baixou da internet", diz Martínez.

Você pode imaginar que um homem que constrói uma casa em forma de óvni acredita em visitantes alienígenas, mas não é o caso. "Ele é simplesmente um homem criativo", insiste Martínez.

Sánchez comprou o terreno por US$ 95 mil em 2002, e conseguiu construir uma casa de três quartos e dois banheiros com aproximadamente US$ 150 mil, usando quinquilharias de lojinhas e autopeças usadas.

E as caixas metálicas na cúpula da casa/disco voador, que sugerem um sofisticado sistema de comunicação, ou talvez uma arma capaz de reduzir nosso planeta a pedacinhos? Cinzeiros da lojinha (Sánchez usou uns 200).

Muitas das esculturais luminárias são feitas de peças de automóveis. A veneziana da sala de estar é composta por cintos de segurança usados. A fonte da sala de jantar usa potes, panelas e talheres velhos.

Sánchez também fez os móveis, a maioria embutida nas paredes, a alguns centímetros do chão. Ele explica que cresceu no "barrio", e que lá havia muitos insetos. Além disso, com os móveis suspensos é mais fácil de limpar a casa. Ele também fabrica os gabinetes e armários. E o assento de privada que serve de base para a luminária no quarto do casal? Projeto dele. No banheiro de hóspedes, o teto é feito de toalhas de banho esticadas e laqueadas.

Há ainda uma interessante pintura de Sánchez que mostra um homem mais velho, com o braço pousado sobre os ombros de um jovem. Ao fundo, há uma mulher de cabelos longos, dando as costas. O jovem tem uma lágrima rolando de forma proeminente pelo rosto.

"O quadro é a história desta casa", afirma Martínez, traduzindo Sánchez. "O homem mais velho é o professor dele, que o traiu contando mentiras. A mulher foi outra aluna." Sánchez era namorado dela -o relacionamento durou uns três meses. "Eles romperam. Ela disse à mãe dela que ele nunca seria nada na vida."

Isso inspirou Sánchez a construir a casa, explica Martínez. "Ele queria fazê-la num determinado ponto para que, se ela precisasse viajar, ela visse a casa dia após dia e lamentasse aquelas palavras."

Quando estava no colégio, Sánchez viu numa viagem escolar uma casa sendo construída na forma de um barco, o que o impressionou.

A mulher da pintura, cujo nome ele não revela, era sua colega de colégio, e ele lhe mandava bilhetinhos amorosos com desenhos de discos voadores, prometendo que um dia construiria uma casa com esse formato. Mais tarde, Sánchez e a moça começaram a namorar.

"Acabou porque ela lhe escreveu uma carta dizendo que não queria continuar o relacionamento, pois não o amava mais", disse Martínez, que há dois anos namora o criador da casa. "Foi a mãe quem lhe contou que sua filha havia dito que ele nunca seria nada na vida."

A última vez que ele a viu foi há uns quatro anos, diz Martínez. Ele já havia se casado, tido dois filhos e se divorciado. Ela telefonou para ele, e ele a convidou para ver a casa. A construção ainda estava no seu estágio inicial -no formato de octógono-, mas mesmo assim ela ficou impressionada. Embora a mulher agora estivesse interessada nele, Sánchez já não queria mais nada com ela.

Diz Martínez: "Ele queria mostrar que você nunca deve dizer a outro ser humano: 'Você nunca vai conseguir nada na sua vida'".

Colaboraram Diego Ribadeneira e Maria Newman

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