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Pela 1ª vez, negro vence "Idols" na África do Sul

Por LYDIA POLGREEN

JOHANNESBURGO - Quando Khaya Mthethwa soprou as últimas notas de "Super Bass", canção de Nicki Minaj que ele havia escutado pela primeira vez no mesmo dia, os jurados de "Idols SA", versão sul-africana do programa de calouros da TV, estavam deslumbrados.

"Cara, você pegou direitinho", disse Gareth Cliff, um dos jurados-celebridades, meneando a cabeça.

Além do nervosismo habitual dos participantes de um reality show de TV, o peso histórico da cultura pop também pesava sobre os ombros de Mthethwa: será que ele se tornaria o primeiro negro a vencer o "Idols" no seu país?

Pode parecer estranho que em um país onde 80% da população é negra, um concurso de calouros decidido pelo voto popular existisse há anos sem ter um só vencedor negro. Mas na África do Sul, que passou décadas submetida ao regime segregacionista do apartheid, que colocava os negros por baixo e os brancos por cima, nem mesmo um concurso de calouros escapa ao escrutínio de uma poderosa lente racial.

Assim, quando Khaya Mthethwa (pronuncia-se "caia mtêtua") foi coroado ganhador da oitava temporada do programa, no começo de outubro, surgiu uma discussão sobre até que ponto a nação avançou no sentido de enterrar suas divisões raciais.

"Idols", em todas as suas versões mundo afora, deveria representar a democratização do gosto musical. Os vencedores são escolhidos em votação popular realizada principalmente via mensagem de texto por celular.

Mas, na África do Sul, a competição foi durante muito tempo distorcida pelas profundas disparidades sociais que fazem do país uma das mais desiguais sociedades do mundo.

A versão local do programa foi lançada em 2002 no canal privado por satélite M-Net, disponível apenas para clientes da operadora DStv. Naquela época, os assinantes eram majoritariamente brancos, pois poucos negros podiam arcar com as mensalidades, segundo Yolisa Phahle, executiva da M-Net.

A questão racial assombrou o programa desde o início. Não faltam talentos negros na África do Sul, o que inclui astros internacionais como Miriam Makeba, Hugh Masakela e Ladysmith Black Mambazo.

Mesmo assim, durante sete temporadas, nenhum negro venceu o programa "Idols" no país.

O analista político Eusebius McKaiser, autor de um livro sobre as tensões raciais na África do Sul, disse que se "Idols" passasse numa rede nacional de TV aberta, com acesso gratuito, ele já teria tido um vencedor negro há muito tempo. "Estaríamos falando sobre quando 'Idols' teria seu primeiro vencedor branco", disse McKaiser pelo Twitter.

Mas a África do Sul está mudando. A audiência da M-Net atualmente reflete melhor a distribuição demográfica do país, segundo Phahle. Mais negros podem se dar ao luxo de ter TV paga.

"Cada vez mais negros estão se inscrevendo em 'Idols' e indo mais longe na competição. Finalmente, neste ano, tivemos um vencedor negro", disse ela.

Mthethwa diz se orgulhar por ser o primeiro vencedor negro, mas afirma que a raça não o define. "É triste para mim que tantos anos depois da nossa democracia ainda precisemos racializar as coisas", disse.

Para além de questões econômicas, fãs negros têm outras razões para não verem "Idols", segundo o escritor e fotógrafo Victor Dlamini. Com sua ênfase no pop ocidental, disse, o programa ignora a música mais popular do país.

Muitos potenciais espectadores negros têm pouco interesse pelos covers das baladas de Celine Dion ou por hinos do "soft rock". Para eles, os ritmos borbulhantes do kwaito, as batidas dançantes da house music e as canções cheias de alma do afropop são muito mais atraentes.

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