São Paulo, segunda-feira, 01 de agosto de 2011

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Chefs espanhóis tentam preencher vazio

Por JULIA MOSKIN
El Bulli, que foi o restaurante mais importante do mundo, servirá seu último jantar em 30 de julho. Na manhã seguinte, os chefs espanhóis acordarão em um universo diferente.
Em apenas uma geração, El Bulli ajudou a transformar a Espanha de pântano culinário em líder mundial, e a "cozinha de vanguarda" de Ferran Adrià (termo que ele e outros chefs preferem para substituir "gastronomia molecular") tornou-se obsessão global entre jovens cozinheiros.
Assim como Antoní Gaudí transformou a arquitetura do país e Pedro Almodóvar o cinema, Adrià redefiniu a culinária espanhola como uma arte performática. Embora muitos chefs tenham contribuído para a revolução gastronômica da Espanha, especialmente Juan Mari Arzak, Santi Santamaría e Andoni Luis Aduriz, foi a ousadia de Adrià que manteve o nível em ascensão.
"É impossível falar demais sobre sua influência", disse Carme Ruscalleda, chef da Catalunha que tem seis estrelas no guia Michelin, mais que qualquer outra mulher do mundo. "Ele foi um dos primeiros a dizer aos chefs da Espanha que podíamos pensar com nossa própria cabeça."
Turistas do mundo inteiro hoje vão à Espanha em busca dessa comida, atraídos pela mística do El Bulli, embora apenas algumas centenas consigam comer lá a cada ano. Muitos chefs temem que o fechamento do El Bulli, combinado com os problemas econômicos da Europa, criem uma queda geral no turismo culinário.
"Não acho a situação boa", disse Josep Roca, um dos irmãos proprietários de Can Roca, restaurante muito conhecido ao norte de Barcelona. "Tenho medo de que sem o El Bulli, uma certa energia desapareça do cenário local da gastronomia."
Mas o El Bulli não terminou completamente: Adrià e sua equipe pretendem reabri-lo, reinventado, dentro de dois anos. Enquanto isso, os chefs percebem que o monopólio de Adrià na imprensa internacional pode finalmente ter terminado.
"A cozinha do El Bulli e Ferran Adrià foi tão enorme que eclipsou tudo que está ao seu lado", disse Quique Dacosta, um chef vanguardista de Valência.
"Agora, outros chefs terão mais oportunidades, ocupando os espaços que eles deixaram", disse Rafael Ansón, presidente da Academia Real Espanhola de Gastronomia.
Quem será o novo queridinho dos gastro-turistas? Muitos chefs, incluindo Dacosta (conhecido por suas paisagens comestíveis), Josean Martínez Alija (famoso pelo trabalho inovador com legumes) e Ruscalleda, são candidatos.
Um grupo pretende continuar expandindo os limites da culinária com novas tecnologias e ingredientes globais. Outro grupo está escavando as raízes da culinária espanhola.
Jovens chefs como Dacosta em Valência estão explorando novos veículos para a culinária. Ele é o criador da Ostra Guggenheim Bilbao, ostra aquecida em fogo a lenha e envolta em uma película de prata-titânio comestível que imita as superfícies do museu projetado por Frank Gehry.
Paco Morales, chef do Hotel Ferrero, também em Valência, pega uma água de tomate gelificada e a salpica com ervas locais e raspas de legumes crus, evocando uma Feira em um Prato.
Nandu Jubany, Victor Arguinzoniz e Mari Carmen Veléz são líderes no movimento de "volta às raízes", usando ingredientes locais e técnicas tradicionais, mas refinadas a um nível extraordinário. Uma voz importante no movimento volta à terra foi silenciada em fevereiro com a morte de Santi Santamaría, o popular chef catalão do restaurante Can Fabes. Santamaría foi virtualmente o único chef espanhol a desafiar abertamente o trabalho de Adrià -chamando-o de insalubre e (muito pior na Espanha) desonroso.
Xavier Pellicer, que foi treinado por Santamaría, assumiu a cozinha de Can Fabes. Ele já está remexendo as panelas com criações como um crème brulée de caranguejo com cobertura de açúcar caramelado e pimenta preta.
Um chef (talvez o único) que transcende as rivalidades e os grupinhos entre os espanhóis é Carme Ruscalleda, uma autodidata e profissional autônoma de 58 anos. Embora seja pouco conhecida fora da Espanha, é respeitada no país como uma verdadeira artista e perfeccionista. Sua comida é delicada e minimalista, sazonal e reforçada pelos pequenos retratos em aquarela que ela faz de cada prato. Também é cheia de sabor.
Se a Espanha vai baixar das alturas vertiginosas que alcançou na era El Bulli, é uma incógnita, mas a linguagem da culinária, tanto no prato como na página, foi transformada por ela.
Quando perguntado se a economia espanhola continuará sustentando uma culinária cara e experimental, a resposta de Dacosta foi típica: "O que é caro? O que é experimental? O que é o futuro?"


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