São Paulo, segunda-feira, 04 de abril de 2011

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ENSAIO - DAVID COLMAN

A essência dos EUA embalada em uma lata

O imaginário hollywoodiano da América tinha capacidade de encher Bill Moggridge de ilusão quando ele era menino na Inglaterra depois da Segunda Guerra Mundial. "Sendo europeu e criado depois da guerra, tudo era meio difícil", disse Moggridge, hoje um influente desenhista industrial que é diretor do Museu Nacional de Design Cooper Hewitt, em Nova York. "Coisas comuns eram difíceis de encontrar. Não tínhamos televisão. Meus pais não podiam comprar um carro. Vendo os EUA, Hollywood, as casas e os carros, tudo parecia cheio de fantasia. Uma fantasia impossível. Não sei se eu realmente achava que era bom; eu achava fantástico."
Assim, na década de 1970, Moggridge mudou-se para a Califórnia -não para Hollywood, mas para o Vale do Silício, onde ele projetou, entre outras coisas, o que é considerado o primeiro computador laptop, tornando-se um fundador da firma de design IDEO. Nas horas vagas, ele gravitava para seus sonhos de adolescência da América dos anos 50, envolta no que para ele foi a substância mais mágica da década: o alumínio.
É surpreendente pensar que o alumínio já foi considerado tão raro que, possivelmente no gesto mais grandioso de 1884, a pirâmide que coroa o Monumento a Washington foi feita dele (na verdade, é o terceiro elemento mais comum). Cerca de 70 anos depois, o alumínio era utilizado para fabricar quase tudo, de pratos e edifícios a barcos e carros. E, para delícia de Moggridge, trailers ou casas-reboque. Com os americanos fascinados por seus novos carros reluzentes, e as fábricas de aviões precisando de maneiras de movimentar os negócios, o trailer de alumínio tornou-se um dos troféus mais emblemáticos da década. Era democrático, pragmático e móvel, assim como mal-orientado, extravagante e otimista: a América embutida em uma lata.
Na década de 1990, quando Moggridge e sua mulher, Karin, estavam construindo uma casa nas montanhas ao norte de Palo Alto, na Califórnia, ele decidiu que estava na hora de se dar esse prazer. Começou com um Vagabond barato, depois foi um Hughes Spartanette. Mas os dois precisavam de reforma, e Moggridge não tinha o dinheiro, a habilidade ou o interesse para tanto.
Em um fim de semana há dez anos, ele dirigiu pela costa da Califórnia até reunião de fãs de trailers antigos. Lá, ele encontrou um Southland Runabout, restaurado e completo, com armários de madeira feitos com capricho. Ele o comprou e o transformou em quarto de hóspedes.
Talvez seja surpreendente saber que um dos mais famosos designers de hoje é apaixonado por uma invenção tão kitsch.
"Quando você visita a casa de estilistas, vê muito kitsch", ele disse. "Em vez de viver o trabalho que fazem, eles gostam de ver as facetas exageradas de até onde as coisas podem ir. E o kitsch tem uma espécie de entusiasmo desavergonhado que lhe permite apreciar esses valores".


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