São Paulo, segunda-feira, 05 de julho de 2010

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Onde petroquímicos fomentam vida


Golfo do México abriga criaturas centenárias

Por WILLIAM J. BROAD

O leito marinho profundo já foi considerado um deserto biológico. A vida, segundo a lógica, era sinônimo de luz e fotossíntese. O sol movia as cadeias alimentares do planeta, e apenas alguns animais poderiam viver no abismo escuro e sobrenatural.
Então, em 1977, oceanógrafos que trabalhavam no Pacífico profundo tropeçaram em ecossistemas bizarros cheios de moluscos, mariscos e grandes vermes tubulares (pogonóforos) -uma cornucópia de vida baseada em micróbios que prosperavam nas águas quentes, ricas em minerais, que brotam de fendas vulcânicas.
Essa vida se alimenta de substâncias químicas que vazam para a água do mar e servem de base para cadeias que se deram muito bem sem a luz solar.
Em 1984, cientistas descobriram que o calor não era necessário. Ao explorar as profundezas do golfo do México, descobriram habitantes sem sol movidos por uma nova forma de alimento. Os micróbios que eram a base da cadeia alimentar não viviam de minerais quentes, mas de petroquímicos frios, que brotavam do leito marinho gelado.
Os cientistas identificaram aproximadamente cem locais no golfo onde essas comunidades de mexilhões e pogonóforos floresceram. E reuniram evidências de muitas outras -centenas, segundo algumas estimativas, milhares, conforme outras-, especialmente nas águas profundas e inexploradas da região.
"Em todo lugar que [os cientistas] procuraram os encontraram", disse Norman Guinasso Jr., diretor de pesquisa geoquímica e ambiental na Universidade A&M, (Texas), citando descobertas dessas cadeias ao largo de Angola, Indonésia e Trinidad e Tobago.
"Não seria surpresa para mim se houvesse 2.000 comunidades", disse Ian MacDonald, oceanógrafo da Universidade Estadual da Flórida que estuda os ecossistemas escuros.
A concentração mais rica do mundo dessas comunidades notáveis fica no golfo do México. As formas de vida incluem vermes tubulares com mais de 2 metros de comprimento. Algumas criaturas parecem tão antigas que seriam anteriores à chegada de Colombo ao Novo Mundo, segundo os cientistas.
Agora, essas comunidades frias são tema de um debate silencioso entre os estudiosos. O golfo é o local do gigantesco vazamento de óleo que começou em 20 de abril. A pergunta é o que o petróleo significa para esses hábitats profundos e escuros.
Pesquisadores manifestaram forte preocupação sobre a ameaça para esses ecossistemas.
O derramamento é concentrado, eles afirmam, em contraste com o lento vazamento crônico de petroquímicos na maior parte da plataforma marítima ao norte do golfo. Muitos fatores, como a densidade do petróleo, o tamanho da queda de oxigênio resultante e a potencial toxicidade dos solventes de petróleo, poderão se transformar em ameaças que superam quaisquer benefícios e podem danificar ou destruir os ecossistemas escuros.
Em 2009, cientistas descobriram uma comunidade a aproximadamente 8 km de distância de onde o poço da BP, a 1,6 km de profundidade, posteriormente explodiu. Por isso, parece que os pesquisadores terão respostas mais cedo do que se previa.
"Existe muita incerteza", disse Charles R. Fisher, professor de biologia na Universidade Estadual da Pensilvânia, que está liderando um estudo sobre o habitat escuro e observou a comunidade próxima. "Nossa melhor esperança é que o impacto seja neutro ou um problema menor."
É um momento ambíguo para cientistas como MacDonald, da Universidade Estadual da Flórida, que dedicou sua carreira a documentar a riqueza e a complexidade do ecossistema.
"Antes fazíamos carreira estudando os animais obscuros lá embaixo", disse. "E agora é olhar para isto [o vazamento] provavelmente para o resto da minha vida profissional. É uma incógnita."


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