São Paulo, segunda-feira, 05 de outubro de 2009

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Dinheiro & Negócios

Suspeitas de corrupção rondam aumento da ajuda chinesa

Por SHARON LaFRANIERE
e JOHN GROBLER


WINDHOEK, Namíbia - Não é todo dia que líderes globais põem os pés na Namíbia, país de estradas de terra, dunas imponentes e apenas 2 milhões de habitantes na África meridional. Assim, quando o presidente da China, Hu Jintao, chegou ali à frente de uma delegação de 130 pessoas, em fevereiro de 2007, claramente não era apenas uma visita social.
E, de fato, logo a China concederia à Namíbia um grande empréstimo a juros baixos, do qual o país usou US$ 55,3 milhões para comprar equipamentos chineses de inspeção de cargas. Era uma clara demonstração, segundo autoridades chinesas, de como fazer bem à Namíbia também poderia ser bom para a China.
E assim parecia ser, até que a Namíbia acusasse a estatal escolhida pela China para fornecer os equipamentos -até recentemente dirigida pelo filho do presidente Hu- de ter facilitado o acordo com milionárias comissões ilegais. E a China não cooperou quando investigadores namibianos pediram ajuda. Agora, os equipamentos comprados parecem demonstrar outra coisa: a aura de sigilo e negociatas que ronda os bilhões de dólares da ajuda internacional chinesa.
Líderes dos países em desenvolvimento têm aceitado as ofertas chinesas de crédito fácil, sem as exigências ocidentais de reformas político-econômicas. Os resultados podem ser vistos na forma de estradas, usinas elétricas e redes de comunicação na África -mais de 200 projetos desde 2001.
Cada vez mais, porém, especialistas argumentam que a ajuda chinesa exige que os beneficiários joguem conforme suas regras: o dinheiro deve ser usado para a compra de produtos e serviços de empresas -muitas delas estatais- escolhidas por autoridades chinesas.
"A China está usando esse financiamento para comprar a lealdade da elite política", disse Harry Roque, professor de direito da Universidade das Filipinas que contesta a legalidade de projetos financiados por Pequim em seu país. "É uma ferramenta muito eficaz de diplomacia suave. Mas é ruim para os cidadãos que têm de devolver esses empréstimos para contratos repletos de corrupção."
Algumas nações em desenvolvimento insistem em comparar os preços de forma independente antes de aceitarem a generosidade da China. Outros não se importam. "Com muita frequência eles estão recebendo algo que não conseguiriam sem o financiamento da China", disse Chris Alden, especialista em relações sino-africanas da London School of Economics and Political Science.
Oficialmente, a diretriz da China para as suas empresas é agir eticamente no exterior. Mas a China não tem uma lei específica contra o pagamento de suborno a autoridades estrangeiras. E o governo parece não estar empenhado em investigar ou punir práticas questionáveis.
Em janeiro, por exemplo, o Banco Mundial proibiu quatro estatais chinesas de disputarem uma concorrência, por causa de uma investigação que mostrou que elas haviam tentado manipular licitações para projetos bancários nas Filipinas. Mas duas dessas empresas permanecem na lista de companhias autorizadas pelo ministério chinês do Comércio a executarem a ajuda internacional, segundo o site do ministério.
A polêmica namibiana é especialmente delicada porque, até o fim de 2008, o presidente da empresa contratada era Hu Haifeng, filho de Hu Jintao. Hu Haifeng hoje é o secretário do Partido Comunista para uma holding que inclui a Nuctech e outras empresas.
Em documentos judiciais apresentados na capital namibiana, a Nuctech negou qualquer irregularidade. A empresa informou que não comentaria o assunto por ainda estar pendente. O Ministério do Comércio e outros órgãos públicos chineses não responderam a reiterados pedidos para se manifestarem. Assim que o escândalo veio à tona, em meados deste ano, a censura chinesa entrou em ação, bloqueando qualquer menção a ele na internet e na imprensa local.
"Esse é um sinal para todos recuarem", disse Russell Leigh Moses, analista de política chinesa em Pequim. "Todo o mundo entra no modo padrão, porque, quando a bola começa a rolar, ninguém sabe onde irá parar. Ninguém quer que sua tigela de arroz se quebre."


Colaboraram Stephen Castle, de Bruxelas, e Carlos H. Conde, de Manila. Colaborou também Jonathan Ansfield, de Pequim, com pesquisa



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