São Paulo, segunda-feira, 05 de outubro de 2009

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Coco Chanel, a mãe da reinvenção

Por RUTH LA FERLA

Se, além de seu trabalho, Gabrielle Bonheur Chanel possuía um talento extraordinário, era seu dom para a autoinvenção. A garota pobre do interior da França (nascida na Auvergne) se transformou, na visão do público, de filha de um vendedor ambulante em filha do privilégio, criada por refinadas tias solteiras; de uma cortesã extremamente ambiciosa na equivalente social do duque de Westminster; de uma costureira moderadamente talentosa em uma "couturier" célebre.
"Ela é o personagem Gatsby definitivo", disse Rhonda Garelick, professora de inglês na Universidade de Nebraska, em Lincoln (EUA), e autora de uma biografia de Chanel ainda inédita, "Antigone in Vogue".
"Ela é uma afetada bem-sucedida que veio do nada e abriu caminho para a sociedade e a fama", escreve Garelick. Chanel improvisava conforme vivia, "manipulando desejos que são muito mais que indumentários".
Hoje muitos desses desejos se refletem em uma série de filmes, livros e modas que exploram a estilista, chamada de a primeira mulher moderna -senão a primeira celebridade moderna. O interesse pela "couturier" nunca desapareceu realmente, mas 2009 tomou forma como o ano-bandeira de tudo o que é Chanel. Em uma recessão, a perpétua reinvenção de sua vida -para não falar nos modelos ainda influentes que na época elevaram materiais simples a alta moda- toca um acorde, fazendo de Chanel uma figura inspiradora para tempos magros.
Em "Coco Avant Chanel", uma cinebiografia que estreia no Brasil no dia 30, a diretora Anne Fontaine reconstrói os primeiros anos de Chanel. O filme acompanha a antiga cantora de musical enquanto usa em seu proveito a atenção de namorados bem-nascidos como Etienne Balsan e Boy Capel, levando-os a financiar sua carreira de estilista.
"Quando você a conhece melhor no início da vida, compreende sua fragilidade, sua tensão", disse Fontaine. "Ela nunca sabe o que vai acontecer depois e não tem proteção, por isso precisa lutar contra seu destino e criar uma nova maneira não apenas de se vestir, mas de ser."
Aspectos mais sombrios da história da estilista são explorados em "Coco Chanel", biografia de Justine Picardie a ser publicada nos próximos meses. Picardie discute o caso de Chanel com um oficial nazista durante a ocupação de Paris, uma de várias opções moralmente comprometedoras que ela fez para garantir que, mesmo na guerra, seus negócios continuassem prosperando.
Mesmo as pessoas que sabem pouco sobre a orgulhosa e ríspida estilista parecem compreender intuitivamente o poder do logotipo do duplo C, indicou Garelick. "Elas sabem que existe algum poder talismânico naqueles Cs." Hoje, como décadas atrás, "eles dão uma sensação de possibilidades ilimitadas".

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