São Paulo, segunda-feira, 06 de abril de 2009

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200 MILHÕES de pessoas conectadas

A explosiva expansão de uma empresa cria uma metamorfose digital para o poder das massas


Serviço de internet permitiu a um cidadão comum ficar amigo de primeiro-ministro

Por BRAD STONE

Quando o site de relacionamentos Facebook ganhou seu centésimo milionésimo membro, em agosto, seus empregados se espalharam por dois parques de Palo Alto, na Califórnia, para um enorme churrasco. Em breve, essa empresa criada há cinco anos num alojamento estudantil da Universidade Harvard espera registrar seu usuário de número 200 milhões.
Essa incrível taxa de crescimento —dobrando de tamanho em apenas oito meses— mostra que o Facebook está rapidamente se tornando o ecossistema social dominante na internet, além de uma ferramenta essencial para contatos pessoais e profissionais.
Apesar disso, os executivos do Facebook não pretendem comemorar o novo marco de forma significativa. Talvez seja uma má hora para celebrar. A empresa que deu aos usuários novas formas de se conectar e falar aos poderosos agora se vê como alvo do formidável poder de fogo das massas —no caso mais recente, por causa de mudanças polêmicas nas páginas dos usuários.
Ao se expandir, o Facebook também luta para acompanhar o ímpeto de novidades como o microblog Twitter, ao mesmo tempo em que tem de administrar as expectativas dos seus primeiros usuários, jovens íntimos da tecnologia, atrair pais e mães convencionais e justificar sua avaliação às vezes estratosférica: ao investir na empresa, em 2007, a Microsoft estimou seu valor em US$ 15 bilhões.
A equipe de Mark Zuckerberg, 24, cofundador e executivo-chefe da empresa, registra quase 1 milhão de novos membros por dia, e mais de 70% dos usuários vivem no exterior. A presença do Facebook em países como Itália, República Tcheca e Indonésia disparou no ano passado, quando a empresa passou a oferecer o site nos respectivos idiomas.
Tudo isso coloca o Facebook em pé de igualdade com outros serviços pioneiros —e enormemente populares—, como o e-mail grátis, o Google, a rede de telefonia Skype e sites de comércio eletrônico como o eBay. Mas o Facebook promete mudar nossa comunicação de modo ainda mais fundamental, em parte por mapear digitalmente e vincular pessoas separadas pelo espaço e o tempo, permitindo que compartilhem publicamente uma miríade de elementos das suas vidas, às vezes muito pessoais.
O Facebook também pode ajudar a reconstruir famílias. Karen Haber, que mora nos arredores de Tel Aviv, Israel, entra toda noite no Facebook depois de colocar seus dois filhos para dormir. Ela procura pelos vários sobrenomes da família, em busca de parentes do outrora vasto clã Bachenheimer, do norte da Alemanha, que se dispersou pelo globo devido ao Holocausto.
“Nunca fui ligada em genealogia e agora, de repente, tenho essa ferramenta que me ajuda a encontrar os descendentes das pessoas que meus avós conheciam, pessoas que compartilham da mesma verdade que eu”, diz Haber. “Estou usando o Facebook e tentando unir a família.”
O Facebook também virou veículo para o ativismo —como na mobilização de 12 milhões de pessoas, no ano passado, para passeatas no mundo todo contra as práticas das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia). Zuckerberg cita também o caso de Claus Drachmann, professor dinamarquês, que pelo Facebook ficou “amigo” do primeiro-ministro Anders Fogh Rasmussen. Drachmann posteriormente convidou Rasmussen a falar para sua classe de crianças com necessidades especiais, e o premiê foi. Para Zuckerberg, essa história ilustra o poder do Facebook para superar barreiras sociais arbitrárias. “O interessante é que foi possível para uma pessoa comum chegar a seu primeiro-ministro.”
Zuckerberg diz que a métrica mais importante do Facebook não é a quantidade de membros, e sim o percentual do mundo conectado que usa o site e a quantidade de informação que passa por seus servidores.
A missão do Facebook, diz ele, é ser usado por todas as pessoas no mundo para compartilhar informações continuamente. “Duzentos milhões num mundo de 6 bilhões é pouco”, diz ele. “É um marco legal, especialmente em tão pouco tempo. Mas ainda há muito mais por fazer.”
Nessa desabalada carreira, o Facebook ainda tem de fazer desvios para apaziguar alguns usuários. Mais de 2,5 milhões de dissidentes aderiram a um grupo no próprio site cujo nome em inglês significa “Milhões contra os novos layout e termos de serviço do Facebook”. Outros usam suas próprias atualizações para criticar as mudanças, que agora, ironicamente, são distribuídas com muito mais visibilidade para todos os seus amigos de Facebook.
Executivos do site dizem que as mudanças servem para tornar mais fácil, rápido e urgente o ato de compartilhar —não só informações sobre os usuários, mas o que as pessoas estão fazendo.
O conflito em torno da mudança de projeto gráfico diz muito sobre o desafio de agradar 200 milhões de usuários, muitos dos quais se orgulham de ter ajudado a construir o site, com trabalho gratuito e contribuições muito pessoais.
O Facebook “tem um problema estranho”, diz S. Shyam Sundar, codiretor do Laboratório de Pesquisas dos Efeitos da Mídia, na Universidade Estadual da Pensilvânia. “Trata-se de uma tecnologia que inerentemente gerou comunidade, e chegou a um ponto em que os membros dessa comunidade sentem-se não só no direito, mas também com poderes de desafiar a companhia.”
Essas tensões já explodiram antes, quando o Facebook anunciou o intrusivo sistema de publicidade Beacon, em 2007, e novamente no começo deste ano, quando introduziu novos termos de serviço que pareciam dar à empresa amplo controle comercial sobre o conteúdo colocado pelos usuários.
O Facebook respondeu aos protestos contra a segunda medida, prometendo aos usuários um direito de voto sobre como o site seria governado. Mas, se o Facebook está disposto a dar voz aos usuários, não necessariamente quer ouvi-los. “Isto não é uma democracia”, diz Chris Cox, 26, diretor de produtos do Facebook. “Estamos aqui para construir um meio de comunicação da internet e achamos que temos suficiente perspectiva para fazermos isso e sermos os zeladores desta visão.”
O Facebook recentemente introduziu ferramentas publicitárias que permitem às empresas focar em usuários com base no idioma usado e na sua localização. Por exemplo, um anunciante pode preparar mensagens sob medida para a comunidade latina de Los Angeles, ou para francófonos de Montreal.
Apesar do desânimo que permeia grande parte do mundo publicitário e dos formidáveis desafios que o site enfrenta, alguns anunciantes dizem antever o futuro na publicidade interativa do Facebook.
“Todos os nossos clientes querem ver se conseguem fazer isso funcionar”, disse Al Cadena, diretor de contas interativas da Threshold Interactive, de Los Angeles, que representa empresas como Nestlé, Honda e Sony.
“A publicidade costumava ser uma comunicação de mão única, mas agora as pessoas querem ter diálogo. E o Facebook está se tornando a forma padrão para isso, não só nos EUA, mas no mundo inteiro.”


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