São Paulo, segunda-feira, 07 de junho de 2010

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CIÊNCIA & TECNOLOGIA

A bactéria que pode trazer chuva

Organismo parece formar cristais de gelo, que viram gotas

Por JIM ROBBINS

BOZEMAN, Montana - No campus da Universidade Estadual de Montana, em Boseman (EUA), o patologista vegetal David Sands diz que o manto de neve que recobre as montanhas em torno da cidade contém uma surpresa.
A causa da maior parte desse manto, ele diz, é um organismo vivo, uma bactéria chamada pseudomonas syringae.
Nos últimos anos, Sands e outros pesquisadores acumularam provas de que esse bem conhecido grupo de bactérias, que os cientistas sabem há muito viver em safras agrícolas, pode ser parte de um ecossistema climático ainda não muito estudado.
O princípio é aceito de maneira generalizada, mas os cientistas ainda debatem a dimensão do fenômeno.
Cientistas identificaram a presença dessa bactéria em largo volume nas folhas de diversas plantas selvagens e caseiras, em todos os locais nos quais realizaram observações, entre os quais EUA, Marrocos, França, Yukon (Canadá) e nas camadas fundas do gelo da Antártida. As bactérias foram localizadas em nuvens, em correntezas e em valas de irrigação.
Em um estudo sobre diversos picos montanhosos de Montana, 70% dos cristais de gelo examinados haviam se formado em torno de um núcleo cristalino.
Algumas das bactérias promovem o congelamento como meio de atacar plantas; produzem proteínas que deflagrarão congelamento em temperaturas mais altas que as usuais, e a água resultante danificará as plantas, propiciando às bactérias acesso aos nutrientes.
A capacidade de promover um congelamento da água em temperatura superior à normal levou Sands e outros cientistas a acreditar que as bactérias sejam parte de um sistema não estudado.
Depois que a bactéria infecta plantas e se multiplica, diz ele, pode ser varrida para o céu em forma de aerossol, e lá parece promover a formação de cristais de gelo (que se derretem ao cair à Terra, causando chuva) em temperaturas mais elevadas do que a propiciada pela poeira ou partículas minerais que também funcionam como núcleos dos cristais de gelo.
"A chuva é o mecanismo que ajuda essas coisas a se mover", disse Cindy Morris, patologista vegetal do Instituto Nacional de Pesquisa Agrícola da França.
A capacidade da proteína contida na bactéria para fazer neve é conhecida. Em regiões onde se pratica esqui, ela é disparada ao céu em companhia de água para promover nevadas e pode ser aspergida sobre nuvens para criar chuva.
Pesquisadores acreditam que há outras bactérias e fungos que fazem a mesma coisa na natureza.
Roy Rasmussen, físico do Centro de Pesquisa Atmosférica dos EUA, diz que pesquisas recentes renovaram o estudo da bactéria como causa de chuva, por parte dos físicos atmosféricos. Mas restam algumas questões sérias.
"É uma teoria sólida", disse Rasmussen. "A questão é determinar se essas coisas chegam à atmosfera em concentração suficiente para ter efeito. Meu palpite é que elas podem ser importantes em lugares e épocas específicos, mas não de modo global."
Caso Sands esteja certo quanto à importância da bactéria, haveria implicações para a destruição de vegetação por meio do excesso de consumo de pastagens ou da exploração madeireira, o que poderia reduzir a presença da bactéria e contribuir para secas. Por outro lado, porque as bactérias florescem em certas plantas e são escassas em outras, plantar a vegetação certa pode ajudar a chuva.
A pesquisa continua. No Reino Unido, cientistas estão realizando voos no interior de nuvens para recolher amostras de água e analisar o DNA dos micróbios que contenham. Pesquisadores dos EUA sequenciaram o DNA de 126 variantes da bactéria a fim de criar um banco de dados que poderia permitir a cientistas identificar a origem geográfica dos organismos.
A pesquisa poderia ter implicações para a mudança climática, opinou Sands; as bactérias não crescem em temperaturas superiores a 28 graus. Se a temperatura ficar muito alta por tempo demais, disse, podem morrer. "Resta trabalho a ser feito", disse. "É um quadro grande e complicado."


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