São Paulo, segunda-feira, 08 de junho de 2009

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Pecados do retoque excessivo provocam debate nas revistas

Por ERIC WILSON

A maioria dos leitores das revistas de moda sabe que as fotos, ao menos até certo ponto, mentem.
Com muita frequência, fotos são alteradas —historicamente, com cuidadosos truques de iluminação e exposição, e mais recentemente com softwares que podem fazer celebridades e modelos parecem mais magras, mais altas, com pele mais impecável, olhos mais brilhantes e dentes mais brancos. Aparentemente perfeitas. Avanços na fotografia digital tornaram tão fácil manipular as fotos que as modelos das capas muitas vezes lembram criaturas estranhamente sintetizadas ou, como as descreve o fotógrafo Peter Lindbergh, “objetos de Marte”.
Olhando as bancas de revistas norte-americanas, ninguém seria capaz de argumentar que o corpo da cantora Jessica Simpson só tem um lado do quadril, já que o esquerdo sumiu na capa de setembro de 2008 da “Elle”. Ou de se perguntar como as formas do queixo, as covinhas e a cor dos olhos da atriz Reese Witherspoon puderam mudar tanto entre a sua angelical aparição em fevereiro de 2008 na “Marie Claire”, a sua elegante capa na “Vogue” em novembro e a dengosa pose para a “Elle” em abril último.
Mas, conforme os retoques se tornam mais flagrantes e bizarros, às vezes resultando em corpos que desafiam as fronteiras naturais da anatomia humana, cresce o debate sobre a manipulação da foto, cabendo a Lindbergh liderar o ataque contra a prática. “Minha sensação é de que já faz anos que isso assumiu uma parcela grande demais em como as mulheres estão sendo definidas visualmente hoje”, disse por e-mail Lindbergh, um dos mais famosos criadores de imagens do mundo.
Em abril, ele alimentou a polêmica ao criar uma série de capas para a “Elle” francesa que mostravam estrelas como Monica Bellucci, Eva Herzigova e Sophie Marceau sem maquiagem nem retoques. A questão mexeu com os leitores da França, onde as autoridades de saúde já fazem campanhas em prol de uma medida que obrigue as revistas a avisarem quando e como as imagens foram alteradas.
Os editores das publicações norte-americanas, que no ano passado resistiram a tal proposta dentro do seu grupo setorial, também notaram uma tendência contrária a imagens que pareçam ser manipuladas para impor um padrão idealizado de beleza. A revista “People”, na sua edição dos “100 Mais Bonitos” de maio, incluiu imagens de 11 celebridades “usando nada além de hidratante”.
“As revistas de moda sempre tratam de algum elemento de fantasia”, disse Cindi Leive, editora da “Glamour”. “Mas o que tenho ouvido das leitoras ultimamente é que na moda, como em qualquer outra parte da nossa vida atual, há uma fome por autenticidade. O artifício, em geral, parece muito ser uma coisa de cinco anos atrás.”
Mesmo assim o movimento das “celebridades cruas” parece chegar a passos lentos. Talvez porque, como vários editores disseram reservadamente, os agentes das celebridades quase sempre exigem retoques de rugas e celulites. Por isso, uma celebridade pode parecer diferente de uma revista para outra.
“Não há dúvida de que imagens têm sido alteradas tão significativamente que às vezes é transparente”, disse Dennis Freedman, diretor de criação da revista “W”, que apresenta propositalmente fotos de ambos os extremos: os retratos não retocados de Juergen Teller e o trabalho digitalmente estilizado de Mert Alas e Marcus Piggott.
As fotos mais convincentes são as que revelam um caráter real, disse Freedman. Não obstante, ele questiona se haverá uma mudança notável por causa da atenção dispensada pela mídia às capas de Lindbergh para a “Elle” francesa. As revistas de moda, até certo ponto, prosperam como escape da realidade, uma janela para algo que existe fora das agruras do tempo.
“Eu me pergunto quanto isso irá durar”, afirmou. “Isso traz um ponto interessante, mas que por si só se torna uma espécie de artifício de propaganda. Eu não apostaria o dinheiro da minha aposentadoria de que isso é algo que eles vão continuar.”


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