São Paulo, segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

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ANÁLISE

LANDON THOMAS JR.

À espera da virada

Eric Thayer
Fila na madrugada diante de agência de empregos em Madri; dificuldades econômicas na zona do euro podem ameaçar a união monetária

Londres
Nunca antes a união monetária da Europa pareceu tão frágil. Dia após dia, cresce o temor de que a Grécia ou algum outro país fraco caloteie sua dívida, forçando nações mais ricas do continente a saírem ao seu socorro, sob pena de que um ou vários membros mais vulneráveis deixem a zona do euro.
Muitos economistas acham tal possibilidade remota, o que não significa que a Europa tenha emergido em segurança da crise.
Um desafio de longo prazo será restaurar a credibilidade fiscal em pelo menos metade dos 16 países que usam o euro. O verdadeiro teste para a maior zona de moeda única do mundo, segundo analistas, será conseguir resistir às pressões econômicas, políticas e sociais quando o Banco Central Europeu (BCE) começar a elevar os juros em resposta à melhoria econômica na Alemanha, na França e em outros países do norte do continente.
A essa altura, os retardatários na periferia da união -Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha- enfrentarão escolhas ainda mais difíceis para lidar com a perspectiva de vários anos de economias estagnadas, desemprego elevado e deficit estonteante.
"Se a inflação se acelerar na França e na Alemanha, as economias menores serão deixadas para trás, em estagnação e deflação", disse o economista Jordi Galí, aclamado por seus estudos sobre ciclos empresariais, que dirige do Centro de Pesquisa em Economia Internacional, de Barcelona.
"Tal recuperação assimétrica é bastante provável, e, se o BCE elevar as taxas, a coisa pode ficar bem feia", disse Galí, para quem a capacidade de resistência da zona do euro tem sido subestimada. Ainda assim, afirma ele, não há como fugir dessa disparidade no crescimento, e ele lembra que a missão do BCE é garantir a estabilidade de preços na união, e não cuidar dos interesses individuais das nações.
França e Alemanha já emergiram da recessão. A confiança empresarial na Alemanha, maior economia da Europa, atingiu em dezembro seu maior nível em 17 meses. Já nos países da periferia há poucos sinais de alívio na ressaca causada por mais de cinco anos de prosperidade alimentada pelo crédito.
A Irlanda adotou a medida fiscal mais severa, reduzindo fortemente os salários do funcionalismo. Um novo governo grego, punido pelo tratamento rude por parte dos portadores de títulos, já não mais satisfeitos com promessas vagas de reformas, só agora anuncia cortes expressivos nos gastos. Mas não está claro se o sistema político da Grécia irá aceitá-los.
A Espanha parece deixar de lado as questões fiscais difíceis na esperança de que sua economia se recupere logo. Mas o Conselho Europeu prevê que o desemprego no país atingirá 20% em 2010.
Críticos da zona do euro argumentam que governos fracos nas economias periféricas, diante do desemprego elevado e da inquietação do eleitorado, não terão coragem de restringir salários, pensões e gastos públicos.
"Essa gente fala a sério sobre reformas, ou está apenas dizendo às pessoas o que elas querem ouvir?", questionou o macroeconomista Edward Hugh, radicado em Barcelona, que tem criticado a relutância espanhola em tomar decisões difíceis.
Essa Europa em dois níveis pode ter uma melhor chance de recuperação se isso levar a uma desvalorização do euro frente ao dólar, o que muitos especialistas acham que já deveria ter ocorrido. Em dezembro, o euro caiu mais de 5% em relação ao dólar.
Alguns economistas preveem que a moeda ainda irá se enfraquecer mais, conforme a disparidade de crescimento entre os Estados centrais e periféricos criar mais desarmonia.
"Se há temores agora de que uma dissolução da zona do euro levará a um enfraquecimento da moeda, então essa é uma boa notícia", disse Paul de Grauwe, economista radicado em Bruxelas, onde assessora o presidente da Comissão Europeia (braço executivo da União Europeia), José Manuel Barroso.
"Então deveríamos cumprimentar a Grécia por nos tirar dessa anomalia de ter um euro que está sobrevalorizado demais." Mas uma eventual recuperação não será rápida. Na Irlanda, onde os preços estão caindo 5%, a reordenação da economia, eliminando sua dependência em relação à construção e ao mercado imobiliário, levará anos.
E o já impopular governo irlandês, assim como outros na periferia da Europa, terá dificuldades em explicar a eleitores abatidos pela recessão por que eles devem aceitar a decisão do BCE de elevar juros.
Apesar disso, as medidas dolorosas e históricas adotadas pela Irlanda oferecem um raio de esperança, segundo Philip Lane, professor de macroeconomia internacional no Trinity College, de Dublin, e responsável por um popular blog sobre economia irlandesa.
Ele cita sinais de compressão salarial nos setores de serviços, imóveis e funcionalismo, que foram muito castigados, como prova de que há um reconhecimento de que a recuperação, por mais distante que pareça, deverá ocorrer dentro da zona do euro, e não fora.
"É preciso uma crise para aprender uma lição", disse Lane. "Poderia ser que convencendo os países a mudarem seu comportamento haveria uma cooperação melhorada na zona do euro? O que não mata muitas vezes deixa mais forte."


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