São Paulo, segunda-feira, 13 de julho de 2009

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TENDÊNCIAS MUNDIAIS

Medo e crime assolam favelas sul-africanas

Por BARRY BEARAK

DIEPSLOOT, África do Sul - O crime na África do Sul é comumente retratado como um ataque aos ricos, mas os pobres são, na verdade, os mais vulneráveis.
Diepsloot, bairro decrépito na periferia norte de Joannesburgo, tem uma população estimada em 150 mil, e a delegacia de polícia mais próxima fica a 16 km de distância. Passando algum tempo ali, observa-se o temor incessante tão comum entre os pobres urbanos.
Especialistas indicam a natureza particularmente brutal do crime nesse país: o número incomumente alto de estupros, sequestros e roubos a mão armada. O índice de assassinatos, embora em declínio, é oito vezes maior que o dos EUA.
Em Diepsloot, as pessoas geralmente suportam suas perdas em silêncio, seus infortúnios não são relatados, e seus agressores são desconhecidos. Se um suspeito é identificado, as vítimas geralmente informam grupos de vigilantes semilegais ou contratam seus próprios capangas para obter vingança.
Também há a justiça improvisada, quando um suspeito detido torna-se o bode expiatório de mil crimes. Até Jacob Zuma, novo presidente do país, foi a público dizer que os cidadãos não podem ser "culpados quando fazem justiça com as próprias mãos".
De uma maneira ou de outra, a maioria já faz isso. Entre os ricos, a segurança privada substitui a proteção policial. A planície que rodeia Joannesburgo está se enchendo de bairros fortificados, com barricadas e cercas elétricas, câmeras e patrulhas armadas.
Mas os pobres não têm dinheiro para essas defesas. O assalto é o crime mais comum em Diepsloot, lugar onde a maioria das portas é fina, e cada beco é um perigo. Martelos de 2 kg geralmente são usados nos assaltos. Ladrões se escondem com facilidade na escuridão, atacando os que iniciam a caminhada para o trabalho antes do amanhecer e voltam depois que anoitece.
Em uma noite recente, um bando dirigiu sua raiva contra dois homens suspeitos de roubar de uma jovem mulher uma bolsa contendo cerca de R$ 1.000, o faturamento do dia da mercearia onde ela trabalhava.
Espancados, eles esperavam o tormento de ser queimados vivos enrolados em um cobertor molhado de gasolina, quando um político local interveio. "Deixem a polícia cuidar disso", implorou o oficial, salvando os homens.
A pressa da vingança às vezes leva a erros irreparáveis. Alguns dias depois, o superintendente Sam Mokgonyana, comandante da delegacia mais próxima de Diepsloot, especulou que nenhum dos homens atacados pela multidão estava envolvido no assalto. Ele achou mais provável que a mulher que carregava o dinheiro tivesse conspirado com outros.
A África do Sul é uma jovem democracia, e as pessoas ainda precisam aprender a confiar no governo. No apartheid, os policiais eram agentes da repressão estatal. Hoje, segundo o criminologista Antony Altbeker, as atitudes em relação à aplicação da lei "se transformaram de ódio em desprezo".
Pelos padrões internacionais, a polícia sul-africana tem um efetivo adequado per capita, embora seja uma força subdimensionada em relação ao volume da violência. Seja qual for a medida, as pessoas no país muitas vezes tratam a polícia como idiotas ou bandidos.
Enquanto o superintendente Mokgonyana concordou que alguns de seus oficiais são corruptos, insistiu que uma parte maior da venalidade fica com os promotores e os tribunais.
O oficial disse que tentou manter pelo menos seis veículos em patrulha em Diepsloot, mas que as poucas ruas pavimentadas não entram pelos caminhos tortuosos das favelas onde vivem muitos pobres. As autoridades raramente se deslocam entre os barracos de metal e madeira recuperados do lixo.
Ao cair da noite, as pessoas temem sair. Em 17 de maio, pouco depois da meia-noite, ladrões atiraram na Taverna Ndlovu's, matando um homem e ferindo outros 12. Enquanto os tiros provavelmente despertaram centenas de pessoas, as que ouvem alguma coisa geralmente pensam que é melhor não fazer nada.
"Ninguém ajudou", disse o dono da taverna, George Ndlovu, sobre seus vizinhos. "Eu não os culpo. Eu mesmo não teria ajudado."


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