São Paulo, segunda-feira, 18 de maio de 2009

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Lente

O perigo das piadas na política

Além de uma Constituição forte, o humor pode ser uma das maneiras mais eficazes de conter líderes sedentos de poder. Mas não é de hoje que política e humor formam um misto explosivo, e os perigos são muitos para quem se aventura na arena do humor político. Quando os maiores fãs de um político são comediantes, isso raramente é bom sinal. Assim como os humoristas americanos fizeram a festa com as gafes verbais do ex-presidente George W. Bush, satiristas franceses rezam para que o reinado do presidente Nicolas Sarkozy seja longo.
“Sarkozy é uma dádiva para humoristas”, disse ao “New York Times” o satirista francês Stéphane Guillon. No Paraguai, o presidente Fernando Lugo, ex-bispo católico, vem sendo ridicularizado sem dó desde que admitiu a paternidade de pelo menos um filho enquanto ainda era membro do clero (sem negar a possibilidade de que haja alguns outros). Como relatou Alexei Barrionuevo no “New York Times”, o slogan de sua campanha, “Lugo tem coração”, inspirou uma canção no ritmo da cumbia cujo refrão diz “o playboy tem ‘corazón’, mas não sabe usar o ‘condón’” (camisinha).
Lugo e Sarkozy correm o risco de tornar-se algo que mete medo em qualquer político: alvo de piadas permanentes. “Existem pessoas que, uma vez que se tornam tema de piadas, nunca deixam de sê-lo”, disse Robert Lichter, presidente do Centro de Mídia e Assuntos Públicos na Universidade George Mason, na Virgínia.
Com o presidente dos EUA, Barack Obama, não há muito o que trabalhar em matéria de humor. “Ele é difícil de satirizar”, comentou o humorista Andrew Boyd ao “Times”. “Ele sabe moderar sua própria seriedade.”
Na política, porém, as imagens podem mudar, como avisou a comediante negra Wanda Sykes num jantar anual para políticos e jornalistas promovido no dia 9 e que teve a presença do birracial Obama. “O primeiro presidente negro”, disse ela. “Tenho orgulho de poder dizer isso. A não ser que o senhor pise no tomate, é claro. Se isso acontecer, vamos dizer ‘qual é a do sujeito metade branco?’.” Obama riu. Mas outros humoristas precisam pensar duas vezes sobre os objetos de sua sátira. Ao que tudo indica, falta senso de humor à junta militar de Mianmar, que no ano passado condenou o comediante U Maung Thura a 45 anos de prisão. E no Líbano, Charbel Khalil recebeu ameaças de morte e foi forçado ao exílio por algum tempo por ter zombado dos poderosos e pomposos com um programa de fantoches na TV intitulado “Democracia”.
“Nada é proibido como alvo de sátira, exceto o presidente da República”, disse Khalil, falando das leis de imprensa no Líbano. “E o Exército. E os juízes, e os líderes religiosos. E os presidentes e reis de ‘países irmãos e vizinhos’.”
Mesmo assim, isso deixa vários alvos a serem ridicularizados, incluindo o Hizbollah, que não é conhecido por curtir humor às suas custas. Depois de um esquete pontual, a organização bloqueou ruas com pneus em chamas.
Mas mesmo ameaças de morte podem render material para fazer humor. Omar Marzouk, cômico muçulmano na Dinamarca, criou a comédia de situações “A Célula Terrorista”, sobre um grupo de candidatos a terroristas que se atrapalham com seus planos. Ele contou ao “Times” que seu site na web permite que os visitantes escolham a maneira favorita de matá-lo. “A maioria optou pela decapitação”, revelou.

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