São Paulo, segunda-feira, 18 de outubro de 2010

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TENDÊNCIAS MUNDIAIS

Na Espanha, socialistas e sindicatos em impasse

Madri adota medidas de austeridade

Por RACHEL DONADIO e RAPHAEL MINDER
MADRI - Com 20% de desemprego e uma série de medidas de austeridade impopulares, a Espanha parecia madura para a agitação trabalhista. Mas uma greve geral em 29 de setembro mais pareceu uma demonstração de descontentamento do que um sinal de revolta em fermentação.
Analistas disseram que parecia uma iniciativa bem coreografada pelos sindicatos para mostrar que estão irritados com as medidas, sem danificar significativamente um aliado, o primeiro-ministro José Luis Rodríguez Zapatero, que está em seu momento mais frágil desde sua eleição em 2004.
A greve revelou um acordo peculiar: os dois principais sindicatos declararam vitória, mas não conseguiram indicar concessões específicas que esperavam conquistar do governo, liderado pelo Partido Socialista Operário Espanhol, e o ministro do Trabalho elogiou as técnicas de negociação dos sindicatos.
"Talvez tenha sido um ritual necessário", disse Enric Juliana, editor e colunista do jornal "La Vanguardia". "Agora os dois lados estão condenados a fingir que podem chegar a um acordo, que seria muito fraco."
A greve salientou os desafios impostos a Zapatero, a quem os espanhóis criticam cada vez mais por ter falhado em reagir à crise econômica de maneira rápida, decisiva ou convincente. Hoje, ele se debate para satisfazer os trabalhadores, que consideram as reformas trabalhistas excessivas e os investidores, que as consideram fracas.
Ao mesmo tempo, a greve refletiu a difícil posição dos sindicatos, que enfrentam uma economia que se afasta da indústria e uma força de trabalho que, segundo muitos, não é bem representada pelos sindicatos.
Depois de o governo afirmar durante meses que protegeria os direitos dos trabalhadores enquanto aumentaria os gastos estatais para estimular o crescimento, voltou atrás em maio. Em junho, adotou medidas de austeridade depois de ouvir temores do Banco Mundial e outros sobre a rigidez do mercado de trabalho espanhol, seu grande deficit e um índice de desemprego que é o dobro da média da União Europeia.
Entre outras medidas, as reformas cortaram as indenizações para trabalhadores demitidos e facilitaram para as empresas reduzir as horas de trabalho como solução temporária para a queda da demanda. Elas também diminuíram o poder de barganha coletivo dos sindicatos em relação a alguns contratos.
"Nunca na história da democracia espanhola o governo tomou medidas tão negativas", disse Cándido Méndez, presidente do Sindicato Geral dos Trabalhadores e um dos organizadores da greve. "Se o mercado espanhol fosse tão rígido, muitas pessoas não teriam perdido o emprego."
O governo disse que não teve opção além de mudar de curso. "A crise não é um parêntese; a crise é um antes e um depois", disse Celestino Corbacho, o ministro do Trabalho, que está deixando o governo para disputar as eleições parlamentares no mês que vem na Catalunha. "Nem o governo nem os sindicatos poderão governar com os mesmos instrumentos e da mesma maneira que antes da crise."
O Fundo Monetário Internacional prevê este mês que a economia espanhola crescerá 0,7% no ano que vem -em comparação com a estimativa do governo espanhol de 1,3%, na qual se baseia o orçamento de 2011.
Com previsões de crescimento tão baixas, Zapatero deve andar em uma linha delicada entre honrar o compromisso de seu partido com o bem-estar social e a necessidade de reduzir os gastos.
A coisa não vai bem. "Tenho a sensação de que o governo socialista está cometendo suicídio", disse Ignacio Fernández Toxo, líder das Comissões Operárias, outro grande sindicato espanhol. "Ele entrou em conflito com sua base social."
Mas os sindicatos parecem conscientes de que os tempos mudaram. Enquanto a economia espanhola evolui de uma base industrial para outra voltada para serviços, eles se reposicionam como críticos esclarecidos, mais que militantes a atiçar fileiras.
"O papel dos sindicatos no século 21 não é tanto o de defender os salários individuais, mas defender esse modelo de proteção social", disse Fernández Toxo. "Você pode negociar um salário melhor, mas de que adianta, se perder tudo pagando por aposentadorias, seguro médico e educação?"


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