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A base russa de lançamento
European Pressphoto Agency
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Por ANDREW E. KRAMER
Moscou
Mais ou menos na época em que a Apple estava começando a fazer sucesso na
Califórnia, Andrei Shtorkh via em primeira mão a abordagem soviética para a alta
tecnologia: ele era o vigia da cerca que protegia os cientistas da Sverdlovsk-
45, uma das cidades científicas secretas do país, perdida no meio dos montes
Urais.
Essas cidades eram ostensivamente vigiadas contra espiões. Seus muros também
mantinham os cientistas do lado de dentro, e todo o resto da União Soviética do
lado de fora. Embora muita gente no país estivesse passando fome, os centros
científicos eram ilhas de bem-estar, com prateleiras de supermercados cheias de
alimentos importados e produtos finos.
A segurança nessas ilhas científicas era tão rígida que até as crianças usavam
crachás. Para fazer visitas, parentes precisavam solicitar permissão com meses
de antecedência. "Era uma prisão, uma cidade fechada em todos os sentidos",
recorda Shtorkh, então um jovem soldado.
Hoje, ele é o divulgador de um improvável novo empreendimento. O governo russo,
na esperança de diversificar sua economia, muito voltada para o petróleo, está
construindo a primeira nova cidade científica desde o fim da URSS. De modo ainda
mais improvável, ela tem como modelo, segundo as autoridades, o Vale do Silício.
A Rússia certamente não é o primeiro país a tentar copiar a ideia do Vale do
Silício. Na Malásia, por exemplo, uma floresta foi derrubada para dar lugar a
uma cidade da informática chamada Cyberjaya, num autodeclarado esforço para imitar a parte sul da "Bay Area" (na
Grande San Francisco, Califórnia). A China tem um aglomerado de alta tecnologia
em Tianjin, nos arredores de Pequim, enquanto a França possui o mesmo em Sophia
Antipolis, perto de Nice -todas criadas com uma injeção de ajuda governamental,
e todas, afinal, bem-sucedidas na tarefa de atrair e fomentar a iniciativa
privada.
O local russo, ainda sem nome e localizado nos arredores de Moscou, é uma
tentativa de replicar a vibração e o espírito empreendedor do Vale do Silício, a
estufa tecnológica dos EUA.
A rica tradição científica da Rússia e o seu mau histórico na conversão de
ideias em produtos comercializáveis são incontestes, citados como causas do
colapso soviético e da paralisante dependência em relação à mineração e ao
petróleo. Não é surpreendente, portanto, que seus líderes olhem com inveja para
o Vale do Silício.
"A fundação da cidade da inovação poderia ser uma plataforma de lançamento para
o país como um todo", afirmou Viktor Vekselberg, oligarca empresarial russo e
codiretor do projeto. Ele chama a cidade de "um teste de modelos empresariais"
para a reconstrução das ciências russas na era capitalista.
Uma vez concluído, o local se destinará a incubar ideias científicas usando
generosas isenções tributárias e bônus governamentais, até que as novas empresas
se tornem lucrativas. Seus apoiadores no governo e na iniciativa privada
descrevem-no como um esforço para mesclar a tradição soviética aos modelos
ocidentais de estimular empreendimentos tecnológicos em torno de universidades.
Mas céticos veem uma tendência mais profunda da tradição soviética: a de tentar
acompanhar o Ocidente exercendo o poder do Estado. "Não devemos esperar que os
mesmos mecanismos que funcionam no Vale do Silício funcionem na Rússia", disse
Ievgueni Zaytsev, membro do conselho consultivo da AmBar, a associação de
empresas russas no verdadeiro Vale do Silício. "O governo estará envolvido,
porque é assim que funciona na Rússia."
A nova cidade foi concebida pela chamada Comissão para a Modernização, nas
profundezas da burocracia do Kremlin. O governo russo, no entanto, tem uma
relação conflituosa com empreendedores e cientistas. Ainda há uma forte tradição
de repressão governamental a empresas privadas, com um jeito caprichoso de
cumprir as leis tributárias.
O local do ansiado Vale do Silício russo foi escolhido por sua proximidade com
outro projeto ambicioso, a escola de administração Skolkovo, que funciona em um
edifício futurista financiado com milhões de dólares em doações de oligarcas
como Vekselberg.
Embora ideias semelhantes circulem há anos, esta foi aprovada -e abençoada com
US$ 200 milhões em verbas públicas- num prazo de um mês, a partir de uma visita
feita em janeiro ao Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) por
dirigentes do Kremlin, inclusive Vladislav Surkov, o poderoso vice-diretor da
administração presidencial. Surkov diz que a nova cidade irá isolar as novas
empresas da burocracia que ainda hoje sufoca a economia russa.
A nova cidade se destina a promover as cinco prioridades científicas definidas
pelo presidente Dmitri Medvedev -comunicações, biomedicina, espaço, energia
nuclear e conservação da energia- e a estimular a fertilização mútua entre as
disciplinas.
A Rússia, segundo as autoridades, voltará a ser conhecida por seu talento
científico, e não mais por suas minas e poços de petróleo.
Empreendedores da alta tecnologia que permaneceram na Rússia são mais céticos.
Ievgueni Kaspersky, fundador da Kaspersky Lab, empresa que produz antivírus, diz
torcer pelo sucesso da nova cidade, mas acha que o governo deve restringir o seu
papel a oferecer infraestrutura e incentivos fiscais. "A Rússia tem muitos
engenheiros de softwares talentosos, mas não muitos negócios bem-sucedidos",
disse. "As pessoas ainda têm uma cortina de ferro na sua cabeça."
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