São Paulo, segunda-feira, 19 de setembro de 2011

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ARTE & ESTILO

Um balé aos cuidados de um ex-Beatle

A única coisa que sir Paul não fez foi a coreografia

Por JON PARELES
O compositor compareceu a um ensaio do New York City Ballet no final do mês passado para ver pela primeira vez o que o coreógrafo Peter Martins havia feito com sua composição "Ocean's Kingdom".
No final do ensaio o cantor se levantou, exclamando "Uau!". O compositor é o ex-Beatle Paul McCartney, e este é seu primeiro balé. Ele participou de tudo: da criação da história, dos cenários, dos figurinos, até mesmo elementos da própria dança.
"O bacana para mim foi que eu nunca antes tinha trabalhado assim", disse McCartney mais tarde. "Uma das razões pelas quais faço isto é para ter novas experiências em minha vida."
O City Ballet já encomendou músicas inéditas outras vezes -como as obras de Wynton Marsalis, Esa-Pekka Salonen, Charles Wuorinen e John Adams-, mas o papel do compositor no espetáculo geralmente é mais limitado.
Sara Mearns, que faz o papel principal da princesa Honorata no balé, disse que McCartney "é realmente uma parte enorme do processo neste balé e realmente se preocupa muito com isso. Ter esse tipo de energia em torno de um balé é algo inusitado."
"Ocean's Kingdom" é a atração principal da temporada do City Ballet. Sua estreia, em 22 de setembro, será o evento anual de gala da companhia. É provável que o nome e a música de McCartney atraiam um público que não é frequentador regular do balé.
A produção foi orçada em US$800 mil, disse Katherine E. Brown, diretora executiva do City Ballet, "mas esse valor não é desproporcional com suas dimensões e âmbito". McCartney "doou seus serviços", disse Brown, e sua filha Stella McCartney, que criou os figurinos, "disponibilizou seus recursos por valores reduzidos".
Para o City Ballet, disse a diretora executiva, trata-se de "um investimento na construção de nosso repertório e nosso público". O evento anual de gala, que até este ano tinha levantado pouco mais de US$2 milhões, já arrecadou mais de US$3,7 milhões este ano. As vendas de ingressos para a produção estão grandes, disse Brown, e o novo balé atraiu novos doadores.
"Ocean's Kingdom" é, sob muitos aspectos, um balé à moda antiga: um trabalho orquestral melodioso, em quatro movimentos, que narra uma história de amor. A obra conta as aventuras da filha do rei Ocean, Honorata, e as figuras da realeza terrestre que a desejam: o rei Terra e seu irmão, príncipe Stone (Pedra). A música de McCartney remete à de Tchaikovski, Elgar e Vaughan Williams, com um quê de Gershwin.
McCartney poderia ter composto a música e deixado o resto a cargo de Martins e sua companhia -mas não fez isso. "Estou acostumado a me envolver em muitos elementos das coisas que faço", explicou.
Ele escreveu a trama inteira e fez pinturas para sugerir o pano de fundo de cada ato. Sugeriu que os figurinos incluíssem tatuagens para os vilões.
Martins se recorda de ter dito a McCartney: "A única coisa que você não fez foi a coreografia". Na verdade, porém, ele revelou, um dia, enquanto ele e McCartney estavam ouvindo a música do balé, "você se pôs em pé e fez assim" -Martins assume uma postura dramática-, "e eu pensei 'essa é uma imagem maravilhosa'. Então a incluí no balé."
A colaboração começou quando McCartney conheceu Martins, em março de 2010, em um evento de caridade para a Escola Americana de Balé. Pouco depois, Martins perguntou se McCartney -que desde 1991 já lançou quatro álbuns- estaria interessado em compor músicas para o balé (a trilha de "Ocean's Kingdom" deve sair em CD em 4 de outubro).
McCartney já tinha composto alguns minutos de música oceânica melodiosa para o cineasta francês Jacques Perrin, mas ela não tinha sido utilizada. Agora ele tinha o que fazer com ela, mas não sabia por onde começar.
"Pensei: 'O que eu sei sobre o balé? Apenas o que sabe o ouvinte mediano -"Lago dos Cisnes", "Quebra-Nozes".' Pensei 'não faz sentido eu fazer isso ou tentar fazer, porque já foi feito por Tchaikovski e muito melhor do que eu poderia fazer'", ele contou. "Então pensei: 'O que eu gostaria de ouvir?'."
McCartney, que não sabe ler ou escrever música, utiliza um programa de computador que simula instrumentos orquestrais. "O programa vicia", contou.
Depois de compor a música, ele analisou a obra detalhadamente com um engenheiro de som, identificando pontos que poderiam sugerir personagens e uma trama. "Ou vai ser um monte de lixo, ou pode ser o início de uma história", avaliou McCartney.
"Ocean's Kingdom" é um conto de fadas acessível, com um toque muito leve de ambientalismo.
"Há essa coisa ecológica da pureza dos oceanos, da destruição e poluição pelas pessoas, e de quem vai sair vencendo", contou.
McCartney disse que ao longo da colaboração com Martins, "ele podia perceber que eu estava tendo muitas ideias". Ele sorriu. "Eu estava mais ou menos torcendo para ele não dizer 'não, já chega, muito obrigado'."


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