São Paulo, segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

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Ex-estilista mostra conteúdo em estreia cinematográfica

Por LAURA M. HOLSON

É incrível que Tom Ford, o ex-diretor de criação das grifes Gucci e Yves Saint Laurent que transformou a sexualidade vulgar em alta moda na década de 1990, não tenha se aventurado antes em dirigir um filme.
Numa quarta-feira recente, Ford atravessou um pátio no Beverly Hills Hotel para almoçar com uma convidada. Ao se aproximar da mesa, tirou os óculos de sol. Ele estava tão perfumado quanto uma fava de baunilha. Deslizando para a cadeira, Ford inclinou o queixo para o ombro esquerdo —um gesto consciente para destacar seu melhor lado, como ele admitiria depois.
O impacto visual dessa cena evoca a estreia dele como cineasta, “A Single Man”, em que o protagonista George Falconer arruma meticulosamente seu terno e sua gravata para usar num funeral.
A criação mais fascinante de Ford —mais do que as calças justas de veludo que ele lançou em 1994, ou o anúncio do perfume Opium em 2001, mostrando Sophie Dahl nua e retorcida— é a sua persona pública. Tanto é, contou Ford, que amigos recentemente lhe disseram estar surpresos por descobrirem que alguém aparentemente tão calculista poderia fazer um filme com tanta alma. Ford não é alguém de demonstrar mágoas. “Penso em mim como um produto”, disse ele. Mas claramente essas alfinetadas doem.
“Eu tinha um amigo que conheci por 15 anos e que disse: ‘Sempre pensei em você como uma bonita caixa preta laqueada com uma alça de platina da década de 1920, mas nunca soube que havia algo dentro da caixa’”, contou Ford. “Eu disse [algo do] tipo: ‘Você é meu amigo e não sabia que havia algo além da superfície?’.”
“A Single Man”, que foi lançado no dia 11 em algumas salas dos EUA e estreia em outros países em fevereiro e março, recebeu aplausos dos críticos, especialmente pela forma como Colin Firth interpreta George, um professor homossexual da década de 1960 que cogita o suicídio depois que seu companheiro morre em um acidente.
Tais elogios são de certa forma um triunfo para Ford, obrigado a financiar com seu próprio dinheiro esse projeto de quase US$ 7 milhões, depois que deixou a Gucci, em 2004, e anunciou que iria virar cineasta. Foi uma transição que alguns no mundo da moda achavam que fazia total sentido, dada a sua meticulosa atenção à superfície —mas que outros achavam fadada ao fracasso, pela mesma razão. Até que a Weinstein Company pegasse “A Single Man” no Festival de Toronto, em setembro, ele não tinha distribuidora.
Para que Ford tenha um autêntico sucesso, o filme deve seduzir a plateia mais ampla possível. Se “A Single Man” conseguir também algumas indicações para o Oscar, a atenção pode impulsionar Ford de volta ao seu familiar papel de árbitro cultural.
Na década de 1990, Ford foi talvez o estilista mais influente da sua geração, reimaginando o chique da década de 1970 com um sex appeal nada sutil. Sob sua orientação, as casas Gucci e depois Yves Saint Laurent floresceram, com Ford supervisionando cada aspecto criativo —moda, publicidade e até o design das lojas. Mas, depois de uma discussão com os seus patrões, ele deixou a Gucci e entrou para o time dos ex-poderosos desempregados.
Depois de anunciar que sua próxima empreitada seria no cinema, ele começou a passar mais tempo em Los Angeles, onde mantém uma casa com seu parceiro de longa data, Richard Buckley.
A história séria de “A Single Man” —suicídio, morte, romance trágico— foi um rompimento com o Tom Ford da Gucci, que gostava de provocar. (Em um dos seus anúncios mais polêmicos para a Gucci, uma mulher puxa as calças para revelar um tufo de pelos com o formato da letra G.) “Quando ele me mostrou o roteiro pela primeira vez, fiquei chocada”, disse Arianne Phillips, figurinista do filme. “Se esse era o filme que Tom Ford, ‘o diretor’, queria fazer, eu não conhecia Tom Ford, ‘a pessoa’.”
Ford passou tanto tempo da sua vida moldando sua persona pública que é o caso de se perguntar se este filme é mais uma tentativa de repaginar Tom Ford, o produto. Ele insistiu: “Essa foi a coisa menos calculada que já fiz”.


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