São Paulo, segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

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Saúde & Boa forma

As coisas minúsculas e invisíveis nos produtos do dia-a-dia

Por NATASHA SINGER

Soa como uma trama de ficção científica. Empresas de cosméticos formulam novos cremes e loções com componentes minúsculos, que melhoram a ação dos produtos. Mas os componentes minúsculos têm uma desvantagem inesperada: podem penetrar a pele, percorrer o corpo e concentrar-se de modo prejudicial em órgãos como o fígado.
A nanofobia é o medo de que os componentes minúsculos, criados na nanoescala -ou seja, medindo cem nanômetros ou menos- possam percorrer nosso corpo de modo descontrolado. Um fio de cabelo humano, por exemplo, tem entre 50 mil e 100 mil nanômetros de diâmetro. Uma nanopartícula de dióxido de titânio presente num bloqueador solar pode medir apenas 15 nanômetros (um nanômetro equivale a um bilionésimo de metro).
"Quanto menor a partícula, mas longe pode se deslocar nos tecidos, nas vias aéreas ou nos vasos sanguíneos", disse Adnan Nasir, professor assistente clínico de dermatologia na Universidade da Carolina do Norte. "Algumas nanopartículas são indestrutíveis. Elas não são metabolizadas e se acumulam nos órgãos, gerando risco de falência destes."
De fato, médicos, cientistas e defensores dos consumidores temem que muitas indústrias estejam adotando a nanotecnologia antes de estudos que verifiquem se a ingestão, inalação ou penetração dermatológica dessas partículas constitui ameaça à saúde ou ao meio ambiente.
As pessoas já vivem expostas a nanopartículas. Fogões e forninhos elétricos emitem partículas ultrafinas de entre 2 e 20 nanômetros, segundo o Instituto Nacional de Padrões e Tecnologia dos EUA; os pesquisadores relataram em novembro que o contato de longo prazo com esses eletrodomésticos pode constituir a maior exposição às menores das nanopartículas.
Vários produtos já empregam materiais criados com nanoengenharia. Existem "nanocalças", calças de brim resistente a manchas, e jeans cujo tecido contém pêlos de nanodimensões que repelem o óleo e a sujeira.
Em loções e cremes, o uso de nanocomponentes pode garantir uniformidade e facilidade de aplicação sobre o corpo.
Alguns ingredientes podem apresentar comportamento diferente do normal quando estão em nanopartículas. A prata nanodimensional, por exemplo, pode agir como agente antibacteriano na pele. Partículas maiores de óxido de zinco e dióxido de titânio resultam em bloqueadores solares brancos e pastosos.
Mas quando se trata de produtos de beleza, alguns defensores dos consumidores receiam que as nanopartículas dinâmicas gerem riscos à pele ou a outras partes do organismo. Os bloqueadores solares minerais são os que vêm atraindo mais atenção. "Substâncias totalmente benignas podem ser tóxicas em nanoescala", disse Michael Hansen, cientista sênior da União dos Consumidores. "Pelo fato de serem tão pequenas, as partículas podem chegar a partes do corpo às quais não chegavam antes."
Mas representantes da indústria cosmética dizem que não há evidências de que produtos de higiene e beleza com nanocomponentes constituam perigo à saúde. Uma revisão dos riscos potenciais dos nanomateriais, realizada em 2006 para o Centro Europeu de Toxicologia, concluiu que é improvável que bloqueadores solares contendo nanopartículas metálicas penetrem a pele saudável, mas levantou a questão de se devem ser realizados estudos de segurança para averiguar se esses materiais podem penetrar a pele machucada.
"É muito difícil fazer qualquer coisa passar pela pele", disse John Bailey, vice-presidente executivo do Conselho de Produtos de Cuidados Pessoais, grupo que representa a indústria, em Washington. "A pele é uma barreira muito eficaz." Alguns pesquisadores de nanotecnologia concordam, alegando que é ilógico supor riscos aos nanocomponentes.
No mês passado, o Which?, grupo de defesa de consumidores de Londres, divulgou uma pesquisa com 67 empresas de cosméticos sobre a presença e os testes de segurança de nanomateriais em produtos de higiene e beleza. Apenas 17 empresas responderam ao questionário; oito admitiram que utilizam nanomateriais.
"Quando a nanotecnologia era novidade, todo o mundo queria falar sobre ela", comentou Hansen, da União de Consumidores. "Mas, agora que as preocupações vieram à luz, as pessoas já não têm certeza se a palavra ‘nano’ é boa para ser divulgada."


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