São Paulo, segunda-feira, 23 de março de 2009

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VIDA FRUGAL

Acabou a briga por pagar a conta do restaurante


Em tempos de crise, a frase "Eu pago!" fica cada vez mais rara

Por LAURA M. HOLSON

Em uma segunda-feira recente, Christine Peters, produtora do filme "Como Perder um Homem em Dez Dias", estava no restaurante Polo Lounge em Beverly Hills com uma amiga produtora e uma atriz. Elas conversaram sobre um possível filme durante cerca de uma hora, até que Peters pediu licença e foi ao toalete. Quando voltou, percebeu uma pequena pasta de couro sobre a mesa, que encerrava a conta.
"Alguém pagou?", ela perguntou. As duas mulheres olharam em branco, primeiro para ela, depois para a conta. "Não tínhamos visto", disse finalmente uma delas. Quando nenhuma das duas se ofereceu para pagar a conta de cerca de US$ 100, Peters fez algo que tem se tornado mais comum para ela ultimamente: puxou a carteira e pagou.
"Elas foram educadas", ela disse. "Mas nenhuma das duas queria pagar. É quase como se você quisesse aliviar a dor [delas]."
Costumava ser comum em restaurantes, o movimento ruidoso quando os convivas, segurando seus cartões corporativos, mergulhavam para pegar a conta, gritando "Eu pago!". Mas desde o início da recessão econômica os delicados rituais sociais da era do mercado forte, quando os executivos tentavam superar uns aos outros no pagamento de notas caras, estão invertidos.
Em vez da sobremesa, muitas refeições têm terminado com um cálculo frio e duro de quem vale a pena ser convidado ou não. Muitas vezes, as respostas causam desconforto dos dois lados da mesa.
Durante anos, Larry Kirshbaum, ex-executivo-chefe do Time Warner Book Group, levou uma série de agentes e escritores a restaurantes caros, enchendo-os de elogios e pagando alegremente pelo privilégio. Depois, em 2006, ele mesmo se tornou um agente literário. "A minha vida inteira eu convidei agentes para almoçar e antevia quando chegaria a minha hora", ele disse.
Mas a boa vida que Kirshbaum esperava veio a ser uma espécie de decepção. Em vez do caro restaurante Michael's, Kirshbaum muitas vezes encontra os colegas no Comfort Diner da East 45th Street, onde um sanduíche de queijo grelhado custa US$ 8,95. E com frequência os editores pedem que ele pague sua própria refeição ou evitam os almoços. Recentemente, um importante editor de livros o convidou para almoçar e aceitou pagar. O deleite inicial de Kirshbaum desapareceu quando ele soube que o editor queria se encontrar em um McDonald's.
"A coisa chegou a este ponto: 'Posso ir ao seu escritório tomar um copo d'água?'", disse. "As pessoas realmente estão com medo de gastar. Qualquer coisa que cheire a muita diversão ou desperdício está sendo evitada."
Esse temor é sentido em graus variados nos restaurantes onde os orçamentos eram inchados por altas contas. No Michael's, em Manhattan, alguns clientes que costumavam almoçar três vezes por semana hoje o fazem duas vezes, segundo o gerente geral, Steve Millington. Ele disse que o número de clientes no café da manhã -que é cerca de 40% mais barato que o almoço- aumentou 20%.
Na Wolfgang's Steakhouse, que tem restaurantes em Nova York e na Califórnia, os números são mais prementes. Na filial de Beverly Hills os executivos do entretenimento estão gastando 20% a menos que seis meses atrás, segundo o sócio-gerente Peter Zwiener. Os dois Wolfgang's em Manhattan tiveram queda de 10% a 15%, com o movimento na casa do centro da cidade abalado pelos distúrbios em Wall Street.
"Quem imaginaria que bancos seriam um negócio mais arriscado do que possuir um restaurante?", disse Zwiener. Não é de surpreender que a política do almoço de negócios tenha se inclinado para as contas "rachadas". Hoje, pagar a conta é muitas vezes um reflexo de quem tem o balanço da empresa em melhor estado.
"Eu me sinto sortuda", disse Terry Press, consultora de marketing de cinema que viaja entre Nova York e Los Angeles assessorando os estúdios sobre como promover seus filmes. "Não estou aqui marcando quem eu convidei para almoçar e se eles pagaram ou não. O fato é que eu posso convidar as pessoas para almoçar e isso me faz feliz."
Frequentemente, disse Press, ela acaba pagando porque é desconfortável não pagar. "Não é que haja um olhar de alívio no rosto das pessoas quando eu pego a conta, mas elas também não estão pegando", disse. "Sempre pego a nota porque é estranho demais se ninguém fizer isso. Quem quer ficar ali sentado olhando para a conta sobre a mesa?"


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