São Paulo, segunda-feira, 23 de maio de 2011

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

Nem todos dependem do frio

Por ANDY ISAACSON
ILHA DE ROSS, Antártida - A mudança climática tem criado um paraíso para alguns pinguins e um purgatório para outros. O cabo Royds abriga a mais austral colônia de pinguins do mundo. Mais adiante, o mar de Ross reúne mais de um terço dos pinguins de Adélia e um quarto dos pinguins imperadores. Pode ser o último ecossistema marinho intacto que resta na Terra.
"Este é o nirvana dos pinguins", disse o ecologista David Ainley, que há 40 anos estuda os pinguins do mar de Ross.
Os pinguins de Adélia, que dependem do gelo para sobreviver, servem de parâmetro para as mudanças climáticas, e, nas últimas três décadas, sua população na península Antártica, a nordeste do mar de Ross, caiu quase 90%. A única colônia de pinguins imperadores da península já foi extinta.
A temperatura atmosférica média na península da Antártida Ocidental, uma das áreas com aquecimento mais rápido no planeta, subiu 6°C no último meio século, causando mais nevascas que recobrem as rochas onde os pinguins de Adélia fazem seus ninhos -assim favorecendo os pinguins capazes de sobreviverem sem gelo, como os gentoos, cuja população cresceu 14.000%.
Mas, no mar de Ross, a capa de gelo sobre o mar tem crescido no inverno, e a população de pinguins de Adélia está prosperando. A colônia localizada no cabo Crozier -uma das maiores, com cerca de 230 mil casais reprodutores- aumentou 20%.
Mas, a longo prazo, o destino dos pinguins de Adélia e dos imperadores parece selado, já que o aquecimento vai derreter o gelo.
Enquanto isso, o apetite dos consumidores pela merluza negra pode estar beneficiando os pinguins no mar de Ross. A pesca ali começou em 1996 e reduz a concorrência dos pinguins de Adélia pelo Pleuragramma antarcticum, um peixe do tamanho da sardinha, apreciado por pinguins e merluzas negras.
Os modelos climáticos predizem que o gelo marinho vai aumentar no mar de Ross durante 30 a 40 anos, época em que o aquecimento global e o fim dos efeitos do buraco na camada de ozônio (legado do uso humano do gás CFC, que resfria a camada mais alta da atmosfera sobre o continente) deixarão o clima parecido com o que se vê hoje na península.
A temperatura média do verão na Estação McMurdo, base americana de pesquisas na ilha de Ross, já subiu 1,5°C nos últimos 30 anos, mais do que a média global. Durante a última temporada, cientistas registraram níveis sem precedentes nos lagos, por causa do esvaziamento das geleiras.
Na ilha de Beaufort, ao norte da ilha de Ross, os glaciares recuaram ao seu mínimo em 30 mil anos, estimam os cientistas. Isso abriu mais espaço para os ninhos da colônia local dos pinguins de Adélia, que saltou de 40 mil para 55 mil casais reprodutores na última década.
Com o recuo do gelo marinho, os pesquisadores preveem que os pinguins de Adélia do mar de Ross terão de partir para uma região mais ao sul. Ainley e colegas seus usaram etiquetas de geolocalização para monitorar os pinguins a fim de entender melhor os seus padrões de migração. Os pinguins partem das suas zonas de nidificação em fevereiro e seguem para o norte, fugindo do inverno e da escuridão. Eles param sobre o gelo marinho, a cerca de 480 km do limite com o mar aberto, onde engordam antes de voltarem para os seus locais de reprodução na ilha.
Fazendo a datação por carbono de pinguins mumificados, os pesquisadores descobriram que o pinguim de Adélia, aparentemente, nunca viveu tão ao sul quanto agora, pois parece precisar de luz para comer e navegar, além de ser uma proteção contra predadores.
Na verdade, especula Ainley, os pinguins de Adélia podem ser extintos não pela perda do habitat -mas pelo medo do escuro.


Texto Anterior: Ciência & Tecnologia
O cientista mais famoso do mundo

Próximo Texto: Cientistas estão otimistas na busca pela vida extraterrestre
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.