São Paulo, segunda-feira, 23 de novembro de 2009

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Muçulmanos se enfrentam com teorias de Darwin

Por KENNETH CHANG
AMHERST, Massachusetts - O criacionismo vem ganhando força no mundo muçulmano, da Turquia ao Paquistão e à Indonésia, disseram acadêmicos internacionais em outubro, reunidos nos EUA para discutir o tema.
Mas, segundo eles, os chamados criacionistas da Terra jovem -para os quais Deus criou o universo, a Terra e a vida há poucos milhares de anos- são poucos ou mesmo inexistentes. Uma razão disso é que embora o Corão, o livro sagrado do islã, diga que o universo foi criado em seis dias, o verso seguinte acrescenta que um dia, nesse caso, é metafórico: "mil anos por vossas contas".
Em contraste, alguns criacionistas cristãos identificam na Bíblia uma cronologia rígida que requer uma Terra que tenha 6.000 anos e, por isso, se posicionam contra não apenas a evolução, mas também boa parte da geologia e cosmologia modernas.
"Está claro que as visões relativas à evolução científica são influenciadas por crenças religiosas subjacentes", disse Salman Hameed, que convocou a conferência no Hampshire College, em Amhurst, onde leciona ciências humanas integradas.
Mas isso não quer dizer que toda a evolução caiba no islã ou que todos os muçulmanos aceitem as descobertas da biologia moderna. Mais e mais deles parecem estar aderindo aos chamados criacionistas da Terra velha. Eles não discordam das afirmações de astrônomos e geólogos -apenas as dos biólogos, insistindo em que a vida é criação de Deus, e não consequência de ocorrências aleatórias.
O debate em torno da evolução só agora está ganhando destaque em países islâmicos, à medida que a educação progride. O grau de aceitação da evolução varia.
Estudo comandado pelo Centro de Pesquisas em Ensino da Evolução, da Universidade McGill (Canadá), constatou que livros didáticos de biologia das escolas secundárias do Paquistão cobrem a teoria da evolução. Entre 2.527 estudantes secundaristas paquistaneses entrevistados, 86% concordaram com a seguinte afirmação: "Milhões de fósseis mostram que a vida existe há bilhões de anos e se modificou ao longo do tempo".
Um dos participantes da conferência, Taner Edis, disse que nunca encontrou posições criacionistas quando era criança e adolescente na Turquia, na década de 1970. Anos mais tarde, folheando volumes em uma livraria durante visita à Turquia, Edis, que ensina física na Universidade Truman State, no Missouri, encontrou livros sobre criacionismo arquivados na seção de ciências. "Isso me pegou de surpresa", contou.
A Turquia é oficialmente um país de governo secular, mas hoje é governada por um partido islâmico. O ensino da evolução em grande medida desapareceu, pelo menos nos níveis inferiores ao universitário, disse Edis, e o currículo de ciências nas escolas públicas é escrito em tom de deferência às crenças religiosas.
Harun Yahya, criacionista turco da linha da Terra antiga, vem ganhando destaque na Turquia e em outros países. Do outro lado da Ásia, a maioria dos professores de biologia na Indonésia usa livros criacionistas de Yahya nas salas de aula, constatou estudo da McGill, embora alguns digam que o fazem para oferecer argumentos contrários a materiais que seus alunos já leem de qualquer maneira.
Para muitos muçulmanos, até mesmo a evolução e a ideia de que a vida floresceu sem a intervenção de Alá são em grande medida compatíveis com sua religião. O que muitos consideram inaceitável é a evolução humana, a ideia de que os humanos evoluíram a partir de primatas primitivos.
Pervez A. Hoodbhoy, físico atômico da Universidade Quaid-e-Azam, no Paquistão, disse que, quando dava aulas que cobriam desde o Big Bang até a evolução da vida na Terra, a plateia ouvia a maior partes das aulas sem fazer objeção. Mas menção à evolução humana provocou agitação, e ele teve de ser escoltado para fora da sala de aula.

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