São Paulo, segunda-feira, 24 de maio de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Desempregados na Espanha lutam para voltar ao campo

Por SUZANNE DALEY

PUERTO SERRANO, Espanha - Durante a febre do mercado imobiliário na Espanha, Antonio Rivera Romero trocou alegremente as longas jornadas e o exaustivo trabalho do campo pelo ofício mais bem regulamentado da construção civil, ganhando o quádruplo como pedreiro. Fez uma hipoteca e aumentou sua casa, numa rua pacata de Puerto Serrano, pequena cidade do sul da Espanha.
Agora que os empregos na construção acabaram, as prestações do financiamento estão atrasadas, e Rivera está ávido por voltar ao trabalho agrícola.
Mas os espanhóis foram, em grande parte, expulsos desses empregos. Os que agora se curvam diante das fileiras de pés de morango, sob a cobertura de estufas plásticas, ou sobem escadas debaixo do sol do meio-dia são quase todos romenos, poloneses e marroquinos, muitos legalmente na Espanha.
"Os fazendeiros aqui não nos querem", lamentou Rivera.
Autoridades locais e sindicalistas concordam com ele. Os fazendeiros relutam em readmitir trabalhadores espanhóis porque não têm certeza de que eles vão se empenhar tanto quanto os estrangeiros, que vêm colhendo suas safras, em alguns casos, já há uma década.
Até agora, apenas 5% dos empregados na colheita deste ano são espanhóis, segundo Diego Cañamero, presidente do Sindicato dos Trabalhadores do Campo (SOC), um dos maiores do país.
"Há uma sensação de perplexidade entre os trabalhadores espanhóis", disse. "Eles falam: 'Por que deixam as pessoas [os imigrantes] andarem 8.000 km, quando nós precisamos de empregos?'."
O desemprego na Andaluzia é de 27%, o maior da Espanha continental. Os espanhóis sempre foram resilientes, ajudando-se mutuamente em tempos difíceis.
Mas, hoje em dia, há famílias inteiras desempregadas, como a de Rivera e sua mulher, que têm cinco filhos em idade produtiva -a maioria em casa. O seguro- desemprego, para quem tem prestações de casa ou carro, não é nem de longe suficiente.
Rivera, 50, recebe 420 euros por mês. A prestação da hipoteca consome metade disso, contou ele. Sua mulher, Encarnación Román Casillas, 49, começou a frequentar o sopão da cozinha comunitária. "No início, eu não conseguia", afirmou ela. "Minha cunhada ia no meu lugar. Mas aí fomos juntas, e agora faço o que eu tenho de fazer."
Além de duas refeições quentes, ela recebe um pão, um litro de leite e quatro iogurtes.
Em breve os Riveras vão pegar emprestado um carro de um parente e vão à França, onde esperam acampar enquanto colhem beterrabas, aspargos e alcachofras, e depois uvas no outono. Eles arrumaram trabalho por lá no ano passado, mas o custo do acampamento comeu metade dos salários. Desta vez, um fazendeiro francês aceitou que eles se instalem na propriedade dele.
Rivera não está sozinho em seu drama. Prefeitos de toda a Andaluzia dizem que os moradores chegam o tempo todo aos seus gabinetes atrás de trabalho. Alguns não querem empregos rurais, dizendo que são pesados demais. Mas muitos aceitam de bom grado, conta Emilio Vergara, prefeito de Paterna del Campo, nos arredores de Huelva.
Junto com três outros prefeitos da região, Vergara iniciou um esforço para convencer fazendeiros a contratar os locais. Mas, diz ele, de 450 pessoas que se inscreveram na sua cidade, ninguém recebeu uma oferta de emprego.
"Estou preocupado com uma potencial explosão de xenofobia e espero que ela possa ser evitada a todo custo, porque a Espanha é tradicionalmente um país hospitaleiro", disse Vergara.Especialistas dizem que alguns fazendeiros se aproveitam dos imigrantes. Cañamero afirma que 15 a 20 casos de abusos sérios são relatados por ano.
Mas, em geral, diz o sindicalista, não é por isso que os fazendeiros recorrem aos estrangeiros.
Ele diz que a contratação é guiada por uma teia de preconceitos a respeito de quem são os melhores trabalhadores. Para o trabalho no auge do verão, os fazendeiros preferem africanos. Para colher morangos, mulheres. "Não está escrito em lugar nenhum", disse ele. "Seria uma discriminação terrível. Mas é assim que funciona."


Texto Anterior: Tendências Mundiais
Inteligência/Roger Cohen: É preciso aprender a erguer pontes sobre o abismo

Próximo Texto: Longe de Wall Street, novos titãs das finanças influenciam as Bolsas
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.