São Paulo, segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

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DINHEIRO & NEGÓCIOS

CEOs dão poucos sinais de contrição

Por ANDREW MARTIN e MICHELINE MAYNARD
Enquanto os EUA se recuperam da sua pior crise financeira desde a Grande Depressão, alguns executivos-chefes apresentam raríssimos pedidos de perdão. Mas as palavras deles são tão pensadas, escolhidas por advogados ou relações-públicas, que não dá para saber até que ponto essa culpa pode ser chamada de "mea".
Ex-chefe da Time Warner, Gerald Levin causou alvoroço recentemente ao assumir a responsabilidade pelo "pior negócio do século", a fusão com America Online, há uma década. Mas poucos outros executivos-chefes, inclusive um punhado de poderosos em Wall Street que admitem tropeços, aceitaram o apelo dele para assumir a responsabilidade por decisões que causaram prejuízo e sofrimento a muitos americanos.
"A cultura americana não premia o pedido de desculpas", disse Michael Useem, professor de administração da Universidade da Pensilvânia. "O nível de raiva no público em geral é extremamente alto contra aqueles que levaram Wall Street ao abismo, em parte porque eles nunca deram um passo à frente para se desculpar pela bagunça que causaram."
A arte do arrependimento nuançado -admitir erros sem aceitar a culpa- foi exibida em 13 de janeiro numa audiência da nova Comissão de Inquérito da Crise Financeira, em Washington, onde Lloyd Blankfein, do Goldman Sachs, Jamie Dimon, do JPMorgan Chase, John Mack, do Morgan Stanley, e Brian Moynihan, do Bank of America, depuseram.
A comissão pressionou Blankfein sobre as acusações de que o Goldman e outros bancos venderam deliberadamente hipotecas "podres" como sendo investimentos seguros, embora eles próprios apostassem contra elas.
"De fato acho que o comportamento é impróprio", declarou Blankfein. "Lamentamos a consequência de que as pessoas tenham perdido dinheiro nisso."
Outros não veem razão para censura. Dimon insistiu em que o JPMorgan não precisou de um resgate, apesar dos bilhões de dólares em empréstimos ruins, e na verdade ajudou o esforço de resgate financeiro do governo ao assumir emergencialmente o Bear Stearns.
Numa recente carta a investidores, ele disse que houve erros no negócio hipotecário do banco, mas citou "lapsos regulatórios" e falhas das agências de "rating" como sendo os gatilhos da crise habitacional.
Ainda assim, ele admite que o setor se beneficiou dos programas de ajuda federal.
O advogado Byron Georgiou, integrante da comissão, disse na audiência que o resultado da farra com papéis exóticos seria diferente se os participantes tivessem de "comer da própria comida".
"Nós comemos da nossa comida -e engasgamos", disse Mack, que em fevereiro se desculpou perante o Congresso pelo papel da sua empresa na crise financeira.
É claro que os líderes corporativos temem que as desculpas estimulem ações judiciais dos acionistas.
Estes já processaram o Bank of America por não revelar bilhões de dólares em prejuízos e bônus pagos ao Merrill Lynch antes da fusão. No começo de janeiro, um fundo de pensões de Illinois foi à Justiça contra o Goldman Sachs para tentar recuperar bilhões em bônus e outras compensações de 2009, alegando que eles prejudicavam os acionistas.
Outra razão para a dificuldade dos executivos-chefes em pedir perdão é que eles tendem a ter egos grandes, disse Robert Bruner, diretor da Escola de Negócios Darden, da Universidade da Virgínia. "Você não chega ao topo de uma organização grande e altamente competitiva por meio da degradação e da humildade", afirmou.
Já no Japão, executivos costumam se contorcer em pedidos de desculpas. Akio Toyoda, presidente da Toyota, recentemente admitiu que sua fábrica estava a um passo da "capitulação para a irreverência ou a morte". A empresa, alertou, está "à procura de salvação".
Algumas outras grandes figuras financeiras já apresentaram desculpas mornas. Sanford Weill, que construiu um império financeiro no Citigroup, disse recentemente ao "New York Times" que ficou "triste" com o estado do Citi e que havia cometido alguns erros. Mas ele defendeu o colosso que ergueu e afirmou que um dos seus maiores equívocos foi escolher Charles Prince 3? como seu sucessor. Ele culpa Prince por aceitar dívidas arriscadas que depois se revelariam tóxicas.
Quanto a Levin, o ex-chefe da Time Warner, especialistas dizem que seu pedido de desculpas, ainda que anos depois dos fatos, é impressionante num ambiente que geralmente os rejeita por vê-los como sinal de fraqueza.


Colaboraram Eric Dash, Andrew Ross Sorkin e Sewell Chan



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