São Paulo, segunda-feira, 28 de setembro de 2009

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Dente de tubarão revela nova ascendência

Por SEAN B. CARROLL

"Como uma locomotiva com a boca cheia de facas de açougueiro." Foi assim que um especialista em tubarões, Matt Hooper, descreveu o Carcharodon megalodon à polícia no romance "Jaws", de Peter Benchley. Ele se referia ao corpo de 15 metros de comprimento e 45 toneladas e aos enormes dentes de 15 a 18 cm que faziam do extinto tubarão megalodon possivelmente o mais temível predador dos mares.
Hooper acabara de ver pela primeira vez o tubarão. Ele explicou que o nome latino do grande tubarão branco era Carcharodon carcharias e que "seu ancestral mais próximo que pudemos encontrar" era o megalodon.
Ele estava repetindo uma ideia estabelecida havia muito tempo: que o mais temido predador presente nos oceanos hoje, o grande tubarão branco, evoluiu a partir do megalodon, o temível predador de milhões de anos atrás.
É assim que as duas espécies foram vistas até recentemente, quando novas maneiras de interpretar os dentes de tubarões, além de novos fósseis encontrados em um deserto peruano, convenceram a maioria dos especialistas de que os grandes tubarões brancos não descendem do megatubarão dotado de megadentes. Na realidade, eles teriam evoluído a partir de um parente dos tubarões mako, de dimensões mais modestas e dentes lisos.
Se for fato, aquela boca repleta de lâminas próprias para dilacerar carne é exemplo de um dos fenômenos mais interessantes da história da vida: a evolução convergente, ou seja, a evolução independente de adaptações similares em criaturas diferentes.
Como os esqueletos de tubarões são compostos em grande parte de cartilagem não mineralizada que não é conservada no registro fóssil, as evidências mais importantes têm sido dadas por seus dentes -fortemente mineralizados e de boa conservação.
Os dentes de grandes tubarões brancos atingem tamanho máximo de pouco mais de 6 cm. São assustadores, mas pequenos em comparação com os dos tubarões megalodon. A característica mais evidente que os dentes das diferentes espécies têm em comum é seu formato pontudo e serrilhado, que facilita o trabalho de romper a carne das presas e agarrá-las.
Mas uma pequena minoria de pesquisadores tinha dúvidas. Foi observado que os dentes dos grandes tubarões brancos também guardavam semelhanças com os de um tubarão mako já extinto, o Isurus hastalis, alguns dos quais tinham relevo serrilhado fraco. Foi proposta uma explicação alternativa da origem do grande tubarão branco: que ele teria evoluído a partir de um grupo já extinto de tubarões mako.
É difícil chegar a uma conclusão relativa a questões como essas sem recorrer a medidas quantitativas. Kevin Nyberg e Gregory Wray, da Universidade Duke, na Carolina do Norte, e Charles Ciampaglio, da Universidade Estadual Wright, no Ohio, usaram novos métodos computadorizados de imageamento e medição para avaliar melhor as semelhanças e diferenças entre os dentes do grande tubarão branco, do megalodon e do já extinto mako.
Eles determinaram que os dentes e as raízes dos dentes do mako extinto e do grande tubarão branco têm formato semelhante e diferem nitidamente dos do megalodon. Além disso, exames feitos com microscópio de alta resolução revelaram que a forma e o espaçamento das pontas serrilhadas dos dentes do grande tubarão branco são nitidamente diferentes das do megalodon. Aparentemente, o serrilhado é só uma similaridade superficial entre eles.
Parece que o grande tubarão branco evoluiu a partir de um antepassado de aparência menos feroz e que desenvolveu o serrilhado afiado de seus dentes de maneira independente.


Sean B. Carroll é biólogo e geneticista molecular. Seu livro mais recente é "Remarkable Creatures"

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