São Paulo, segunda-feira, 31 de maio de 2010

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Óleo ameaça tartarugas marinhas no golfo do México

Por LESLIE KAUFMAN
COSTA DA ILHA PADRE, Texas - É a temporada da desova, e perto da costa dos EUA a tartaruga marinha n? 15 nada em círculos antes de se arrastar sobre a areia e botar mais ovos.
Essa tartaruga de Kemp, carinhosamente batizada de Thelma por um empregado do Serviço de Parques Nacionais dos EUA, já derrotou algumas probabilidades terríveis. Ainda no ovo, foi levada de avião do Texas para o México, depois da explosão da plataforma marítima Ixtoc 1, em 1979, que derramou milhões de litros de óleo no golfo do México e encobriu o principal lugar de desova das tartarugas.
Agora, Thelma e outras da sua espécie estão sendo atentamente monitoradas por cientistas, já que outro grande desastre petroleiro ameaça seu habitat.
Autoridades federais disseram recentemente que desde 30 de abril, dez dias após o acidente com a plataforma Deepwater Horizon, já haviam sido registradas 156 mortes de tartarugas marinhas, a maioria delas da espécie conhecida como tartaruga de Kemp.
Embora não se possa dizer com certeza que a culpa foi do óleo, o número é bem superior ao usual nesta época do ano, segundo as autoridades.
O vazamento ainda ameaça várias outras espécies, de golfinhos a siris. A Administração Oceânica e Atmosférica (NOAA) dos EUA ampliou a proibição de pesca no golfo por causa da difusão do óleo. Mas, das espécies marinhas ameaçadas que frequentam as águas dali, apenas a tartaruga de Kemp depende da região como seu local exclusivo de procriação.
Desde o vazamento da Ixtoc 1, as tartarugas, cujo número caiu à casa das centenas na década de 1980, tiveram uma frágil recuperação, e agora há pelo menos 8.000 adultas, segundo cientistas. Mas o óleo que jorra do poço pode mudar isso.
As tartarugas podem ser mais vulneráveis que outros grandes mamíferos marinhos ao óleo que vai se espalhando pelo mar. Criatura antiga, guiada pelo instinto, ela busca comida ao longo da costa americana, da Louisiana à Flórida, no caminho da mancha de petróleo.
"Ela vive todo o seu ciclo de vida no golfo, por isso estamos tão preocupados", disse Pat Burchfield, cientista do Zoológico Gladys Porter, de Brownsville (Texas), que há 38 anos estuda as tartarugas. A desova vai até meados de julho, e na maior parte desse tempo as mães permanecem na costa da ilha Padre e das praias do México, onde atualmente não há óleo. Mas aí as tartarugas bebês correm para o mar, flutuando nas correntes do golfo ou sobre montes de algas que podem estar cobertos de petróleo.
Famintas após botarem os ovos, as fêmeas adultas sabidamente vão à foz do Mississippi, área particularmente rica em alimentos, para se recompor.
Tartarugas jovens, que ficam afastadas da costa, são a maioria das mortes registradas até agora no golfo.
André Landry Jr., do Laboratório de Pesquisas da Ecologia da Tartaruga Marinha e dos Pesqueiros, da Universidade Texas A&M, em Galveston, disse que transmissores de rádio por satélite foram acoplados a várias tartarugas, inclusive Thelma, para fins de pesquisa. Ele espera que isso dê pistas sobre o que acontece em alto-mar.
"Se ela for à praia, enviará um sinal constantemente, em vez dos sinais aleatórios que elas enviam quando sobem aleatoriamente para respirar", afirmou Landry.
Barbara Schroeder, coordenadora nacional de tartarugas para os pesqueiros da NOAA, disse que a agência está investigando as mortes de tartarugas, mas ainda não tem uma resposta.
Segundo ela, já houve necropsias completas em 50 animais, e parciais em 17. As inspeções internas não revelaram presença de petróleo, mas os cientistas ainda não fizeram essa busca em amostras de tecidos. Ela disse também que pode ser difícil determinar de maneira conclusiva como as tartarugas morreram ou mesmo como o vazamento está afetando a espécie de maneira mais geral.
"As pessoas acham que é como na televisão, em que o mistério é resolvido em uma hora. É muito complexo. A maioria dos impactos que acontecem com as tartarugas está fora de vista. A maioria das tartarugas nunca vem à praia."
A tartaruga de Kemp tem milhões de anos; seus ancestrais já nadaram com os dinossauros. Para evitar que uma única catástrofe ambiental extinga a espécie, ovos das fêmeas restantes -inclusive o ovo da que viria a ser a tartaruga n? 15- foram levados para a ilha Padre, para iniciar uma nova colônia. Thelma chegou em 1986.
Ao nascerem, os filhotes eram liberados nas ondas em frente à sede da guarda, para que a praia ficasse impressa em sua memória. Em seguida eram capturados e protegidos até os nove meses de idade, quando estavam menos vulneráveis.
"Chamamos isso de pré-escola", disse Donna Shaver, diretora de ciência e recuperação de tartarugas marinhas do Serviço de Parques Nacionais, na ilha Padre.
Nem nadar com os dinossauros era tão difícil.


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