São Paulo, domingo, 02 de maio de 2004

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A compra da Embratel

A Folha publicou no domingo passado sua reportagem de maior impacto do ano. Baseado em análises de documentos apreendidos legalmente pela polícia de São Paulo na presidência e na vice-presidência da Telefônica, o jornal informou que as três principais empresas de telefonia do país, reunidas num consórcio para comprar a Embratel, pretendiam recuperar seus investimentos no negócio aumentando "até o teto" suas tarifas.
Os documentos recolhidos pela polícia permitiram que o jornal desse a seguinte manchete: "Teles negociam compra da Embratel para subir preços". Esse tipo de reportagem, que envolve empresas privadas e disputas por mercados, costuma gerar imediatamente reclamações e pedidos de esclarecimentos. Desta vez, isso não ocorreu. Na noite de quinta-feira, a assessoria de comunicação da Telefônica encaminhou para o ombudsman um documento intitulado "Argumentário sobre noticiário da Folha de S. Paulo", com duas reclamações.
A primeira é relativa à reportagem "Redação de lei vai ser investigada", de 27 de abril, na página B4 da edição que circula em São Paulo. Segundo a Telefônica, a notícia levanta a suspeita de suposta interferência do presidente do Grupo Telefônica na redação de decreto de junho de 2003, que acabou com a indexação para o reajuste das tarifas telefônicas. A empresa argumenta, com razão, que o decreto foi discutido em reunião das teles com o presidente em junho do ano passado e foi amplamente noticiado pela imprensa.
A segunda reclamação diz respeito ao texto "Documento apreendido traz raio-X do Cade", publicado na quarta-feira na página B6 do caderno Dinheiro. A reportagem revela que, entre os papéis analisados, foi encontrado um "roteiro de orientação do lobby das três teles fixas". Um relatório da Telefônica detalhava os perfis políticos de integrantes de órgãos controladores e reguladores do sistema de telecomunicações. Caso conseguisse comprar a Embratel, o consórcio das três teles precisaria da autorização desses órgãos.
Segundo a assessoria de comunicação da Telefônica, a "reportagem tenta travestir de ilegitimidade uma prática comum nas empresas e órgãos públicos (e até na própria imprensa), como os perfis de deputados ou ministros, sempre que se inicia um novo governo ou uma nova legislatura. A Folha, porém, na reportagem em questão, tenta caracterizar essa prática rotineira e legítima em instrumento de pressão contra os órgãos de defesa da concorrência -o que é absurdo".
Nesse caso, discordo da assessoria da Telefônica. As informações publicadas adquiriram interesse jornalístico porque fazem parte de um contexto maior de disputa por mercado. O fato de o levantamento de perfis ser um trabalho rotineiro na empresa não significa que não deva ser notícia.
A Folha já havia publicado essas reclamações no seu "Painel do Leitor" de sexta-feira, mas sem resposta do jornal. Perguntei à Secretaria de Redação se a falta de respostas significava que o jornal admitia os erros e obtive a seguinte resposta da secretária de Redação Suzana Singer: "Decidimos não responder à carta da Telefônica porque ela não contradiz nenhuma informação publicada. São apenas interpretações diferentes sobre o material apreendido".


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