São Paulo, domingo, 11 de novembro de 2007

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Caro leitor: esse Painel é mesmo seu?


O território de intervenção dos leitores foi apropriado por quem já dispõe ou deveria dispor de outras editorias para se pronunciar




ANTEONTEM foi mais um dia daqueles. Os leitores ditos comuns, os que em "última análise" "sustentam" o jornal, na definição do "Manual da Redação", foram alijados de mais da metade do "Painel do Leitor".
Dois executivos contestaram reportagem sobre leite. Uma assessora respondeu a artigo a respeito do Plano Diretor. Um deputado divergiu de colunista. Uma vez mais, danaram-se os leitores.
Tem sido assim há tempos. A seção perpetua uma desigualdade ofensiva: enquanto os "anônimos" penam para publicar suas cartas -apenas 9% das mais de 30 mil tentativas até o fim de outubro foram bem-sucedidas-, políticos, empresários e assessores de imprensa emplacam uma mensagem atrás da outra.
É o que constata levantamento que fiz com meu assistente Carlos Murga sobre o trimestre concluído mês passado. No "PL" de agosto, 19% foram ocupados por quem foi objeto de notícias e 8% por quem se sentiu atingido por opinião (em colunas, artigos, editoriais e no próprio "Painel do Leitor"). No total, 27%.
Em setembro, a soma alcançou 28%. Em outubro, 21%, incluindo tréplicas de jornalistas. Em 53 dias, leram-se manifestações dos que se consideraram injustiçados no jornal. Em 11, os leitores não afamados não tiveram acesso nem a 50% das duas colunas na página A3.
É um "Painel do Leitor" descaracterizado o que serve de plataforma ao "outro lado", como se classifica o direito de replicar as informações veiculadas na Folha.
O território de intervenção dos leitores foi apropriado por quem já dispõe ou deveria dispor de outras editorias para se pronunciar. O erro decerto não é das pessoas e instituições cuja palavra o jornalismo plural e transparente assegura. Quem se engana é o jornal.
Em 17 e 25 de agosto, o "Painel do Leitor"acolheu protestos do senador Renan Calheiros contra notas do "Painel"(o político, em Brasil). É prerrogativa sua a de retrucar.
Mas por que as declarações dele não saíram no "Painel" da página 4? Por que os leitores foram punidos com supressão de espaço para suas missivas? Se a informação apareceu em seção noticiosa, por que a contestação entrou na de cartas?
Pior: o senador José Sarney e o deputado Fernando Gabeira, que não podem reclamar da atenção que o jornal lhes dispensa no noticiário, também freqüentam o "Painel do Leitor". O escárnio é que ambos são colunistas da Folha.
O leitor perde sempre. O reconhecimento de erros é procedimento admirável. Como o "Erramos" também está no canto da página 3, contudo, quanto mais correções, menor o "Painel do Leitor", cujo tamanho médio no período pesquisado foi de 75 cm. (Não calculo a versão alongada do "PL" na Folha Online, espécie de consolação aos preteridos no jornal impresso).
Outro desequilíbrio: à correspondência dos não favorecidos impõem-se dimensões reduzidas; a dos tratados com deferência se espicha.
Neste ano, acumularam-se 155 queixas, o dobro das 75 de 2006, contra cartas não publicadas e a invasão do "PL" por autoridades e assemelhados. Os lamentos se sucedem ombudsman após ombudsman, sem sensibilizar a Folha.
É provável que tantos "outros lados" resultem de empenho jornalístico anêmico para ouvir as partes. Mas não se atenua a fraqueza mudando o caráter do "Painel do Leitor".
A Folha poderia lançar uma seção de direito de resposta. Ou garantir a defesa dos incomodados, com cartas ou declarações entre aspas, nas editorias responsáveis pelos textos controversos. Opções não faltam. O que falta é determinação editorial: resguardar o interesse dos leitores em se expressar no painel que em tese é seu.
Você ainda considera dos leitores o "Painel do Leitor"? Desse jeito, como ele merece se chamar? Tem sugestões sobre o que fazer com as cartas dos Vips? Responda, que eu encaminharei sua mensagem ao "PL" e à Redação. Como está é que não dá para ficar.

Resposta da Redação
Recebi da Secretaria de Redação a seguinte resposta: "A Folha não quer dividir os leitores em duas categorias: as autoridades e o leitor comum. Por isso, não divide o "Painel do Leitor", um espaço democrático e plural. A seção é uma das mais lidas do jornal, reunindo opiniões do cidadão comum, de representantes de empresas e de governos. De fato, por razões de espaço, nunca será possível publicar todas as manifestações recebidas (em torno de cem diariamente). Por isso, o jornal passou a editar mais mensagens recebidas na Folha Online".


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